Nos últimos tempos, os jogos do engodo, da
simulação e da dissimulação têm atingido níveis absurdos.
A matreirice sempre deu o tom na
política nacional. No dia 31 de março de 64, Benedito Valadares, raposa
matreira, encontrou-se com José Maria Alkmin e Olavo Drummond no aeroporto de
Belo Horizonte.
- Alkmin, para onde você vai?
- Para Brasília.
- Para Brasília, ah, sim, Brasília. Sei.
Os três seguiram conversando até o cafezinho. Até que Benedito, piscando um olho, cutucou o braço de Olavo:
-É, o Alkmin está dizendo que vai para a Brasília para eu pensar que ele vai para o Rio. Mas ele vai mesmo é para Brasília.
A artimanha é conhecida nos tratados de guerra como engano de segundo grau. Alkmin queria tapear Benedito dizendo-lhe a verdade para tirar proveito de sua desconfiança.
"Leis não obedecidas, justiça lenta, projetos casuísticos, distorção de prioridades, violência extremada, tibieza de governantes, culto à improbidade, mais impostos e muita mentira amortecem o ânimo nacional"
- Alkmin, para onde você vai?
- Para Brasília.
- Para Brasília, ah, sim, Brasília. Sei.
Os três seguiram conversando até o cafezinho. Até que Benedito, piscando um olho, cutucou o braço de Olavo:
-É, o Alkmin está dizendo que vai para a Brasília para eu pensar que ele vai para o Rio. Mas ele vai mesmo é para Brasília.
A artimanha é conhecida nos tratados de guerra como engano de segundo grau. Alkmin queria tapear Benedito dizendo-lhe a verdade para tirar proveito de sua desconfiança.
"Leis não obedecidas, justiça lenta, projetos casuísticos, distorção de prioridades, violência extremada, tibieza de governantes, culto à improbidade, mais impostos e muita mentira amortecem o ânimo nacional"
Ao longo da história, a enganação tem feito carreira. Nos últimos tempos, porém, os jogos do engodo, da simulação e da dissimulação têm atingido níveis absurdos. Temos visto tapeação de primeiro, segundo e terceiro grau. Delatores apontam pessoas que teriam recebido propina dos dutos da Petrobras e são desmentidos; o governo ensaia a volta da CPMF, mas retrocede; tira, por decreto, poderes dos Ministros militares em matéria de política de pessoal e os repõe ante a onda negativa; põe na agenda um enxugamento dos ministérios e fica por isso mesmo; TCU e TSE sugerem dúvidas sobre os próximos passos em relação às pedaladas e contas de campanha da presidente.
O Brasil perde o grau de investimento,
com o rebaixamento feito pela S&P, e Lula diz que isso não vale nada. De
arrepiar. A palavra distancia-se de seu significado. A imprensa registra algo
em um dia e, no seguinte, o contraditório.
A administração federal mais parece barata tonta depois de forte dose de inseticida. Não sabe onde rodopiar. Enchentes em alguns pontos, grande seca em outros, e reservatórios de água suprem populações com seus volumes mortos. A dúvida se instala: as chuvas de setembro e outubro garantem normalidade ou sofreremos crise hídrica e energética?
A violência registra casos de horror extremo, como a chacina que matou 19 pessoas em Osasco (SP), deixando suspeitas sobre o próprio aparelho policial. O palavrório de sempre se instala. As ruas se enchem com desfiles de pedintes e, nos semáforos, meninos e adolescentes se multiplicam na tarefa de mostrar habilidades com bolas, pernas de pau, facas e tochas de fogo.
A administração federal mais parece barata tonta depois de forte dose de inseticida. Não sabe onde rodopiar. Enchentes em alguns pontos, grande seca em outros, e reservatórios de água suprem populações com seus volumes mortos. A dúvida se instala: as chuvas de setembro e outubro garantem normalidade ou sofreremos crise hídrica e energética?
A violência registra casos de horror extremo, como a chacina que matou 19 pessoas em Osasco (SP), deixando suspeitas sobre o próprio aparelho policial. O palavrório de sempre se instala. As ruas se enchem com desfiles de pedintes e, nos semáforos, meninos e adolescentes se multiplicam na tarefa de mostrar habilidades com bolas, pernas de pau, facas e tochas de fogo.
A estética da miséria expande cores
cinzentas e escancara a desilusão de milhões de brasileiros que, após subirem
um degrau na escada da pirâmide social, se vêem arrastados para o andar de
baixo, onde a classe D tenta sobreviver no meio de um turbilhão de carências.
Falta dinheiro para completar a fatia de carne, o saquinho de arroz, o quilo de
feijão. Verduras? Nem pensar. E o Bolsa Família para as margens? Já deu o que
tinha de dar. É coisa pouca.
A tétrica anatomia urbana, como a pedrinha do dominó empurrando a seguinte, ameaça a queda de todas. Mas há algo pior: é a miséria moral que o país herda do seu aglomerado de crises.
A tétrica anatomia urbana, como a pedrinha do dominó empurrando a seguinte, ameaça a queda de todas. Mas há algo pior: é a miséria moral que o país herda do seu aglomerado de crises.
A necessidade de sobrevivência acaba
corroendo a base do caráter. Os efeitos aparecem na propensão para a violência,
para desvios e inclinação de certos núcleos na apropriação de bens de outros. O
engodo que se instalou em cima desce a outros níveis.
Daí a conclusão: as fontes da seara do caráter também secam. Sentimentos e relações sociais se impregnam da ordem moral que recai sobre a sociedade. Torna-se difícil manter a coluna vertebral ereta quando os poderosos a dobram, em todos os instantes, no atendimento às suas conveniências.
A desconfiança, quando não a indignação, passa a imperar, principalmente no seio de grupos de sólida formação moral. Que passam a cristalizar e a verbalizar o sentimento de repúdio à classe dirigente, com ênfase aos integrantes do partido que, há quase 13 anos, ocupa o centro do poder.
Daí a conclusão: as fontes da seara do caráter também secam. Sentimentos e relações sociais se impregnam da ordem moral que recai sobre a sociedade. Torna-se difícil manter a coluna vertebral ereta quando os poderosos a dobram, em todos os instantes, no atendimento às suas conveniências.
A desconfiança, quando não a indignação, passa a imperar, principalmente no seio de grupos de sólida formação moral. Que passam a cristalizar e a verbalizar o sentimento de repúdio à classe dirigente, com ênfase aos integrantes do partido que, há quase 13 anos, ocupa o centro do poder.
Convém lembrar, porém, que parcela da
população, aflita com o cinturão que aperta seu corpo, faz prevalecer o bem
material sobre o valor moral. Essa é horrenda feição desenhada pela miséria.
Caráter é o espelho da grandeza humana. Integra um sistema de valores compostos, entre outros, por lealdade, compromisso, companheirismo, confiança, comunhão de propósitos. De nossos avós, uma frase comum era: “aquele era um homem de palavra”. Queriam dizer: “ um homem de caráter”. Quem pode afirmar a mesma coisa neste ciclo de deterioração do escopo moral?
A paisagem é celeremente contaminada pela crise da corrosão do caráter, terrível doença que Richard Sennett, professor de sociologia da Universidade de Nova Iorque, aponta como uma das mais trágicas do mundo moderno.
Caráter é o espelho da grandeza humana. Integra um sistema de valores compostos, entre outros, por lealdade, compromisso, companheirismo, confiança, comunhão de propósitos. De nossos avós, uma frase comum era: “aquele era um homem de palavra”. Queriam dizer: “ um homem de caráter”. Quem pode afirmar a mesma coisa neste ciclo de deterioração do escopo moral?
A paisagem é celeremente contaminada pela crise da corrosão do caráter, terrível doença que Richard Sennett, professor de sociologia da Universidade de Nova Iorque, aponta como uma das mais trágicas do mundo moderno.
A degradação do caráter é metástase que
se propaga em função das mazelas da vida pública. A crise de caráter puxa a da
credibilidade. A crença nas instituições e nos agentes públicos se esvanece.
Leis não obedecidas, justiça lenta, projetos casuísticos, distorção de prioridades, violência extremada, tibieza de governantes, culto à improbidade, mais impostos e muita mentira amortecem o ânimo nacional. Ante esse quadro, o povo clama por ações de um Estado que se mostra anêmico e inerte.
Quem imaginaria um ex-presidente da República idolatrado e uma mandatária bem aclamada em seu primeiro mandato vestirem o manto de bonecos infláveis representando o engodo? Teriam faltado à verdade com o eleitor? Teriam mistificado as massas pela propaganda política? Que tempos. Tempos de grandes mentiras.
O libertador Simon Bolívar, tão admirado pelas esquerdas latino-americanas, fazia, há 165 anos, um desabafo: “não há boa fé na América, nem entre os homens nem entre as nações. Os tratados são papéis, as constituições não passam de livros, as eleições são batalhas, a liberdade é anarquia e a vida um tormento”.
Leis não obedecidas, justiça lenta, projetos casuísticos, distorção de prioridades, violência extremada, tibieza de governantes, culto à improbidade, mais impostos e muita mentira amortecem o ânimo nacional. Ante esse quadro, o povo clama por ações de um Estado que se mostra anêmico e inerte.
Quem imaginaria um ex-presidente da República idolatrado e uma mandatária bem aclamada em seu primeiro mandato vestirem o manto de bonecos infláveis representando o engodo? Teriam faltado à verdade com o eleitor? Teriam mistificado as massas pela propaganda política? Que tempos. Tempos de grandes mentiras.
O libertador Simon Bolívar, tão admirado pelas esquerdas latino-americanas, fazia, há 165 anos, um desabafo: “não há boa fé na América, nem entre os homens nem entre as nações. Os tratados são papéis, as constituições não passam de livros, as eleições são batalhas, a liberdade é anarquia e a vida um tormento”.
O timoneiro fez uma profecia, mais que
um queixume. A vida brasileira se aproxima do tormento.
Gaudêncio Torquato.
Gaudêncio Torquato.
Comente este artigo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário