Mapas de calor, como os feitos
pela National Aeronautics and Space Administration (NASA), são ferramentas
imprescindíveis no monitoramento do clima e da natureza. Recorrendo à
tecnologia de última geração, é possível obtermos imagens feitas por satélites
que mostram com detalhes as condições climáticas de determinadas regiões do
mundo e, mais importante do que isso, registram as mudanças climáticas que
tanto ameaçam ecossistemas inteiros e a vida do ser humano na Terra.
Para entender melhor como esses mapas
de calor funcionam e de que modo é possível utilizá-los no meio ambiente e
enfrentar as mudanças climáticas, o Mega Curioso conversou com o professor
de Geografia Baker Perry, da Appalachian State University e explorador da
National Geographic.
Habitamos um
mundo muito diferente daquele onde vivemos anos atrás
“Os mapas de calor feitos pela NASA
mostram que habitamos um mundo muito diferente daquele onde vivemos anos
atrás”, afirmou Perry ao ser questionado sobre como essa ferramenta pode ser
importante para entendermos o clima atual. “Estamos mais quentes do que antes,
e áreas específicas do planeta se aqueceram muito mais do que a média global”.
Aquecimento global acelerado
Desde 1880, a temperatura média da superfície
da Terra vinha crescendo 0,07 °C a cada década. Porém, a partir de 1981, esse
valor subiu para 0,18 °C, o que parece pouco, mas é extremamente relevante. No
total, desde o século XIX, a média da temperatura do planeta subiu 1,18 °C, uma
mudança impulsionada em grande parte pelo aumento das emissões de dióxido de
carbono na atmosfera e outras atividades humanas.
A maior parte do aquecimento ocorreu
nos últimos 40 anos, com os 7 anos mais recentes sendo os mais quentes de todo
o período registrado até hoje. Os anos de 2016 e 2020 estão empatados como os
anos mais quentes já medidos.
E a Era do Gelo?
Antes que falem que tudo isso se
trata de um ciclo natural de aquecimento e resfriamento da Terra, tendo a
famosa “Era do Gelo” como referência, podemos usar dados concretos para mostrar
que o problema é muito pior e de origem artificial.
As áreas mais
geladas do mundo sofreram um aquecimento tremendo
Nos últimos 650 mil anos, 7 ciclos de
avanço e recesso glacial aconteceram na Terra, com o fim da última Era do Gelo
tendo acontecido há cerca de 11,7 mil anos. Quando comparamos os níveis
estimados de dióxido de carbono na atmosfera, a marca de 300 partes por milhão
nunca havia sido ultrapassada em nenhum desses ciclos. O valor foi superado no
ano de 1950 e de lá até hoje apenas nunca mais diminuiu como já bateu as 400
partes por milhão, além de continuar subindo vertiginosamente.
Esse gráfico, baseado na comparação
de amostras atmosféricas contidas em núcleos de gelo e medições diretas mais
recentes, fornece evidências de que o CO2 atmosférico
aumentou desde a Revolução Industrial. (Fonte: NASA)
“Áreas mais geladas do mundo, como o
Oceano Ártico, parte norte da América do Norte, Sibéria, todas elas sofreram um
aquecimento tremendo”, contou Perry. Para o especialista, as grandes mudanças
nessas áreas, com a perda de grandes massas de gelo, são reflexo direto dessa
alteração na temperatura média da atmosfera.
O tempo ficou “doido”?
Todo esse clima “maluco”, como muitas
pessoas enxergam temporadas quentes durante o inverno ou climas secos quando
deveria estar chovendo, entre outros aspectos, também é reflexo do aquecimento
global.
“Sempre houve um certo grau de
variação no clima, mas evidências fazem que a comunidade científica concorde
que estamos vendo cada vez mais climas extremos, especialmente no que diz
respeito à quantidade de chuvas e, por consequência, alagamentos”, explicou
Perry. “O aumento do calor faz que mais água evapore e mais tempestades
aconteçam”, ele concluiu.
As mudanças no Ártico também estão
diretamente relacionadas a esses problemas climáticos. O ciclo funciona assim:
o derretimento das calotas no polo gera correntes de ar mais “onduladas”, que
se estendem mais para o Sul e não se movem rapidamente como deveriam. Isso faz
as ondas de calor no Hemisfério Norte serem mais duradouras e as altas
temperaturas aumentarem a precipitação. Paradoxalmente, essas tempestades vão,
posteriormente, favorecer temperaturas frias mais extremas em outra estação ou
locais diferentes, ou seja, o clima está mesmo ficando “louco” e isso é
preocupante.
A ciência do nosso lado
Se tudo isso está acontecendo, como
explicar para as pessoas que o aquecimento global é uma realidade em um
contexto em que a ciência é cada vez menos levada a sério?
“Uma abordagem possível é contar
histórias sobre como as pessoas são afetadas por isso. Em minhas aulas, falo sobre experiências próprias em ver paisagens, como a
do Himalaia, dos Andes e de outras cadeias de montanhas, completamente
alteradas, com geleiras que retraíram ou, em alguns casos, até desapareceram”,
conta o explorador. “Mas mais do que isso, devemos falar sobre como isso
impactou diretamente pessoas e comunidades que vivem nesses locais”.
Para Perry, o mais importante na hora
de enfrentar a negação da ciência é construir relações saudáveis com as pessoas
e derrubar barreiras que nos separam. “Podemos usar mapas como esses e nos
aprofundar nos dados, conversar a respeito deles, ver de onde vieram, o que
querem dizer, olhar para os padrões e para o fato de que essa é a melhor
compreensão que temos sobre as mudanças climáticas”, ele falou.
Quem é o culpado pelo aquecimento global?
Quem é bem-informado e entende
minimamente de aquecimento global sabe que os abusos do mundo moderno colaboram
demais para isso tudo ocorer. Mas o quanto da culpa é nossa como indivíduos —
tomando banhos demorados, usando aquecedor no inverno e ar-condicionado no
verão — e quanto isso é causado por grandes empresas, fábricas, instituições de
produção massiva que afetam ativamente o meio ambiente?
Quanto mais os
indivíduos e as famílias tomarem atitudes para viver de maneira mais
sustentável, melhor
Para Perry, é menos uma questão de quem
é o culpado e mais de quem deve se conscientizar: “O esforço tem que ser feito
em todos os níveis. Quanto mais os indivíduos e as famílias tomarem atitudes
para viver de maneira mais sustentável, melhor, isso é importante. E quanto
mais isso acontecer, mais pessoas vão cobrar as grandes corporações de tomarem
medidas de prevenção, trabalhando em paralelo como instituição e sociedade,
tanto para um bem ecológico quanto para o próprio bem econômico”.
Rafael Farinaccio.