sábado, 17 de julho de 2010

Manual de sobrevivência do solteiro



Vamos encarar os fatos: a independência pessoal, sonhada ao longo da adolescência, não é acompanhada por um manual de sobrevivência. Não raro, se confunde alvejante com desinfetante. Acredite, são coisas distintas. Nem sempre somos preparados para sobrevivermos sozinhos num mundo em que há uma temperatura certa para se passar uma calça de brim ou um equilíbrio entre farra e contas a pagar.
Há programas, como o Larica Total, do Canal Brasil, que ensinam jovens solteiros a sobreviver com o que se poderia encontrar na casa de um adulto independente. Iniciativas assim ainda são pouco comuns. A maioria se vira na experiência diária sem muita orientação e vai, aos poucos, acumulando uma série de manias para compensar uma existência solitária e de pouco sono. A partir desta semana, este espaço vai dividir um pouco da vivência de um cabra que há 15 anos dá seus pulos.
O primeiro passo é não possuir telefone fixo. Erro clássico. Se bater saudade da família rola um dano colateral sinistro nas contas de final de mês. Ligar para a mãe para pedir auxílio sobre a melhor maneira de cozinhar o arroz, acredite, é mais comum do que se pensa. Talvez seja uma ciência que, apesar dos esforços, jamais seja dominada. A prática é que determina grande parte do conhecimento do solteirão.
A primeira mobília do barraco, melhor dizer, do esconderijo, é assunto de Estado. Tenha sempre uma boa cama. Não caia na conversa fiada de que “qualquer lugar que deitar minha cabeça é o meu lar”. Pode funcionar com o Tom Waits ou se estiver embriagado, mas experimente viver uma semana no piso frio. Dureza. Então, compre um baita colchão, do jeito que sempre quis. Parcele até a segunda vinda de Cristo, se for o caso. Mas tenha um lugar adequado para repousar os ossos.
Um detalhe importante: a roupa de cama. Ninguém nos ensina sobre isso. Apesar de ser algo que o solteirão não valoriza, é importante ressaltar que lençóis, travesseiros, fronhas e cobertas são fundamentais. Quase sempre, por causa da falta de noção, a gente descola um daqueles cobertores azuis que sapecam ou dão coceira. Tenha um pouco de juízo e compre algo que preste. Haverá noites em que o frio vai cobrar a fatura e, para suportar a madrugada, será preciso mais do que um pedaço de pano. Em todo caso, tenha sempre “algo” para aquecer durante a noite.
Em relação ainda à mobília, compre também uma máquina de lavar, um fogão e uma geladeira, nesta ordem de prioridade. Lavar roupas no muque é brabo. Hoje, com tecnologia disponível não vale a pena ir para o riacho e bater roupa nas pedras. Como a variedade de peças de vestuário do solteiro, geralmente adquiridas em supermercados, é pequena – calças jeans, bermudas de futebol, uma meia dúzia de cuecas, restos de meias e um punhado de camisetas (as de gola polo são para dias santos) –, é altamente recomendável cuidar bem do patrimônio mirrado.
Ainda não há necessidade real do guarda-roupa. É possível sobreviver com roupas penduradas em arames internos ou dobradas dentro de sacolas. Não há mal nenhum nisso. Para as moças mais cabeçudinhas, diga que é uma “intencional instalação de vanguarda artística europeia”. Não é pobreza. É opção. Quem achar ruim, que lhe dê o móvel. Solteiro em começo de vida tende a ser meio nômade mesmo, então sossegue a piolhenta. Há o truque de encaminhar roupas para a mãe, mas isso é para os fracos.
O fogão é o altar doméstico onde se sacrificam miojos à graça de sua santidade, o estômago. Ainda não entendo como não há toda uma religião construída em torno desse órgão humano. É uma entidade onipresente na vida do solteiro; uma presença constante que sempre lhe chamará a atenção quando algo estiver errado. Bebeu demais? O trem reage e devolve o excesso. Comeu algo ruim? Não se preocupe, ele digere.
Por fim, a geladeira. O mágico caixote branco onde a cerveja entra quente e sai gelada. O descanso final da manteiga – assista ao Último Tango em Paris e faça bom uso da dica – e da água fria. Quase sempre haverá ali um pedaço trincado de muçarela ou uma placa de Petri do que um dia foi um apresuntado. Tenha sempre tomate. É a melhor fruta do mundo. Serve praticamente para tudo. E previne câncer de próstata. Poderia prorrogar por uns cinco anos o famigerado exame de toque, mas médico nenhum concordaria com isso. Então, fica a esperança por novo método. Viva o PSA.
Cama, máquina de lavar, fogão e geladeira. O quarteto de todo lar solteiro. Os amigos mais fiéis que se pode ter – pelo menos até a garantia de fábrica acabar. Este é o básico para a mobília da caverna. É o pequeno preço que se paga pela liberdade. Contrato social é detalhe. Rousseau era um fresco.

Victor Hugo Lopes.

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3 comentários:

  1. Olá Willian,
    Vou ser sincera, voce me deixou sem palavras, para cada em colocação sua pensei em meu filho, hoje ainda é adolscente, mas amanhã...
    Não sei o que falar, minha vontade é de gritar, meu filhinho não. rsrsrs
    Meu carinho

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  2. oieeeeeeeee....bom diaaaaaaaaaaa...eu ja tive tudo isso , ou melhor não tive tudo isso rs...saí de casa sem nada, um tragédia !
    Mas estou viva rs !!!!!! E até que e gostava !!
    Beijos

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  3. hahaha, concordo, mas minha roupa sempre ia p/ casa a minha mãe...

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