sexta-feira, 16 de julho de 2010

A jabulani nos é confortável?



A Copa do Mundo que se encerrou, tendo como campeã a menos ruim das seleções, trouxe diversas reflexões a todos, desde a necessidade de termos a juventude como aliada à habilidade, como a pobreza das arbitragens e, também, a grande vilã, a chamada bola Jabulani, a desculpa que os atletas precisavam para se justificar. Era gente errando em bola dentro da pequena área, era gente chutando distante do gol, era goleiro errando interceptações - tudo culpa dela, da Jabulani. Jabulani é redonda, o que atrapalha certos "atletas", também chamados de craques e por ser redonda deve ser acariciada por quem por ela tem a chamada infinidade. O jogador Diego Forlan, do Uruguai, trata-a pelo seu apelido caseiro, é de casa, é íntimo - por isso os dois se dão bem.
A pergunta acima, se a Jabulani nos é confortável, merece um a boa reflexão. Jabulani poderia representar qualquer desculpa para o que desse errado nas nossas vidas ou o que funcionasse mal. Por exemplo, levei um cano de alguma mulher é culpa da Jabulani. Em vez de considerar que não fui um companheiro à altura, jogo a culpa na bola. Se uma pessoa tem mais dinheiro do que eu, em vez de reconhecer a minha incapacidade empreendedora, imagino que o tal cara deve estar roubando - Jabulani. Se o amigo de sempre que andava sumido aparecer sarado, comentarei que deve ter feito cirurgia da obesidade ou está com amante - Jabulani, em vez de considerar que o cara ralou e está tendo mais cuidado com a saúde do que eu.
Nesses casos exemplificados, a Jabulani é extremamente confortável porque nos tira o peso da comparação. Se os projetos fizeram água não foi pela nossa incompetência - foi por causa da Jabulani. Estou pensando em sugerir para o Grêmio e Inter usarem essa bola como rotina e aí teremos desculpas prontas. Nestes tempos modernos, de soluções ultrarrápidas, estamos percebendo algumas inovações semânticas. Aquele político que prometeu acabar com a prostituição no Brasil deve estar realizado porque não há mais prostitutas. Há modelos e acompanhantes de executivos. Não há mais pixações nos muros, há grafites como manifestação artística. Não há mais lixo nas ruas da cidade, há liberdade de mostrar através dos dejetos aquilo que a gente é. Não há mais voto mal votado, há exteriorização do deboche a isso o que aí está. Não são os aeroportos que são discretos, incluindo o nosso, é o número de passageiros que aumentou. Pronto, arranjamos jabulanis para vários problemas que nos afligiam e tudo está confortável para as autoridades.
Millor em seus geniais pensamentos elocubrou que, em um passado recente, para nós, os brasileiros só haviam dois caminhos: a desobediência civil ou a obediência militar. Legal, né? Tudo o que a gente faz de errado é para mostrar a insatisfação com o estado das coisas.
Mas, os tempos mudaram, continuamos errando e enquanto conhecemos maravilhas tecnológicas e tudo o que de bom e confortável o homem pode criar, continuamos com o pensamento atrasado e descompassado da evolução. Continuamos a julgar as pessoas pela cor e chegamos até a criar cotas em universidades pela cor dos concorrentes. Agora não vale mais a competência, vale a cor da pele - Jabulani. Estranho mundo que aí está escancarado. Quando se esperava harmonia e equilíbrio enveredamos para distinções idiotas e estamos inexpugavelmente em épocas sombrias. Como Millor já dizia: à noite todos os gatos são pardos e no nosso mundo todos os pardos são gatos.

Jorge Anunciação, Passo Fundo – RS.

Se desejar comente aqui ou no dihitt.

Nenhum comentário:

Postar um comentário