O momento brasileiro não tem graça nenhuma
e o vice-presidente Michel Temer, sempre tão sóbrio, foi no mínimo infeliz ao
imitar o ex-presidente Lula, sempre tão boquirroto, e dizer que toda essa baita
confusão não passa de uma "crisezinha". A ebulição política não é só
uma "crisezinha", tanto quanto o tsunami econômico internacional de
2008 não foi só "marolinha".
A "marolinha" de Lula pegou os
Estados Unidos, a Europa de jeito e o mundo inteiro de jeito, virou o que virou
e até hoje é pretexto, inclusive, para a desordem econômica herdada do primeiro
mandato da presidente Dilma Rousseff. Até o presidente do Supremo Tribunal
Federal caiu nessa, ou prefere cair nessa.
Quanto à "crisezinha" de Temer: o
rompimento declarado do deputado Eduardo Cunha com o governo acentua o clima de
guerra entre a Câmara e o Planalto e aumenta a desconfiança mútua entre o PMDB
de Temer e o PT de Dilma. Fosse só uma "crisezinha", o Planalto não
estaria de prontidão, menos para atacar, mais para se defender.
Nesse tiroteio, com bala perdida para todos
os lados, a Lava Jato segue seu rumo, não propriamente a jato, mas no tempo
certo, e cria uma cena inédita na vida nacional: os atingidos não são pobres
coitados de favelas e periferias, mas ricos e poderosos encastelados nas
grandes empreiteiras. Se o mensalão meteu os corruptos na cadeia, o petrolão
chega na outra ponta: a dos corruptores.
A Justiça acaba de condenar três
mandachuvas da Camargo Corrêa e a Polícia Federal está indiciando o dono da Odebrecht,
nada mais nada menos que a maior empreiteira do país. Vocês lembram de algo
parecido? E não vai parar por aí, porque a fila é grande e a Lava Jato entrou
na fase do "anda rápido que atrás vem gente". Depois dos
empreiteiros, diretores da Petrobras e doleiros, está chegando a vez dos
políticos.
Eduardo Cunha pode espernear à vontade, mas
ele não vai escapar tão fácil das investigações - e não está sozinho. Além dos
colegas do PMDB, inclusive o presidente do Senado, Renan Calheiros, a Lava Jato
atinge praticamente todo o PP, aliados governistas do PT e de vários partidos e
até gente da oposição. Logo, vice Temer, é até de mau gosto falar em
"crisezinha".
Se diplomatas irritam por falar muito e não
dizer nada, políticos falam muito, dizem cobras e lagartos dos adversários e
muitas vezes morrem pela boca. Os anais políticos são pródigos em expressões
que ficam como carimbos indeléveis. O "duela a quien duela" de
Collor, o "esqueçam o que escrevi" de Fernando Henrique (que ele
nega), o "estupra, mas não mata", de Paulo Maluf, o "relaxa e
goza" de Marta Suplicy, Lula chamando o filho Lulinha de
"Ronaldinho" dos negócios e, claro, Dilma enaltecendo a "mulher
sapiens" e a "mandioca". Ela, aliás, bate todos os recordes.
Mas com crise não se brinca, seja política,
econômica, ética, ou, como agora, todas juntas. Lula falou de
"marolinha" em 2008 por pura esperteza, mas Temer tentou fazer blague
com a crise atual chamando-a de "crisezinha" por simples falta do que
dizer. Como ele poderia escapar? Nem poderia romper com Cunha, muito menos
poderia romper com o governo. Então, improvisou uma gracinha, mas, no dia
seguinte, já admitiu que, em algum momento, o PMDB poder mesmo deixar o
governo.
Enquanto Temer está em Nova Iorque
menosprezando a "crisezinha" política, aqui a recessão se aprofunda,
o desemprego já empurrou 345 mil famílias no limbo e na incerteza neste
semestre e a popularidade de Dilma vai ficando abaixo do volume morto. Segundo
a CNT-MDA de ontem, ela tem 7,7% de aprovação e 70,9% de rejeição. Pior: mais
de 60% aprovam o impeachment.
E a pesquisa não é dramática só para o PT
no presente, mas também para o PT no futuro: se a eleição presidencial fosse
hoje, o antes endeusado Lula perderia no segundo turno para Aécio Neves, José
Serra ou Geraldo Alckmin. Vocês acham mesmo que o PMDB vai segurar a onda numa
"crisezinha" assim? É só questão de tempo.
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