sábado, 11 de julho de 2015

O choro do grego

Os gregos não só choram, lamentam. Desde a antiguidade. Os gregos cantam enquanto choram e choram enquanto cantam. Assim se comportou o aposentado às portas de um banco da Tessalônica. Esclareceu que não chorava por si, mas lamentava por seu país. O soluço, a torrente de lágrimas do grego contemporâneo percorreram o mundo. 

Sua perplexidade ante o estado da Grécia talvez possa ser explicado. A arquitetura do Mercado Comum Europeu, da Comunidade Europeia e, finalmente, da Unidade Europeia sob o signo do euro implicou num dos mais complexos feitos da humanidade. Unir países e povos diferentes, com suas culturas específicas, que refletem diretamente no mundo da economia, das finanças e da política, talvez ainda não seja tarefa de plena eficácia ao alcance do homem.

Os gregos antigos, patrocinadores de ideias que romperam séculos e plasmaram as instituições modernas, não eram dados ao trabalho. Tampouco ao trabalho sem sentido, que caracteriza alguns pontos do capitalismo em que vivemos. Por vezes, indago-me sobre a lógica da produção de chicletes. Caminhões atravessam o Brasil, em verdadeiras e inóspitas aventuras, transportando refrigerantes. Os gregos se limitavam a pensar. E pensaram tão profundamente que moldaram o mundo, especialmente por seu cérebro mais portentoso - Aristóteles.
O trabalho físico era feito por escravos, geralmente capturados em batalhas. Da iniquidade surgiu a construção da casa humana. Talvez, nosso processo civilizatório não conheça outro modo, ainda num estágio incipiente. Porém, é inegável que não produzimos pensamentos consequentes. Nossas ideias mais avançadas não têm compromisso com seus efeitos sociais. Era diverso o panorama da antiga Grécia. O pensador mencionado dividia o dia em três fases, no Ateneu. Pela manhã, discursava a todos. À tarde, sobre a vida doméstica, o casamento etc. E, à noite, falava aos iniciados. Sua vitalidade peripatética o fez viver até os 66 anos, que seriam prolongados, não fora sua saída compulsória da amada Atenas.



O "ethos" dos gregos nada tem a ver com o passo acelerado da revolução industrial e do capitalismo de hoje. Produzir mais e mais, porém, filosofar, romancear, poetar, menos e menos. Viver, não raro, infelizes, mas produzir. Não é preciso imaginar quem assume a liderança numa união econômica que envolve tipos tão díspares, classificada unicamente pelo tamanho do produto interno bruto e consequente participação na maior parte da moeda comum. 

Ao ser firmada a Comunidade Europeia, os gregos viviam em condições bem razoáveis. Um país que, ao longo dos anos, tornou-se rico na Europa, sobretudo graças ao turismo. Participou, por consequência, da fundação das mais importantes instituições financeiras internacionais, formadoras da "troika", que, ora, paradoxalmente, comprime-o à beira da sucumbência. Daí, o lamento do grego que se fez símbolo. Não foram vagabundos, embora tenham permitido governos deletérios, que ensejaram a acumulação de uma dívida impagável - pelo povo.
A Grécia é um exemplo da necessidade de aperfeiçoamento da Unidade Europeia, em que assumam seus lugares as preocupações políticas, econômicas, sociais e, até mesmo, as comezinhas do cotidiano doméstico. Assim, os gregos contribuíram para a formação do mundo. Exemplo que conduz à formação de lideranças, a grupos de pensadores europeus, que não se limitem ao FMI, ao Banco Mundial e ao Banco Europeu. O mundo não pode ser conduzido por boa parte de assemelhados a fábricas de chicletes e de refrigerantes. 

O choro do aposentado Gorgos Shalzfotradis não foi apenas choro e desespero. Foi, também, o canto de esperança dos gregos. "Tanto a Europa quanto a Grécia cometeram erros. Temos de encontrar uma solução.". Atravessa os séculos, pois.  É o lamento do homem sensato. O antípoda da tecnologia cega e do dinheiro como um fim em si. As ilhas gregas continuam belas e sua população é credora do mundo. Não de valores monetários, mas de expressões humanísticas. 

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