sábado, 25 de setembro de 2010

A depressão da matéria ao espírito



Morre um milionário que tinha depressão. Vários profissionais de saúde aparecem na mídia, cada um com uma hipótese, um diagnóstico midiático, um acho, uma teoria, um talvez. Nenhum dos citados conheceu o falecido, porém todos especulam o motivo pelo qual um homem tão rico põe fim à própria vida.
Atestando a própria incompetência, certos profissionais de saúde vêm a público para “garantir” que depressão não tem cura, mostrando o seu despreparo , por vezes retirando a esperança de melhora de um paciente que não está bem. Por que não ficar calado? Para que falar asneiras? Outros “profissionais” emergem apenas para satisfazer o processo de sadismo da mídia, no jornalismo sanguinário estilo “quanto mais sangue, melhor”. Assim, análises psiquiátricas, laudos psicológicos transgridem a moral e a ética, expondo de forma vil a suposição sobre a vida de falecidos, baseado na condenação pelo senso comum de “achos” e “talvez”. Fofoca virando hipótese diagnóstica na retroalimentação da carnificina midiática. Tudo para que um “doutor” vire celebridade, mostrando que é mais um prisioneiro do senso comum, da fofoca, exercitando o julgamento moral do que desconhece. Para que ter ética ou o respeito ao próximo? O que significa respeito?
Atualmente, artistas, milionários, celebridades têm depressão como toda pessoa. Ninguém está livre de ter uma patologia mental por que tem ou não dinheiro ou fama. Doenças, como a morte, são democráticas. Atingem a todos, independentemente de religião, idade, raça, classe social, nível cultural, gênero. Por que idolatramos os que se sobressaem em nossa sociedade, esquecemos que todo milionário e artista também é gente. Sofrem, têm ressaca, levam fora, choram, têm sensibilidade, sentem solidão, às vezes necessitam de um ombro amigo e de um amigo que não os olhe apenas como uma chance de fazer um bom negócio.
No mundo materialista em que vivemos, no qual o que importa é ter e não ser, há frequente inversão de valores espirituais como a solidariedade, o amor, o cultivo da consciência, a busca de autorrealização, tudo vem sendo trocado por um consumismo exacerbado pela vaidade e pelo egoísmo. Por que tanto isolamento e tanta ilusão em nossas vidas? Por que fazemos questão de fomentar a vida vazia? Durante os vários anos que atuamos tratando diariamente de pacientes com depressão percebemos que as crises, em verdade, evidenciam o confronto da consciência com o nosso destino. Quem sou, de onde vim, para onde vou? A epidemia de depressão na atualidade evidencia a crise da individuação, na qual o ser humano perdeu seu referencial de autorrealização. Racionalismo exacerbado, projeção de culpa, rótulos superficiais, egoísmo, apatia, carência, materialismo , tudo isto faz parte do projeto pós-moderno de existir em sociedade. Podemos escolher a vida superficial e sem sentido ou a consciência crítica e a busca de realização. Mas a dúvida imposta pelo universo, pela depressão, é a seguinte: como encontrar sentido e alegria na casca, no vazio da superficialidade, no consumismo ou no materialismo?

Jorge de Lima. Para saber mais: www.olhosalma.com.br

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