domingo, 31 de outubro de 2010
Os abacates do pastor e a divertida ética do professor
Os candidatos à presidência falaram muito em educação e nos professores no dia do professor e quando indagados sobre o tema. Agora já não falam mais e o eleito esquecerá tudo com certeza após o pleito. Isto funciona assim mesmo. Eu, na contramão desta fala interesseira e oportunista, vou continuar falando deles. Conto-lhes outra história de professor, desta vez reproduzindo uma antiga coluna da minha colega e esposa Dóris Santos:
“Acompanhei pessoalmente esta história que agora lhes conto. O professor de um tradicional colégio e internato alemão pegou em menino da quinta série chegando à escola com alguns abacates roubados à casa de um pastor que tinha seu pátio colado ao muro do colégio. O velho professor mandou o menino ir à casa do pastor devolver os ditos e confessar seu crime à mulher do pastor. O menino disse que não iria: pediu, implorou, sugeriu que o professor o deixasse “cassado” até o final do ano, tudo menos ir à casa do pastor e devolver os abacates. Mas o professor ficou irredutível. Sem alternativa, o menino foi. Passados alguns dias, o professor encontra a mulher do pastor que lhe diz: ‘professor, eu estava mesmo querendo lhe encontrar para agradecer os abacates que o senhor me mandou de presente. Eu disse ao menino que o senhor não precisava se incomodar, pois eu tenho um abacateiro em casa. Ele disse que o senhor fazia questão que ele me desse aqueles abacates’.
Sabem que aconteceu com o moleque? Nada. O velho professor reconheceu e admirou a superioridade da inteligência do malandro. A moral da história está construída sobre a história da moral. O professor queria uma saída ética para o deslize do nosso adolescente onde o ‘não roubarás’ fosse respeitado. Nisso era irredutível. Todo o resto poderia ser negociado. A punição não era a essência da lição e a moral do professor não se confundia com moralismo. Era um homem muito inteligente e um de seus dons era também admirar, respeitar e estimular a inteligência de seus alunos. Se educar é ‘tirar para fora’ – propiciar que algo brote, apareça de dentro – o professor era mestre: desafiava sempre que pudéssemos vencê-lo pela inteligência e pela ética. Quando o vencíamos assim, ele também vencia em sua missão de nos tornar pessoas inteligentes e produtivas.
Se a mentira sobre o presente adquire importância é porque ela permitiu ao pequeno proteger-se e preservar-se de um nível desnecessário e antipedagógico de exposição e humilhação frente à mulher do pastor. Aqui reside a diferença entre o amor pela lei e a obediência à lei. Podemos obedece à lei para não sermos punidos; podemos respeitar a lei porque a amamos, no sentido de que nos torna pessoas melhores e nos protege de atingirmos a nós mesmos e ao semelhante.
A diferença está no modo de aprendizagem da lei, geralmente pela mão de seus representantes em nossa cultura – pais e professores – e na maneira como ela é incorporada pelo sujeito. Se a internalização se dá com base no amor e no respeito – o professor fazendo com que o menino repare seu erro sem por isso maltratá-lo, permitindo-lhe articular uma saída a partir se si mesmo ao devolver sem se humilhar e apropriando-se da figura do mestre para se proteger – o resultado é benéfico e a lei um enunciado que protege. Se a lei é internalizada como simples punição, haverá uma falha fundamental: ela será sentida não como ato amoroso e preocupação do outro com nosso bem, e será obedecida em função do medo da punição – pelo temor. A tendência será escapar da lei quando a punição estiver ausente ou então tornar-se tremendamente crítico consigo mesmo.
. A tolerância amorosa em relação às falhas dos filhos também é vital, da mesma forma que a indiferença e ausência de indignação com as atitudes em que se produzam dano é fatal. O professor sabia, reconheceu e emprestou-se para isso. Ele podia não ter total consciência do que realizava, mas era dono de um patrimônio oral que dedicava a dividir com seus alunos. Há riqueza maior para repartir?
Francisco Carlos dos Santos Filho no DM-PF.
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Postado por
William Junior
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07:39
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Bela história - ele mandou e o garoto obedeceu. Era pra desvolver os abacates e estes foram devolvidos. O garoto agiu com esperteza e o professor concluiu que, de uma maneira ou de outra, o garoto devolveu o que tinha roubado, mas ninguém precisaria saber disso, uma vez que ele arrumou uma bela desculpa pra devolver. Bom, gostei...
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