As justas manifestações de inconformismo do povo brasileiro, do norte ao
sul do País, por refletirem um mal-estar intuitivo e não
um objetivamente elaborado elenco de problemas e soluções necessárias,
gerou dois tipos de preocupação: um, dos cidadãos de bem, dos formadores de
opinião e, sobretudo, dos acadêmicos relacionados à política; outro, dos
políticos, postos no epicentro do furacão, identificados corretamente como os
vilões de todas nossas mazelas.
Os primeiros se debruçaram honestamente, ainda que com pontos
de vista diferentes, sobre as causas do desconforto coletivo; os segundos trataram de formular um reducionismo
barato, ao apontar causas que jamais levariam milhões de pessoas, não só
jovens, mas famílias inteiras, a deixar seus indescartáveis automóveis em casa
e lançar-se a um pedestrianismo de longas jornadas peripatéticas que abalaram o
continente Brasil. Em outros termos, as coisas não se resumem a centavos nas
tarifas de ônibus e à corrupção. Embora sejam problemas sérios, principalmente
no que se refere à apropriação indébita do dinheiro público, há muito
mais.
Lamentavelmente, borrascas contornam nossos horizontes em todos os
pontos cardeais; para alguns analistas internacionais menos pessimistas,
por seis meses; para outros, no mínimo por dois anos. A um povo que sempre
viveu em crise, a dor, agora, é maior, porquanto nos venderam, de modo leviano,
uma decolagem que se converteu numa derrapagem e a aeronave se danificou.
Rafael Dix-Carneiro, professor assistente de economia da Universidade de
Mariland observa: "O país (Brasil) tem problemas que vão mais a fundo do
que os muito alardeados protestos contra a corrupção e o aumento de tarifas de
ônibus. Inflação alta, preço das commodities em baixa e erros de um governo
intervencionista estão pesando sobre o crescimento. O Brasil ainda tem sérios
problemas estruturais, que geram dúvidas sobre seu desempenho econômico a curto
e médio prazo."
Rich Harper, analista do Wisdon Tree, em notas aos investidores, pontuou
que "A combinação de dois fatores - inflação acima da zona de conforto do
Banco Central e as projeções de crescimento recentemente revisadas para baixo -
trouxe nuvens negras sobre o mercado brasileiro."
Um dos maiores fãs dos mercados emergentes, Win Thin, diretor global de
mercados emergentes na Brow Brothers Harriman & Co tem alertado seus
clientes para ficarem longe do Brasil pelos menos de três a seis meses e
concluiu: "Há um sentimento crescente de que a fábula de Cinderela do
Brasil saiu dos trilhos".
Os dados negativos de nosso mercado de fato impressionam e
preocupam: Ibovespa e real em relação ao dólar em seu nível mais baixo em 4
anos; queda de 17,1% do Ibovespa desde 22/5, quando Ben Bernanke deixou os
investidores preocupados com o possível fim do afrouxamento monetário (pelo
mesmo motivo, as bolsas da Índia e do Peru caíram 7,1% e 8,3%,
respectivamente); hemorragia de US$ 179 milhões em média, mensal, dos fundos de
ações brasileiras sediados nos EUA, no último ano e meio, período em que os
demais emergentes cresceram mensalmente em US$ 3,5 milhões (Thomson Reuters);
as ofertas públicas de ações brasileiras tiveram um início recorde neste ano e
davam indício de recuperação, mas desabaram nas últimas semanas, a ponto de a
Votorantin Cimentos e a empresa aérea Azul já terem batido em retirada.
Michael Fitzgerald, do escritório de advocacia Paul Hastings, não
vislumbra rápida recuperação: "Estou falando de pelo menos dois anos. O
Brasil foi apanhado numa tempestade perfeita, provavelmente com cinco ventos
contrários."
A iminência do rebaixamento de nossa classificação de crédito pela
Agência Standard & Poors é uma probabilidade.
Sangra esse nosso discurso de velório, depois de tantas esperanças
despertadas por irresponsáveis na consciência do povo brasileiro.
Confiram-se as assertivas "in" "Mercados do Brasil sofrem mais
que os de outros países emergentes", de Melvin Beckman, do Wall Street
Journal, traduzidas para o Jornal Valor Econômico.
Comente este artigo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário