entrevista – Psicóloga Sarah Cassimiro.
“Na mentira compulsiva, tal comportamento está fora do esperado”
Especialista
afirma que os dependentes da mentira sabem que estão a mentir, mas não
conseguem se controlar.
Às
vezes, usada para o bem e às vezes para o mal, a mentira já fez parte da vida
das pessoas pelo menos uma vez. Existe uma frase muito conhecida que afirma que
quando uma pessoa diz que não mente, ela já está mentindo. Mas existem pessoas
que mentem em excesso, portadoras de um transtorno chamado mitomania ou mentira
obsessiva-compulsiva. Em entrevista ao jornal Diário da Manhã, a
psicóloga Sarah Cassimiro Marques, especialista em Neuropsicologia e mestre em
Neurociências do Comportamento, explica o que é a mitomania, quais os sintomas
e como é o tratamento.
Diário
da Manhã – Qual
a diferença entre o mentiroso comum e um que é doente?
Sarah
Cassimiro – A
mitomania ou mentira compulsiva é uma tendência patológica pela mentira. Isso
significa que o comportamento de mentir se encontra fora da normalidade, visto
que todo ser humano mente. Há vários critérios de normalidade, mas os
utilizados pela Psicopatologia (estudo das patologias) é o critério de
normalidade disfuncional e normalidade como um processo. No primeiro, o
fenômeno é considerado patológico a partir do momento em que produz sofrimento
clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou
em outras áreas importantes da vida do indivíduo. No segundo critério são
considerados aspectos dinâmicos do desenvolvimento psicossocial, das
desestruturações e reestruturações ao longo do tempo, de crises, de mudanças
próprias a certos períodos etários do indivíduo que possam explicar tal
comportamento. Por exemplo, é esperado que uma criança de até 6 ou 7 anos de
idade minta, pois a distinção de verdade e mentira até no máximo 8 anos ainda é
tênue. A criança, até esse faixa etária, costuma confundir realidade com seu
mundo imaginário. Portanto, a diferença de um mentiroso comum e um doente é que
na mentira compulsiva tal comportamento está fora do esperado para idade e
escolaridade da pessoa e o indivíduo não consegue sozinho interromper esse
processo, mesmo que ele continue acarretando prejuízos para o indivíduo,
interferindo no julgamento racional, no relacionamento familiar e especialmente
social.
DM – O
que é a mitomania?
Sarah
Cassimiro – A
mitomania ou mentira compulsiva é uma tendência patológica pela mentira. Essa
entidade nosográfica foi proposta por Dupré em 1905, que a definia como a
tendência patológica mais ou menos voluntária e consciente da mentira e da
criação de fábulas imaginárias.
DM – A
pessoa sabe que está mentindo de forma doentia?
Sarah
Cassimiro – Os mitômanos têm consciência que estão mentindo, porém são
anosognósticos, ou seja, não possuem consciência de que tal comportamento faz
parte de uma patologia e que precisa ser tratado. A tendência à mentira
torna-se perseverante.
DM – O
que causa a mitomania?
Sarah
Cassimiro – O
comportamento anormal não surge repentinamente, nós aprendemos a ser doentes:
resultado da interação de influências comportamentais, biológicas, emocionais,
sociais e de desenvolvimento. É um processo complexo e fascinante na qual
podemos identificar fatores predisponentes (tornam o indivíduo mais vulnerável
a patologia, por exemplo, histórico familiar de transtornos mentais),
desencadeantes (marcos ambientais e biológicos que suscitam o comportamento,
como lesões cerebrais ou traumas psicológicos) e agravantes (acentuam o
comportamento, como uso de drogas).
DM –
Quais os sintomas dessa doença?
Sarah
Cassimiro –
Declarações repetidas de inverdades; mentiras verificadas ao longo de anos,
podendo se tornar parte do estilo de vida; mentiras como um fim em si mesmas,
ou seja, motivações externas, como vantagens sociais ou recompensas materiais
não parecem ser os motivadores primários para o comportamento; mentiras
aparecem frequentemente na forma de narrativas complexa; tentativas falhas no
controle de tal comportamento; prejuízos sociais advindos do comportamento de
mentir; negação da existência de patologia. Os dependentes da mentira sabem que
estão a mentir mas não se conseguem controlar, num processo que surge de uma
forma muito semelhante ao do vício do jogo ou à dependência de álcool ou de drogas.
Para o diagnóstico da mitomania, deve-se excluir a existência de algumas
condições psiquiátricas que tradicionalmente são ligadas à mentira:
Confabulação, Síndrome de Ganser, Transtorno Factício, Transtorno de
Personalidade Borderline e Transtorno de Personalidade Antissocial. Além disso,
é possível observar mentira nos Transtornos de Personalidade Narcisista e
Histriônica.
DM – A
mitomania tem cura?
Sarah
Cassimiro – O
tratamento recomendado é a psicoterapia. Ela ajuda o indivíduo a identificar os
fatores influenciadores no processo de instalação da doença e as crenças e
esquemas disfuncionais subjacentes. Além disso, trabalha o desenvolvimento de
novos repertórios, trabalhando a extinção deste comportamento disfuncional de
mentir. Assim sendo, o paciente consegue uma reinserção saudável no ambiente
social.
DM –
Familiares e amigos podem ajudar uma pessoa que está com esta doença? Se sim,
como?
Sarah
Cassimiro – Sim,
primeiro ajudando a identificar a patologia, já que o individuo nega a
existência dela, dificultando a adesão ao tratamento. Segundo, contribuindo no
tratamento em si quando houver a solicitação do psicoterapeuta.
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Parabéns pela página! Andréa - D.R.A. Busologia - http://drabusologia.site.com.br/.
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