Hoje, sabemos tudo praticamente na hora em
que as coisas acontecem. Mas será que sabemos tudo?
Você está
navegando na Internet, clica em um site qualquer e resolve “curtir" uma
notícia. Depois, passando o tempo no Facebook, lê um daqueles textões bacanas
de seu amigo engajado politicamente, “curte" aquilo e segue a vida como se
nada tivesse acontecido.
Há não
muito tempo, quando eu era criança e morava com os meus pais, tínhamos todos as
mesmas fontes de informações. Praticamente o país inteiro aguardava o Jornal Nacional
para ouvir o Cid Moreira falar sobre os acontecimentos do dia.
Para quem não
gostava do Cid, duas ou três opções a mais bastavam. Se você quisesse mais
detalhes, podia comprar um jornal no dia seguinte e ver o que eles diziam sobre
o assunto.
Hoje,
sabemos tudo praticamente na hora em que as coisas acontecem. Aplicativos de
notícias jogam as novidades para os nossos celulares. As redes sociais começam
a ferver. Na hora em que o William Bonner ou algum de seus concorrentes começa
a falar, já temos uma boa ideia do que está acontecendo.
Toda essa
oferta de fontes, referências e opiniões causou um problema lá atrás quando a
Internet começou a crescer. Os mais velhinhos vão lembrar que antes a rede era
organizada por ordem alfabética, como o “Cadê" no Brasil, ou organizada
por pessoas de carne e osso, como o Yahoo fazia.
O Google
mudou tudo e começou a organizar as coisas por popularidade. Sites mais
populares, apareciam primeiro. Em teoria, se algo era popular, era mais
interessante. Com o tempo, a tecnologia permitiu que não só os artigos mais
interessantes fossem apresentados antes na sua tela, mas os motores de busca
aprenderam a desvendar as coisas que eram mais interessantes para você.
Os
resultados passaram a ser customizados, com cada usuário recebendo resultados
de acordo seus gostos e histórico.
Você já
deve ter percebido isso quando, ao fazer uma busca por um produto, começa a ver
anúncios e sites sobre o tema por todo canto. O mesmo acontece no Facebook,
quando você começa a “curtir" coisas daqueles seus amigos engajados.
Quanto mais você clica, curte e compartilha, mais coisas parecidas com o que
acabou de clicar, curtir e compartilhar surgirão à sua frente.
Isso é útil. Afinal, queremos praticidade. Queremos coisas úteis para nós. Queremos as informações mais relevantes, que mais nos interessam, o mais rápido possível.
Tudo isso
também gera um outro efeito. Quanto mais individualizamos nossos resultados,
mais ensinamos aos computadores à nossa volta o que gostamos, e mais homogêneo
o mundo vai se parecer para nós.
É
simples. Digamos que você goste de assuntos “de esquerda”. Você vai clicar em
sites, concordar com amigos e ler textos que reflitam sua posição política. Em
breve, estará recebendo muito mais notícias a favor do seu modo de pensar do
que contra. Em pouco tempo, ficará com a impressão de que o mundo inteiro
concorda com você. O mesmo vale para quaisquer outros posicionamentos
políticos.
É quase
como uma profecia auto-realizante. Sem nem perceber, você se cerca cada vez
mais de opiniões que concordam com a sua visão de mundo. Em pouco tempo, está
cercado desse tipo de opiniões. Não é a toa que opiniões divergentes parecerão
estranhas. Se tudo que você lê a respeito de um tema está “certo”, como alguém
ousa discordar?
Isso, ao
meu ver, explica boa parte da radicalização que vemos nos discursos de temas
que vão de liberdade religiosa a assuntos polêmicos como aborto e questões
relacionadas ao destino político do país. Pelo volume de notícias que
recebemos, temos a impressão de que as coisas são óbvias e não é possível que
os outros não vejam da mesma forma.
Acontece que os outros, tendo treinado seus
próprios Googles e Facebooks, também receberão uma enxurrada de artigos. Todos
contrários ao que você acredita, e se pegará pensando em como você não enxerga
a verdade.
Talvez,
na época do Cid Moreira, fôssemos mais felizes porque sabíamos que tínhamos
menos informações. Hoje, com a “certeza" de termos lido tudo a respeito,
nos esquecemos de olhar o outro lado.
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