Que atire a primeira pedra quem nunca curtiu ou
compartilhou um texto ou vídeo na internet antes mesmo de lê-lo ou assisti-lo
até o final. Ou quem não clicou em um arquivo recebido por e-mail, mesmo sem
ter certeza do que se tratava. É grande o número de pessoas que passam alguma
informação para frente antes mesmo de saber o que ela diz em sua totalidade. Os
dois primeiros parágrafos de um texto, ou os 45 segundos iniciais de um vídeo,
já são suficientes para a maioria das pessoas decidirem se devem ou não compartilhá-lo
com seus amigos. O que poucos sabem é que isso pode trazer problemas para a
vida pessoal ou profissional do apressadinho, além de indicar, em casos
extremos, o início de algum distúrbio psicológico que deve ser visto com certa
cautela.
A síndrome do clique nervoso, ou síndrome do clique
compulsivo, que é a definição dada à atitude das pessoas que clicam em quase
tudo que vê, na internet, antes mesmo de ter certeza do que se trata, pode
também trazer problemas financeiros. Não são raros os casos de pessoas que
tiveram seus computadores infectados com programas espiões que roubam dados,
como senhas de bancos, de e-mails, de redes sociais, entre outras. Com essas
informações em mãos, bandidos podem fazer compras em nome do usuário
descuidado, sacar dinheiro em sua conta e até postar mensagens em seu nome nas
redes sociais.
O diretor de arte Neyron Mendes passou por alguns
problemas quando clicou em um link na sua página da rede social, sem se atentar
o suficiente sobre o que se tratava. "Eu recebi um convite no Facebook, de
uma amiga, e assim que eu cliquei, ele foi reenviado automaticamente a toda
minha lista de contatos, que são mais de mil. O Face noticiou que eu tinha
feito algo errado e me bloqueou na mesma hora", explica.
Neyron precisou pedir ajuda a uma amiga para
informar a todos os seus contatos que o link que ele havia enviado se tratava
de um vírus e que não deveria ser aberto. Mesmo assim, muitos da sua lista não
se atentaram para a advertência, se contaminando e disseminando ainda mais o
problema. "Hoje eu tomo mais cuidado na hora de acessar alguma
coisa", comenta.
Essa não foi a primeira vez que o diretor de arte
teve problemas com arquivos recebidos pela internet, anteriormente já havia
tido problemas ainda maiores devido ao acesso de conteúdo duvidoso na internet.
"Recebi um e-mail da minha irmã, e ao clicar, era vírus. Esse caso foi
mais sério, pois foi preciso formatar o computador para remover o
problema", informa.
Após passar por esses transtornos, Neyron decidiu
por mudanças drásticas, com medo de ter prejuízos ainda maiores do que os
anteriores. "Depois da experiência do e-mail eu desisti de usar até o
cartão de crédito. Vi que as coisas não são tão seguras como eu pensava",
relata. "Hoje eu não compartilho nada antes de ler tudo, e ter certeza.
Mas, ainda assim acho que tenho um pouco da síndrome do clique compulsivo. Às
vezes, como trabalho muito tempo no computador, acontece de clicar em alguma
coisa sem saber direito do que se trata, mas estou bem mais controlado, depois
de ter passado por tudo isso", esclarece.
Identidade On-line
Com a síndrome do clique compulsivo, a pessoa pode
criar uma identidade virtual diferente da que ela realmente deseja. Quando se
curte ou compartilha algo, sem saber ao certo do que se trata, pode-se estar
disseminando uma ideia contrária à que a pessoa realmente segue, e ela pode
passar a ser identificada a partir daquele hábito.
Pode ser que uma pessoa não seja racista nem
preconceituosa, mas há de ser definida como tal, devido ao que curte ou compartilha
na internet. Como o mundo virtual está cada vez mais presente na vida das
pessoas, o histórico de suas atividades on-line pode dizer muito do que ela é,
por isso a necessidade de se dar mais atenção aos cliques, quando se está
conectado.
"Se eu não ler a mensagem por completo, posso
acabar difundindo algo que não condiz com o meu pensamento real, e na internet
você é o que você pensa. Como as pessoas vêm apenas o que é postado, o seu
discurso que é importante", explica a especialista em Mídias Sociais e
Gerenciamento de Crise na Internet, Patrícia Teixeira.
Segundo a especialista, a síndrome do clique
nervoso tem muito haver com o novo perfil do internauta, "são pessoas
ansiosas, não aderem à informação, mas acham que têm que passar pra frente. Na
verdade não é necessário curtir e compartilhar tudo que se lê, mas somente o
que lhe interessa realmente". Ela explica que é preciso se atentar para a
mensagem que é compartilhada na internet, pois ela pode afetar a identidade do
usuário. "A identidade não é formada apenas pelo nome e a foto de um
perfil, mas também de como a pessoa se comporta quando está conectada",
destaca.
Patrícia acrescenta que a síndrome do clique
nervoso está ligada não apenas ao ato de clicar em tudo que se encontra pela
frente, mas também na necessidade que algumas pessoas sentem de postar alguma
coisa a cada minuto. Há quem divulgue tudo que está fazendo, e suas postagens
chegam a irritar os demais, e ela se torna inconveniente. "Eu mesma já
bloqueei várias pessoas em minhas redes sociais por não suportar tantas
publicações inúteis", conta.
De acordo com a profissional, "tudo que se faz
hoje, online, fica registrado, e a internet nunca esquece". Sendo assim,
as postagens, os compartilhamentos, ou as curtidas, corroboram para a formação
do perfil do usuário, e ele será visto não pelo que pensa que é, e sim pelo que
a internet diz. "As pessoas não pensam nisso, mas as redes sociais é o seu
banco de dados, fica tudo ali, registrado", realça.
Geração Ansiosa
A psicóloga e professora do Instituto de Pós
Graduação de Goiás (Ipog), Cyndia Bressan, alega que o clique compulsivo pode
estar relacionado com as características presentes no modo de vida dessa geração
atual, que extrapola o âmbito da internet, se mostrando também na vida real.
"Essa geração que temos hoje, chamada Geração Y, quer tudo mais rápido, e
talvez, por isso, gera-se muita ansiedade. Mas não é somente na internet, se
olhar o computador de uma pessoa dessas, dá pra notar que tem várias janelas
abertas de uma só vez, pois ela não quer perder tempo", explica.
Para a psicóloga, o comportamento virtual pode ser
apenas um reflexo de como a pessoa vive, e como a tecnologia permite trabalhar
por até 24 horas por dia, isso acarreta ainda mais ansiedade, tornando o
dia-a-dia cada vez mais cansativo. "Hoje o indivíduo se comporta na
internet da mesma forma que é no trabalho e na família, então leva essa
ansiedade para outros ambientes nos quais ele convive", destaca.
Cyndia conta ainda que as pessoas com clique
nervoso compartilham sempre muita coisa de uma só vez, "sem nenhum
critério de escolha, nenhum consenso e sem ter noção real do que está
compartilhando". Isso pode indicar problemas de ansiedade e conforme
informou a psicóloga, a ansiedade pode desencadear inúmeros problemas de saúde.
Segundo Bressan, ao perceber que se está usando a
internet de forma compulsiva, a pessoa pode, sozinha, buscar soluções para
isso. "Ela não precisa procurar tratamento, a não ser em casos extremos.
Pode começar a se policiar, buscar desenvolver outras atividades fora da
internet, que lhe dê prazer, e a principal coisa a fazer é verificar se isso
não a está prejudicando de alguma forma", conclui.
Problemas no trabalho
O mau uso das redes sociais em ambiente de
trabalho, também pode acarretar problemas a funcionários que possuem hábitos
compulsivos. A psicóloga Cyndia Bressan, que também é mestre em psicologia
social do trabalho, fala que a ansiedade dessas pessoas pode contagiar outros
ao seu redor, além de perder, na internet, muito tempo que deveria ser dedicado
ao trabalho. "Se ela começar a postar em redes sociais coisas muito
íntimas ou gastar muito tempo do trabalho para utilizar a internet, pode até
ser desligado da empresa", diz.
Dependendo da situação de trabalho, o funcionário
passa a ser, mesmo na sua vida pessoal, um apêndice da empresa. Nesses casos,
as postagens e compartilhamentos em redes sociais devem ser ainda mais
criteriosos, pois podem agredir diretamente a imagem da empresa, e não apenas
do funcionário.
Outro ponto apontado pela psicóloga social do
trabalho é a importância das redes sociais no momento da contratação do
funcionário. Ela conta que, através de uma visita ao perfil de uma pessoa,
pode-se descobrir muito sobre ela. "Muitos recrutadores pesquisam as redes
sociais dos indivíduos. O que você posta, compartilha ou curte é o que você
realmente é, pois ninguém é obrigado a compartilhar nada, então isto é uma
forma do recrutador conhecer, de fato, o candidato", expõe.
Mais riscos
O clique compulsivo, além de manchar a identidade
virtual do indivíduo, pode também lhe trazer inúmeros problemas financeiros,
como o exposto pelo diretor de arte Neyron Mendes, que precisou formatar o
computador, perdendo muitos documentos. Clicar em muitos links, sem critério,
coloca em risco todos os dados pessoais do usuário, podendo causar ainda mais
transtornos.
O professor do Ipog Marcelo Roncato é especialista
em segurança na internet e explica que, ao clicar em algum local indevidamente,
e acessar um provedor mal intencionado, o usuário estará abrindo as portas do
seu computador para outro acessá-lo, podendo inserir ou retirar qualquer coisa
da máquina. "Alguém pode colocar informações na sua máquina, ou retirar
informações dela. Além de entrar em um mundo que não é o seu, só por que você
clicou em algo por curiosidade, seus dados podem ser usados para fazer alguma
coisa em sem nome, inclusive compras pela internet, ou mesmo ser postado alguma
coisa na sua rede social, como se fosse você", expõe.
Roncato fala que, como o facebook é uma comunidade,
mesmo que algumas pessoas sejam mais criteriosas em relação ao que clicar e
quais links abrir, outras de sua lista de contato podem não ser, colocando
todos em risco. "Não existe segurança total na internet, mas o que a gente
aconselha é colocar programas que diminuam os riscos e que se tenha mais
atenção na hora de clicar em algum link, não sendo tão ansioso. 100% de
segurança na internet é complicado", alega.
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