O debate sobre a regulamentação do uso
medicinal da maconha será feito separadamente da discussão em torno do uso
recreativo e industrial da planta na Comissão de Direitos Humanos (CDH) do
Senado. A decisão foi informada nesta segunda-feira (25) pelo senador Cristovam
Buarque (PDT-DF), que comandou a terceira audiência pública na comissão. “Na
parte medicinal, a gente não pode demorar”, explicou o senador.
“O processo levou a isso. Além disso, essas
crianças estão sofrendo. Quem está usando recreativamente ou está com medo de
ser preso, pode se aguentar um tempo. Quem está com uma criança doente não pode
esperar, por isso tem que ser urgente”, disse o senador, que adiantou que em
poucas semanas vai apresentar um relatório à CDH para que seja elaborado um projeto
de lei que regulamente o uso medicinal.
O senador conduz o tema na CDH porque foi
escolhido relator para um projeto de lei de iniciativa popular que trata da
legalização do plantio doméstico de maconha e do comércio em locais
licenciados. Cristovam também garantiu que o fato de separar o tema em dois não
vai fazê-lo arquivar a discussão sobre a regulamentação do uso recreativo da
substância.
A audiência pública teve a participação de
Katiele Fischer, de Brasília, que relatou a experiência com a filha Anny
Fischer, em Brasília, que depende do uso de um derivado da maconha, o
canabidiol, para controlar crises convulsivas que não têm tratamento com outra
medicação. Katiele Fischer, mãe da menina, fez um apelo para que as
universidades brasileiras sejam “libertadas para [pesquisar] o uso medicinal da
maconha”.
Emocionada, Katiele disse que, ao longo
daquela audiência, senadores e participantes veriam a filha ter várias crises
convulsivas, se estivesse no local. “Considerando-se a epilepsia refratária,
sabemos que há um risco de uma parada cardíaca ou uma parada respiratória em
cada uma delas. Agora, o senhor pode imaginar viver isso 24 horas por dia? O
senhor imagina uma mãe acordar oito vezes durante a noite para poder acudir um
filho? O que a gente pede é que seja discutido isso com as armas abaixadas“,
disse a mãe, dirigindo-se a Cristovam Buarque.
A representante do Escritório das Nações
Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc), Nara Santos, reconheceu os resultados do
uso medicinal de derivados da maconha e ressaltou a importância de pesquisas
sobre o assunto. Além disso, alertou para a necessidade de ações para afastar o
preconceito com relação a esse tipo de medicamento.
“O estigma, hoje, representa uma das
maiores barreiras ao acesso de pessoas que fazem uso de qualquer droga ilícita
a serviço da saúde. Ideias equivocadas, associadas a desvios de caráter,
estereótipos com relação à falta de força de vontade e julgamentos morais ainda
são um grande obstáculo à implementação de políticas na ponta. Por isso, ações
voltadas ao enfrentamento do estigma e do preconceito também são fundamentais”,
alertou.
A servidora pública Luciana Bezerra Von
Szilagin, da Paraíba, também relatou as dificuldades que tem com as cerca de
200 convulsões que o filho Vitor, de 21 anos, sofre por mês, devido a uma
epilepsia de difícil controle. Segundo ela, o filho usa canabidiol há 17 dias e
já apresentou melhora motora e cognitiva, além de ter tido as convulsões
reduzidas em quantidade e intensidade.
“A minha questão moral, profissional, no
combate à droga ou ao pensamento da liberação, vem de encontro ao meu
sentimento de mãe. E eu pergunto a qualquer um de vocês o que não fariam por um
filho. Trafiquei, comprei o remédio antes de sair a minha liminar, porque eu
quero dar ao meu filho, sim, a oportunidade de ser feliz, de ter dignidade e,
principalmente, de viver, porque a nossa luta é pela vida. E é isso que eu peço
aos senhores encarecidamente: discutam a nossa urgência por um projeto de lei
que libere o uso medicinal”, pediu.
Alguns participantes, mesmo com o
depoimento das mães, foram contra a regulamentação do uso da maconha para
qualquer fim, mesmo o medicinal. “O que se fala hoje em remédio é um passo para
destruir este país. Se maconha fosse bom, não estaríamos discutindo isso aqui.
Se querem legalizar uma droga, devem procurar outros meios, não essa, forjada,
tentada por meio de tratamento de saúde”, reclamou o senador Fleury (DEM-GO).
A advogada Rosana Brasil Kopf também
manifestou opinião contrária, em nome da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do
Ceará. “A prevenção é a não legalização. Se nós já temos o álcool e,
principalmente, o cigarro, que são drogas lícitas legalizadas, por que mais
uma? Por que não investimos na educação? Por que não investimos em um debate
sobre a prevenção?”, questionou.
Para o policial federal Nazareno Feitosa, o
uso terapêutico deve ser permitido, mas com o maior cuidado possível. “Temos
uma dificuldade muito grande de fiscalizar. Imaginem a fiscalização de uma
droga que sabemos – isso não é matéria que está em discussão – os danos que
causa. Todos sabem dos vários danos que a maconha produz no organismo,
sobretudo dos nossos adolescentes”, argumentou.
A Comissão de Direitos Humanos ainda tem
programadas mais três audiências públicas sobre a regulamentação do uso da
maconha. A próxima será no dia 8 de setembro e, segundo Cristovam Buarque, já
deve ser direcionada ao uso medicinal da substância.
AGÊNCIA BRASIL.
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