domingo, 31 de janeiro de 2010

Intimidade violada


Há uma febre no mundo por programas que devassam a intimidade dos participantes. O público adora, e adorando a febre aumenta. Como dizem na política, deve valer também na cultura: "cada povo tem o programa que merece".

Contra o governo, somos todos. Não vou gastar estas linhas com ele. Tampouco, desejo atacar a egolatria dos confinados, não leem, não falam de cultura, ignoram os problemas do país, brigam por comida... Asfixiados por seu cordão umbilical, se parecem ao cachorrinho da minha sogra que se divertia no pátio tentando morder o próprio rabo.

Prefiro falar de nós - embora muitos não se achem - partes do povo. Obcecados em devassar a intimidade dos outros, com unhas e dentes defendemos a nossa. Todos defecamos, urinamos, temos gases intestinais e estomacais, unha encravada de vez em quando. E a alma? Eis lá dentro algum segredo, um desejo não revelado, uma confidência reservada, um medo só pela mãe conhecido.

É no espaço da intimidade onde se constroem os laços afetivos. Graças a ele as estruturas públicas não desmoronam. Condena-se, por exemplo, o assédio sexual no trabalho. O chefe, ou a chefe, podem ter desejos sexuais. Ninguém é insensato o suficiente para crer que, ao assumir um cargo, um homem em idade reprodutiva, ou uma mulher em idade fértil, professe também a castidade. No entanto, o espaço público é regrado para que não aconteçam desequilíbrios comprometedores da estabilidade social. Da mesma forma, não fica bem a um juiz arrotar na sala de audiência, ou a um professor urinar no canto da sala, mesmo sabendo-se que em algum lugar devam fazê-lo.

Os programas mostram a casa, lugar da intimidade por excelência. Mas a casa de portas escancaradas e a invasão consentida. Já se sabe, os programas que reproduzem algum espaço público, como o do trabalho ou o das ruas têm pouca audiência.

Devemos à privacidade, à intimidade, aos segredos, os elos mais fortes das relações afetivas. Apenas ao amado, ou à amada, mostro a nudez absoluta do corpo e da alma. Ou à mãe, ao pai, à amiga, ao amigo, sempre pessoas muito especiais. É horrível quando esquecemos o banheiro destrancado e alguém adentra. A intimidade está sempre embalada para presente. Abrir o pacote é um momento mágico para quem doa e quem recebe.

Para quem deixaremos nossa intimidade? Onde guardaremos os segredos mais especiais? Se a casa não é mais segura, para onde nos recolheremos depois de tantos papéis públicos?

É certo, os reality shows mostram a realidade. Esta é a realidade: um rato imenso rói a fronteira da intimidade. Enquanto as figuras de lá ganham muito dinheiro para serem violadas, nós aqui perdemos as poucas moedas que possibilitariam construir com dignidade as redes afetivas que, simbolicamente, rodeiam e protegem nossa casa. Cada um precisa ter ao menos um pouquinho de segredo. Quando aparecer alguém muito especial teremos algo que ninguém viu para mostrar.

Pablo Morenno
O que achou do texto? Aproveite e deixe sua opinião.





Como se fosse a primeira vez



Como se fosse a primeira vez
Chove desde que o mundo é mundo, mas a chuva sempre nos pega desprevenidos. Não falo na chuva catastrófica como a que tem nos flagelado, mas na chuva comum. Na chuva que deveria fazer parte das expectativas normais de qualquer um que não vive num deserto. Que não deveria exigir qualquer alteração no seu cotidiano fora a necessidade de usar guarda-chuvas e o cuidado de evitar goteiras e poças. E, no entanto, todas as vezes que chove nossas vidas são transtornadas como se fosse a primeira vez. Meu Deus, o que é isso? Água caindo do céu?! Com chuva todo o mundo se confunde, como se não houvesse precedentes. Com chuva o caos do trânsito vira um pavor, embora só seja o caos de sempre com água em cima.

O descaso que causa as tragédias quando a chuva é catastrófica é um corolário dessa surpresa sempre repetida. A imprevidência dos que constroem em áreas de risco ou a negligência dos que permitem a construção em áreas de risco vem da mesma recusa de ver o óbvio. A chuva é uma obviedade, não é uma novidade. A chuva anômala, catastrófica, também, pois temos uma longa história de tragédias como as destes dias. Mas a reação é sempre de incredulidade, nunca se reconhece o óbvio.

O problema do Brasil não é que as coisas não tenham precedentes. Há precedentes para tudo que nos aflige. O problema é que os precedentes não nos ensinam nada. Assim continuaremos reclamando que os esgotos pluviais não dão conta das grandes chuvaradas e precisam ser refeitos, até a inundação regredir e não se falar mais nisso. Continuaremos protestando contra construções em áreas perigosas até os deslizamentos pararem e o tempo melhorar, e esquecermos. E cada tragédia, como cada dia de chuva, será sempre como se fosse a primeira vez.



REPARAÇÃO

Alguém com tempo e curiosidade suficientes poderia calcular de quanto seria o montante se cada família de vítimas da imprevidência e da negligência dos governos – do esgoto não refeito, da encosta não adequadamente escorada, da estrada não duplicada ou não construída – responsabilizasse judicialmente Estados e União e exigisse reparação. Não precisaria nem ser as vítimas de todos os tempos, só de um ano bastaria. O custo seria maior do que o necessário para fazer as obras.

Luis Fernando Verissimo.

sábado, 30 de janeiro de 2010

A mudança é uma dança muda e quem não muda, dança



Não se deixe dominar pela monomania de raciocínio, de pensar sempre do mesmo jeito, pelo fato de que é sempre mais fácil desistir de mudar do que decidir mudar. A mudança é uma dança muda e quem não muda, dança...

Escute o novo, escute o vento, escute o agora, escute o desejo, escute seus olhos, sempre ávidos por novas leituras e novas descobertas, mas não escute o óbvio, esconderijo dos comuns, dos normais, refúgio dos castrados. Escute o seu coração que mora sempre na conjunção adversativa da sensibilidade.

Escute a vida que sempre te con-VIDA à surpresa e lembre-se que “é melhor o incerto fértil do que a certeza estéril”, fazendo ponte, sempre, com a ideia pra lá de bela de “quem busca segurança, conta as migalhas e quem busca esperança, espalha sementes”.

Semeie ternura no canteiro da alma, rega de gentileza os seus gestos mais profundos e faça nascer os lírios nos olhos dos outros, para que a vida dê flores e frutos. Seja solidário e invista o seu melhor no pior do outro para que ele se sinta fascinado pela possibilidade de se fazer esperança, de se ornar e se tornar verde.

Não se deixe embriagar com o transitório, mas cultive o que é definitivo. Não se mire no outros mas admire o que se faz único: você mesmo, a única experiência, de fato, irrepetível.

Se perdeu, ame o que sobrou. Se partiu, celebre os pedaços. “Se caiu, aprenda a levitar”. Se tem uma pedra no meio do caminho, lembre-se de que o que importa não é o caminho, mas o jeito de caminhar. Dê uma chance a você mesmo e não se esqueça que se os olhos forem bons, haverá festa em todos.

Cíntia Fidelis de Castro .

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Deus e o Diabo no Haiti - Luis Fernando Verissimo


O evangélico Pat Robertson, um dos líderes da direita religiosa americana, tem uma explicação para as desgraças do Haiti que culminaram com esse terremoto demolidor. Um dos países mais miseráveis do mundo, com uma história ininterrupta de privações, violência e instabilidade política, o Haiti estaria pagando por um pacto que fez com o Diabo em 1804, quando pediu sua ajuda para expulsar os colonizadores franceses e tornar-se uma república. Desde então, os haitianos viveriam sob uma maldição. O terremoto, segundo Pat Robertson, é apenas o castigo mais recente. Mas o religioso pediu a seus fiéis que rezassem pelos haitianos. E, presumivelmente, pedissem a Deus que esquecesse velhos ressentimentos e lhes desse uma folga.

Se o Diabo ajudou mesmo os haitianos contra os franceses foi por uma causa nobre. O Haiti foi o primeiro país do mundo a abolir a escravidão, dando um exemplo que custou a ser seguido pelos outros. A república, também inédita, fundada depois da expulsão dos franceses, era de ex-escravos, e acolhia escravos fugidos ou alforriados de outros países. E se Deus os castigou por esta audácia, não foi o único. A França exigiu e recebeu reparação pela colônia perdida, o que aleijou a economia da nova república por muito tempo. A vizinhança com os Estados Unidos também não ajudou. Os americanos chegaram a ocupar o Haiti durante 20 anos, sem muito proveito para o país. Grandes negócios foram feitos na época dos ditadores Papa Doc e Baby Doc Duvalier, também sem muito proveito para o país. Nos últimos tempos, apoiando e desapoiando líderes mais ou menos populares, os americanos têm tentado manter no Haiti uma democracia representativa, mas não representativa demais, a ponto de armar politicamente uma massa de desesperançados, com o risco de eles também convocarem o Diabo. Agora não se sabe o que vai surgir dos escombros da tragédia.



OUTRO

O Deus vingativo de Pat Robertson certamente não era o Deus de Zilda Arns, que morreu no Haiti trabalhando pela causa da sua vida, a ajuda aos pobres e, principalmente, às crianças. O seu era um Deus solidário. Infelizmente, pouca gente no mundo está disposta a fazer um pacto como o que Zilda Arns fez com este outro Deus. Ela sobreviverá como um exemplo e uma inspiração.

Luis Fernando Verissimo



O verdadeiro George Clooney



Longe de mim querer difamar alguém, mas acho que no caso do George Clooney o que está em jogo é a autoestima da nossa espécie, os homens que não são George Clooney. Todas as nossas qualidades e todos os nossos atributos, físicos e intelectuais, desaparecem na comparação com o George Clooney. As mulheres não escondem sua adoração pelo George Clooney. O próprio George Clooney nada faz para diminuir a idolatria e nos dar uma chance. Fica cada vez mais adorável, cada vez mais George Clooney. E se aproxima da perfeição. É bonito. É charmoso. É rico. É bom ator. Faz bons filmes. Está envolvido com as melhores causas. E que dentes! Não temos defesa contra esse massacre. Só nos resta a calúnia.

Os dentes são falsos. Ali onde elas veem pomos da face irresistíveis e um queixo decidido, há, obviamente, botox. Ele tem pernas finas e desvio no septo. É solteiro, portanto, claro, gay. Tem casa num dos lagos italianos, o que já é suspeito, e dizem que anda pelos seus chãos de mármore depois do banho de espuma vestindo um longo caftan bordado e sendo borrifado com perfumes florais pelo seu amante filipino Tongo, enquanto seu amante italiano, Rocco, prepara a salada de rúcula completamente nu. George Clooney bate na mãe todas as quintas-feiras. É extremamente burro. Só leu um livro até hoje e não lembra se foi “O pequeno príncipe” ou “O grande Gatsby”. Nos filmes em que faz personagens mais reflexivos, contratam um dublê para as cenas dele pensando. Foi ele que propôs a demolição da Torre Eiffel porque já era mais que evidente que não encontrariam petróleo no local. E sua sovinice é lendária. Levou nadadeiras quando visitou Veneza, para não gastar com táxi.

É notório, em Hollywood, o mau hálito do George Clooney. Quando ele fala em algum evento público, as primeiras três fileiras do auditório sempre ficam vazias. Atrizes obrigadas a trabalhar com ele têm direito a um adicional por insalubridade, em dobro se houver cenas de beijo. Outra coisa: a asa. Não adiantam as imersões em espuma na sua banheira em forma de cisne, nem os perfumes florais borrifados, o cheiro persiste. Sabem que George Clooney e suas axilas se aproximam a metros de distância, e muita gente aproveita o aviso para fugir.

Além de tudo, tem seborreia e é Republicano.

Passe adiante.

Luis Fernando Verissimo.
Será mesmo tudo isso???ciúmes do autor? Que ironia não?

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Mais pesados que a vida



Não é a primeira vez em jornais. Tem se tornado uma notícia sem importância o assassinato de jovens e adolescentes por causa de um tênis ou camiseta de marca. Já está parecendo falcatrua de políticos. Resolvi escrever esta crônica porque já ando sem vontade de ler essas notícias corriqueiras. Não quero que aconteça com você. Matarem meninos e meninas por causa de objetos da onda não pode ter o mesmo destino das notícias de corrupção. A gente dá de ombros e vai ver futebol ou aparar as unhas.
Ando confeccionando perguntas sem medo. Colho respostas desconcertantes. Não gostaria que dessem de ombro e fossem ver futebol ou aparar as unhas depois da morte de meu filho. Eu ficaria indignado, entende? Então, escrevo como um pai de amanhã. Desse modo, eu escrevendo e você lendo, poderemos pensar no assunto. Podemos evitar a morte dos filhos dos outros enquanto não chegarem os nossos.
Tome uma folha de papel e vá anotando razões para alguém matar por um tênis e uma camiseta. Nenhuma ideia? Mas, se as coisas acontecem, razões haverá. Pensemos no seguinte: o assassino toma uma balança, dessas nas mãos da justiça, põe o tênis ou a camiseta num prato e a vida de nosso filho no outro. O que pesou mais?
Puxa o gatilho. Friamente. Assim, depois de somar e diminuir. Isso acontece em instantes muito pequenos, menores que esse parágrafo.
Absurdo! Se a balança está correta, tornou-se a vida sem peso ou fazemos camisetas e tênis muito pesados?
A vida desvalorizou-se. Todos dizem o mesmo. A vida desvalorizou-se, pesa pouco. Desse modo se explica porque, quando na balança assassina, a vida de um filho não alcança dois quilos de material sintético.
Proponho novas explicações. Não há possibilidade alguma de alterarmos a massa da vida. Ela não está sob nosso domínio; as coisas, sim. São os tênis e camisetas que andam com seu peso inflacionado. Parece-me resposta mais convincente. Vendem-se na publicidade, e todo mundo acredita, que jovens vidas só tem valor ou sentido em "coisas iradas". Aí, fazemos de tudo para dá-las a nossos filhos para que eles não se sintam assim tão desprezíveis. Mas há meninos que não têm pais tão bons ou, sendo bons, pais sem dinheiro para comprar tais objetos com mágicos poderes. Esses meninos assassinos não matam por coisas. Matam por sua vida. Procuram a vida nas coisas de nossos filhos porque nossos filhos, antes e ingenuamente, nessas mesmas coisas puseram a sua.
É terrível resignarmo-nos à morte de nossos filhos por objetos de consumo. Não seria menos doloroso convencermos nossos herdeiros que a vida vale muito, mesmo sem nenhum acessório?
Só perde a vida por um tênis ou uma camiseta de marca quem, mesmo sem se dar conta, pôs neles mais vida do que na vida mesma. Ultimamente faço perguntas sem medo. Quem pergunta sem medo não se assusta nunca. Nem com respostas desconcertantes.
Que ninguém pague um preço tão alto por coisa tão pouca.

Pablo Morenno.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

O MELHOR DOS MUNDOS



Muito já foi dito sobre a superprodução cinematográfica Avatar. Há quem comente apenas o fantástico senso de oportunidade de James Cameron, abordando o tema ecológico bem no momento em que o assunto esquenta de vez no planeta (com o perdão do trocadilho). Outros destacam a revolução tecnológica desta obra em 3D, promessa de ser divisor de águas para o cinema. Como a história não é nem de longe a primeira a ser ecologicamente correta, além de nascer fadada a ter seus avanços técnicos suplantados em poucos meses, decidi me concentrar naquilo que deu o nome ao filme: os tais avatares.

A palavra avatar vem do sânscrito (avatara) e significa, originalmente, encarnação. Ou, para ser mais específico, o espírito que ocupa um corpo carnal. Por um deslocamento muito curioso, o termo foi adotado na internet para dar o nome à representação pictórica de alguém no ambiente virtual. Isto é, uma desencarnação! Bom, se no induísmo o avatar é deus que vira gente, quando invertemos o sentido, é muito justo que o homem almeje nada além da divindade. Na virtualidade, tímidos ficam extrovertidos, sacanas se transformam em anjos, avaros esbanjam e pobres enriquecem. Ao nosso pequeno deus virtual, tudo é possível.

No caso do filme, os avatares são clones da espécie Na’vi, nome dos nativos da Lua Pandora, criados pelos humanos para encarnarem e, a exemplo da web, despirem-se dos pecados humanos. Afinal, os seres azuis são de uma pureza de dar inveja aos índios românticos! Vivem em perfeita harmonia com o exuberante meio ambiente e não matam uma pulga sem uma finalidade nobre ‒ e, mesmo assim, ainda oram pelo animal falecido. Organizam-se de modo a respeitar hierarquias políticas e religiosas (com um viés monárquico) e curam seus males usando a força da natureza. Também já superaram as picuinhas internas entre as diversas tribos. Lucro, essa coisa tão Hollywoodiana, os Na’vi parecem desconhecer.

Ainda que fosse apenas a redenção de todos os males do espírito, o que não é pouco, quando um ser humano encarna seu avatar no filme de Cameron, torna-se também um coquetel de nossas melhores virtudes físicas. Porque os Na’vi são todos esbeltos como uma top model, altos como um jogador de basquete, ágeis como nossos melhores ginastas, rápidos como um corredor de 100m e resistentes como um maratonista. Também são hábeis como um jóquei, fortes como um alpinista, precisos como um soldado... São, enfim, tudo de bom. Nem precisa ser paraplégico para desejar a troca de corpo e viver no avatar de uma vez por todas!

E é justamente aí que o Na’vi torce o rabo: a mensagem final, de um outro mundo possível, só se concretiza com a expulsão dos homens do paraíso, digo, de Pandora, e o herói, desencarnado, abdicando definitivamente de sua humanidade. Em outras palavras, nós (humanos) perdemos o minério, a guerra, o direito de habitar essa formosa lua e o líder que, por seu exemplo, poderia ser o agente de mudança de nossa consciência. O único que ganhou o direito de viver como um deus foi aquele homem que deus se tornou: belo, puro, sábio, ágil e, também, morto.

Está tudo muito bem na bilheteria, está tudo muito bom nos efeitos especiais... Mas, em se tratando de um libelo ecológico, bem que merecíamos um desfecho um pouco menos maniqueísta. Daqui a pouco vai parecer que vale mais a pena nos mudarmos para avatares virtuais, todos tão lindos e bacanas, e onde não há risco de frustrações ou efeito estufa. Ou morrer de uma vez, pois, no céu de São James, vamos casar com a filha do cacique.
Rubem Penz.
Muito bem comentado esse filme. O maior sucesso de bilheteria de todos os tempos. Se desejar comentar, fique a vontade.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

MILITARES, NUNCA MAIS! por Millôr Fernandez.



por Millôr Fernandes.

Ainda bem que hoje tudo é diferente: temos um PT sério, honesto
e
progressista. Cresce o grupo que não quer ver mais MILITARES NO
PODER,
Pelas razões abaixo:

Militar no poder, nunca mais. Só fizeram lambanças! O tiraram
Cenário
bucólico que havia na Via Dutra de uma só pista, que foi duplicada
e
Melhoramentos recebeu, aí acabaram com as emoções das curvas mal
construidas
e os solavancos estimulantes provocados pelos buracos na
Pista. Não
Satisfeitos, fizeram o mesmo com uma rodovia Rio-Juiz de
Fora. Com uma construção
da Ponte Rio-Niterói, acabaram com o sonho de
crescimento da pequena Magé,
Cidade nos fundos da Baía de Guanabara,
que era caminho obrigatório dos que
iam de um lado ao outro e não
queriam sofrer na espera da Barcaça que Levava
Meia dúzia de carros.

Criaram esse maldito do Pro-Álcool, com o medo infundado de que
o
petróleo iria acabar um dia. Para apressar o fim do chamado logo
"Ouro
negro ", deram um impulso gigantesco à Petrobrás, que passou uma
Extrair
Petróleo mais 10 vezes (de 75 mil barris diários, passou um
Produzir
750 mil), sem contar o fedor de bêbado que os carros passaram um
ter
Com o uso do álcool.

Enfiaram o Brasil numa disputa estressante, levando-o da POSIÇÃO DE
45. ª
economia do mundo para um POSIÇÃO de 8. ª, trazendo com isso uma
nociva onda de
Mundial inveja.

Tiraram o sossego da vida ociosa de 13 milhões de brasileiros, que,
COM
uma gigantesca oferta de emprego sem, ficaram uma desculpa fazer
"Estou
desempregado ".

Em 1971, no governo militar, o Brasil alcançou um POSIÇÃO DE
Segundo
Maior construtor de navios mundo não. Uma desgraça completa.

Com gigantesca oferta de empregos, baixaram consideravelmente os
Índices
de roubos e assaltos. Sem aquela emoção de estar na iminência
de um sofrer
assalto, os nossos passeios perderem completamente a
graça.

Alteraram profundamente com uma topografia do Território Brasileiro
a
construção de gigantescas hidrelétricas (Tucuruí, Ilha Solteira, Jupiá
e
ITAIPU), o que obrigou a uma essas nossas crianças aprenderem sobre
bobagens
de nomes esquisitos. O Brasil, que antes vivia o romantismo
Jantar à luz do
de velas ou de Lamparinas, tolerar que teve um
Instalação de Milhares de
torres de alta tensão espalhadas pelo
Territorio Energia, Nacional levando
Elétrica quem nunca precisou um
disso. Implementaram os metrôs de São Paulo,
Rio de Janeiro, Belo Horizonte e
Recife, deixando tudo pronto para atazanar a vida dos
Cidadãos e o
trânsito nestas cidades.

Baniram do Brasil, pessoas bem intencionadas, que queriam implantar
aquí
um regime político que fazia a felicidade dos russos, cubanos e
Chineses, em
Países cujos As pessoas se reuniam nas ruas em fila
Apenas para bater-papo, e
Ninguém pensava em sair para um passeio
Nenhum outro país. Foram
demasiadamente rigorosos com os simpatizantes
daqueles regimes, porque só
Soltaram uma "bombinha de São João" não
Aeroporto de Guararapes, onde alguns
Inocentes morreram de susto
apenas.

Os militares são muito Estressados. Fazem tempestade em copo d'água

Por Causa de alguns assaltos a bancos, sequestros de
diplomatas ...
ninharias que resolver qualquer delegado de polícia.

Tiraram-nos o interesse pela Política, vez que os deputados e
senadores
daquela época não nos brindavam com esses deliciosos
escândalos que fazem uma
Alegria da gente hoje.

Inventaram um tal de Projeto Rondon, para os nossos que
Universitários
conhecessem os problemas dos brasileiros desassistidos nos
grotões da
Amazônia, Centro-Oeste e Nordeste; o FGTS, PIS e PASEP, só para
Criar
Atritos entre patrões e empregados. Para piorar a coisa, ainda
Criaram
O MOBRAL, que ensinou milhões a escrever e ler, aumentando mais
Ainda
O Poder desses empregados contra os seus patrões.

Nem o homem escapou do campo, porque Criaram para ele o
FUNRURAL,
tirando do pobre coitado uma doce preocupação com o que ele tinha
Seu
futuro. Era tão bom imaginar-se velhinho, pedindo esmolas
para
Sobreviver.

Outras desgraças Criadas pelos militares:

Trouxeram uma TV em cores para as nossas casas, pelas mãos e burrice de
um
Oficial do Exército, formado pelo Instituto Militar de Engenharia,
que
inventou o sistema PAL-M. Criaram um EMBRATEL, TELEBRÁS; Angra I e
II; INPS,
IAPAS, DATAPREV, LBA, FUNABEM.

Tudo isso e muito mais os militares fizeram em 22 anos de
governo.
Depois que entregaram o governo aos civis, estes, nos vinte
anos
seguinte, não fizeram nem 10% dos estragos que os militares
fizeram.

Tem muito mais coisas horrorosas que as enguias, os militares, Criaram, mas
o
que está escrito acima é o bastante para dizermos: "Militar não
Poder, nunca
mais "! os domesticados Salvo!...

? A justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada
e
manifesta? (Rui Barbosa em "Oração aos Moços").

? O cinema ea literatura inventaram o herói sem causa. O
parlamento
Brasileiro consagrou o Jaça sem canalha?. (Millôr
Fernandes).

Diretos civis e humanos?



O terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos (3º PNDH) é uma clara evolução na preocupação da sociedade brasileira e do governo Lula com os direitos humanos para o povo e cada ser humano. Mas, ao ampliar muito o leque de assuntos tratados, o programa misturou valores éticos, dos direitos humanos, com opções políticas, dos direitos civis.

Primeiro: o texto aborda o direito de conhecer a verdade sobre a história do País e ao tratamento a ser dado aos torturadores que foram anistiados. O direito à verdade é um direito humano. O Brasil precisa saber tudo o que aconteceu: o genocídio de índios, as brutalidades da escravidão, a guerra do Paraguai, os malditos “Anos de Chumbo” e a corrupção nesses tempos de democracia. O mesmo não se pode dizer da revogação da Lei de Anistia. A lei foi um ato político aceito no momento em que foi concedida. Como tal, pode até ser revista, mas sem necessidade de cobertura dos direitos humanos. Sua revisão será uma questão política.

Segundo: o tema que diz respeito ao direito ao aborto. O direito à vida de mulheres ameaçadas por gravidez de risco ou o direito de evitar um filho indesejado por ser fruto de estupro deve ser um direito humano. Mas a generalização do direito ao aborto não tem sido vista como uma questão de direito humano exclusivo da mãe e que implica o direto da criança e do pai também.

Terceiro: é inacreditável que ainda haja resistência a que pessoas do mesmo sexo possam fazer uniões civis para constituírem vida em comum. Mas o direito humano está no direito de se viver com quem quiser, a legalização é um direito civil para os que quiserem, se o direito civil permitir. Por isso, temos que mudar a lei, sem necessidade de apelar para um direito humano.

Quarto: é possível que algumas pessoas considerem que a propriedade privada fere os direitos humanos, mas esse não é um sentimento hegemônico. Nessas condições, as ocupações de terra são um assunto de direito civil, legalidade, não de direitos humanos. O direito à terra pode ser um direito humano, mas se respeitado, o direito civil à propriedade privada – até ela, quem sabe, ser extinta um dia.

Quinto: a liberdade e a honra são direitos fundamentais de todo ser humano. Por isso, é preciso dar responsabilidade à imprensa, mas a garantia dessa responsabilidade é uma questão legal. Querer tutelar a liberdade por meio de comissões especiais vai ferir os direitos à liberdade.

Isso leva a outra constatação: os temas ausentes do 3º PNDH. Nele não se considerou o direito humano a uma justiça imparcial, o que exige uma modificação completa no funcionamento do privatizado sistema judiciário brasileiro. O documento tampouco trata com ênfase do direito igual à vida, que só poderia acontecer com um sistema de saúde igual para todos, o que forçaria a publicização do sistema de saúde. Esse direito, no Brasil, não vem sendo tratado como direito humano, porque é um direito comprado pelos que podem pagar boa assistência médica.

Sobretudo, falta ênfase sobre o mais fundamental dos direitos humanos, aquele que abre as portas a todos os demais: o direito à educação de qualidade para todos. Constam apenas referências inócuas. Nada afirma a necessidade de erradicar o analfabetismo – 14 milhões de adultos são incapazes de ler e, por isso, não conseguem usar seus direitos fundamentais. Milhões aprenderam as letras, mas não entendem o que leem.

O documento apresentado pelo governo é cheio de boas intenções, mas peca pelo excesso de temas e pela ausência de compromissos.

Cristovam Buarque.
Deseja comentar? Use o blog ou direto no diHitt.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

TEMPO PARA NAMORAR



Anos 50 – Ao som de Elvis Presley, José pede Maria em namoro. A moça, antes de pensar em aceitar, precisa falar com a mãe. A mãe, antes de permitir, consulta o marido. O marido, antes de mais nada, pede para conhecer o tal rapaz. José se apresenta ao pai de Maria. Sofre um interrogatório severo: se estuda ou trabalha, filho de quem é, quais são as suas intenções. Sabe das regras para freqüentar a casa – um lar de família. Para saírem juntos, apenas na companhia da tia Dulce, e olhe lá.

Anos 60 – Ao som dos Beatles, José pede Maria em namoro. A moça aceita e passam a se encontrar às escondidas, atrás da Igreja. Também a namorar nos recantos discretos dos salões de baile. Até que o fato, em forma de fofoca, chega aos ouvidos dos pais dela. Maria fica um mês de castigo, em casa. Durante este tempo, troca bilhetes de amor eterno com José e convence a mãe de quanto o ama. Quebrada a resistência, a mãe passa a argumentar com o marido, que enfim aceita receber José para um almoço. José pede Maria em namoro outra vez, agora oficialmente. Recebem a permissão. Mas andam sob o olhar vigilante de Mário, irmão de Maria.

Anos 70 – Ao som dos Jackson Five, José pede Maria em namoro. A moça aceita e José passa a buscá-la na escola, a combinar sessões de cinema e tardes no parque. Freqüentam reuniões dançantes e festas de clubes, trocando carícias nos recantos mais escuros dos salões. Quando já estão firmes, e com os rumores já ecoando nos ouvidos da família, resolvem assumir o compromisso, dando a notícia em casa. O pai dela consente, desde que não atrapalhe nos estudos: baixando as notas, o castigo será ficar em casa. E estipula meia-noite como horário limite para a menina estar em sua casa (ou José fora dela).

Anos 80 – Ao som do Pink Floyd, José e Maria começam a namorar. Uns dias depois, ela avisa em casa que vai para uma praia de Santa Catarina no feriadão com a turma. O pai pergunta quem mais vai. Ela cita as amigas de sempre e "mais um pessoal". José faz parte do pessoal, é claro.Todos se encontram na Estação Rodoviária. Logo depois, em um camping de Bombinhas, Maria e José dividem a barraca Brisa II. Na volta, José passa a freqüentar a casa de Maria e chamar o pai da moça de Sogrão . Terão alguns meses pela frente para que os pais se acostumem com a idéia de eles passarem o próximo verão acampando juntos. O que de fato acontece.

Anos 90 – Ao som do U2, José e Maria mudam da categoria "ficante fixo" para namorados. Nessas alturas, José já está cansado de freqüentar a casa da família. A diferença é que ele passa a, eventualmente, dormir lá também, para o desespero do pai. A mãe diz ao marido que eles não estão fazendo nada diferente do que os dois já fizeram. O pai diz ser essa a razão do desespero. Mas, fazer o quê? Na rua anda tudo tão perigoso... Ao menos conhecem o rapaz e Maria gosta tanto dele. José e Maria atam e desatam o namoro dezessete vezes.

Ano 2000 – Ao som dos Beatles, José pede Maria em namoro. Ela, antes de pensar em aceitar, precisa falar com os filhos...


TEMPO PARA NAMORAR – Trilha Nacional

1950 – Ao som de Elizeth Cardoso, José pede Maria em namoro. A moça, antes de pensar em aceitar, precisa falar com a mãe. A mãe, antes de permitir, consulta o marido. O marido, antes de mais nada, pede para conhecer o tal rapaz. José se apresenta ao pai de Maria. Sofre um interrogatório severo: se estuda ou trabalha, filho de quem é, quais são as suas intenções. Sabe das regras para freqüentar a casa – um lar de família. Para saírem juntos, apenas na companhia da tia Dulce, e olhe lá.

1960 – Ao som de Roberto Carlos, José pede Maria em namoro. A moça aceita e passam a se encontrar às escondidas, atrás da Igreja. Também a namorar nos recantos discretos dos salões de baile. Até que o fato, em forma de fofoca, chega aos ouvidos dos pais dela. Maria fica um mês de castigo, em casa. Durante este tempo, troca bilhetes de amor eterno com José e convence a mãe de quanto o ama. Quebrada a resistência, a mãe passa a argumentar com o marido, que enfim aceita receber José para um almoço. José pede Maria em namoro outra vez, agora oficialmente. Recebem a permissão. Mas andam sob o olhar vigilante de Mário, irmão de Maria.

1970 – Ao som de Rita Lee, José pede Maria em namoro. A moça aceita e José passa a buscá-la na escola, a combinar sessões de cinema e tardes no parque. Freqüentam reuniões dançantes e festas de clubes, trocando carícias nos recantos mais escuros dos salões. Quando já estão firmes, e com os rumores já ecoando nos ouvidos da família, resolvem assumir o compromisso, dando a notícia em casa. O pai dela consente, desde que não atrapalhe nos estudos: baixando as notas, o castigo será ficar em casa. E estipula meia-noite como horário limite para a menina estar em sua casa (ou José fora dela).

1980 – Ao som de Djavan, José e Maria começam a namorar. Uns dias depois, ela avisa em casa que vai para uma praia de Santa Catarina no feriadão com a turma. O pai pergunta quem mais vai. Ela cita as amigas de sempre e "mais um pessoal". José faz parte do pessoal, é claro.Todos se encontram na Estação Rodoviária. Logo depois, em um camping de Bombinhas, Maria e José dividem a barraca Brisa II. Na volta, José passa a freqüentar a casa de Maria e chamar o pai da moça de Sogrão . Terão alguns meses pela frente para que os pais se acostumem com a idéia de eles passarem o próximo verão acampando juntos. O que de fato acontece.

1990 – Ao som de Marisa Monte, José e Maria mudam da categoria "ficante fixo" para namorados. Nessas alturas, José já está cansado de freqüentar a casa da família. A diferença é que ele passa a, eventualmente, dormir lá também, para o desespero do pai. A mãe diz ao marido que eles não estão fazendo nada diferente do que os dois já fizeram. O pai diz ser essa a razão do desespero. Mas, fazer o quê? Na rua anda tudo tão perigoso... Ao menos conhecem o rapaz e Maria gosta tanto dele. José e Maria atam e desatam o namoro dezessete vezes.

2000 – Ao som do Caetano Veloso, José pede Maria em namoro. Ela, antes de pensar em aceitar, precisa falar com os filhos...

Rubem Penz.
O que acha disso tudo??? Será bem assim mesmo??? Comente, participe!!!

domingo, 24 de janeiro de 2010

Pobreza e educação



Há séculos economistas tentam descobrir as causas do crescimento econômico para poderem eliminar a pobreza. Mas o governo brasileiro acha que encontrou a fórmula que uma profissão inteira vem procurando e ainda não achou.

Adam Smith sugeriu que o mercado livre e a especialização do trabalho seriam as causas fundamentais da riqueza das nações; Joseph Schumpeter priorizou a inovação tecnológica e a constante renovação dos métodos de produção como fontes do crescimento econômico moderno; Robert Solow tentou medir o impacto da poupança e do investimento na expansão econômica, mas não foi capaz de explicar um grande resíduo em suas estimativas que chamou de progresso tecnológico; Kenneth Arrow introduziu o conhecimento e a pesquisa nas equações do crescimento econômico; e John Galbraith sugeriu variáveis socioculturais como a base da armadilha da pobreza no mundo, entre muitos outros notáveis esforços de outros economistas.

Contudo nunca se conseguiu produzir uma teoria geral do crescimento, mas apenas identificar alguns fatores determinantes no sucesso dessa corrida rumo à riqueza.

Recentemente, Douglas North propôs que valores e instituições são determinantes no crescimento econômico. A crença de que boas instituições geram crescimento econômico é hoje aceita por todos.

De fato, há correlação entre instituições eficientes, garantia de contratos e estabilidade de direitos com crescimento econômico. Mas essa relação não indica quais caminhos adotar e se deseja estimular a expansão econômica.

No Brasil, o caminho escolhido para a superação da pobreza tem sido o do redistributivismo. Esse é o rumo mais ilusório e ineficaz de todos.

A demagogia do “vale-isto” e “vale-aquilo”, das bolsas “A” e bolsas “B”, da distribuição de subsídios e isenções, da exacerbação da progressividade tributária e dos confiscos de terra e de riqueza para serem pulverizados entre os pobres jamais eliminará a miséria. A dificuldade para romper o círculo vicioso da pobreza está no enraizamento do subdesenvolvimento nas estruturas sociais, econômicas, políticas e psicológicas da sociedade. E isso não se altera com políticas assistenciais, que, ainda que justificáveis, não serão capazes de sanar o problema a longo prazo.

A ruptura fundamental com esse dramático equilíbrio de pobreza acha-se na educação. È a qualidade do capital humano que gera crescimento e, subsidiariamente, também gera boas instituições.

Grande parte dos homens públicos brasileiros não aprendeu com o sucesso do Japão e da Coreia do Sul, que investiram pesadamente em educação fundamental. O Brasil ignora esse clamor e confunde caridade, que é uma virtude pessoal, com políticas eficazes de geração de renda, virtude pública rara entre nossos governantes.

Não se acaba com a pobreza punindo a riqueza. Com demagogia e pitadas de caridade corre-se o risco de aprofundá-la.
Por: Marcos Cintra.

Se desejar comentar, faça aqui ou use o diHitt.

Reféns do medo



O economista da Universidade de Chicago, Gary Becker, afirma em sua obra Crime e castigo: uma abordagem econômica de que a ação do criminoso é precedida de uma avaliação de risco na relação custo/benefício. Para Becker, o criminoso age quando conclui que o benefício de sua ação será maior que o risco que terá que correr. O criminoso poderá sair ileso ou, se for preso, o preço pago à sociedade não será tão alto.

Com base na tese de Becker é possível entender as razões que levam o crime organizado a priorizar determinadas modalidades de delitos e deixar de lado outras cujo risco é elevado frente aos benefícios que geram.

Os assaltos a bancos, por exemplo, deixaram de ser uma das prioridades para os criminosos no Brasil porque a disseminação da moeda eletrônica esvaziou os caixas das agências. Os riscos tornaram-se elevados em relação aos benefícios que geram.

A falência da segurança pública brasileira direcionou as ações dos criminosos para ações como os sequestros e roubos, muitas vezes seguidos de morte, como alternativa capaz de maximizar a relação risco/benefício.

Para avaliar a tese de Becker frente ao problema da violência no Brasil é preciso levar em consideração um aspecto importante, que é a estagnação econômica vivida pelo País por volta de meados dos anos 1980 e que durou mais de 20 anos. Expressivo contingente da população cresceu num ambiente sem perspectivas econômicas e com crescente deterioração da educação pública nesse período. Essa população, agora adulta, encontrou no mundo do crime o meio para atender suas necessidades.

O problema da criminalidade não será solucionado no curto prazo. Há um estoque de indivíduos atuando na marginalidade que precisa ser enfrentado com a recuperação do sistema de segurança pública e a revisão rigorosa das leis penais. É preciso elevar o risco para os criminosos.

Por outro lado, o País precisa estancar um fluxo que potencializa a marginalidade. A economia precisa crescer e, concomitantemente, é necessário que se enfrente a violência cometida na distribuição da renda. Além disso, educar com qualidade no ensino público é condição fundamental para encaminhar o problema. Pouco adianta aumentar a escolaridade média da população, como ocorreu nos últimos anos, se o nível do ensino é de baixíssima qualidade. O analfabetismo funcional é uma realidade que atenta contra o desenvolvimento socioeconômico brasileiro.

Ficar debatendo se o caos na segurança é de ordem policial ou social não leva a nada. O preço desta discussão estéril é muito alto. O combate ao crime e à violência compreende ações simultâneas que elevem os riscos dos delitos para os criminosos e que criem políticas sociais que efetivamente resgatem uma enorme massa marginalizada. Caso o caminho seja outro, continuaremos por muito tempo sendo reféns do medo.
Marcos Cintra.
comente, participe, deixe sua opinião.

sábado, 23 de janeiro de 2010

A riqueza é você!



Na semana passada, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento realizou um encontro no Cairo, capital do Egito, para discutir a importância das Políticas de Transferência de Renda – iniciadas em 1995, em Brasília, com a Bolsa-Escola e transformadas em Bolsa Família em 2004 –, na redução da pobreza no mundo. O encontro contou com a participação de representares do PNUD de 56 países. Durante o encontro, a ex-primeira-ministra da Nova Zelândia, atual administradora do PNUD, Helen Clark, disse uma frase surpreendente: “A África é um continente rico”. Surpreendente mas correta, ao afirmar que a riqueza de um povo está na sua população.

Para a Sra. Clark, o desafio de abolir a pobreza está na mobilização da população para produzir os bens de que os pobres necessitam. O caminho para essa mobilização está na transferência de renda para que os pobres sejam mobilizados a produzir aquilo de que precisam, criando a partir daí o excedente que caracteriza a riqueza no sentido tradicional.

Essa lógica vem sendo chamada de “pós-keynesianismo produtivo”, cujo instrumento mais conhecido é a Bolsa-Escola: a mãe recebe para participar da produção da educação de seus filhos.

Quando a pobreza é tratada como falta de renda, o número de pessoas é visto como redutor da renda per capita, e não como indutor de produção. Com sua frase, a Sra. Clark apresentou uma nova visão. Primeiro porque, se estiver produzindo, o pobre vira riqueza; segundo, porque afirmou que pobreza não é uma questão de renda, mas sim de oferta de bens e serviços.

No keynesianismo tradicional dos países ricos, os governos transferem renda para a população desempregada apenas para criar demanda e, com isso, dinamizar a economia, sem necessidade de produzir os bens públicos que atendem a população. Diferentemente, as Transferências Condicionadas de Renda geram um produto que aumenta a oferta dos bens e serviços de que os pobres necessitam. Transformam mão-de-obra ociosa em ativa, ampliam a oferta e transformam necessidade em demanda.

A Bolsa-Escola garantia renda criando uma Rede de Proteção Social (RPS) e, ao mesmo tempo, colocava as crianças na escola, servindo de Escada de Ascensão Social (EAS). Esse também é o propósito da Bolsa-Família. O livro A Segunda Abolição, publicado pela editora Paz e Terra em 1999, que foi distribuído no Cairo em sua versão em inglês, apresenta outros programas, muitos deles implantados no Distrito Federal entre 1995 e 1998, tais como o emprego de mão-de-obra desempregada para produzir o que melhora as condições de vida da população pobre. Hoje é preciso acrescentar emprego para o plantio de árvores, enfrentando assim o problema ecológico.

Em resumo, é necessário que a transferência de renda seja condicionada ao trabalho do beneficiado, produzindo aquilo de que ele precisa. Sem isso, o recurso que ele representa continua inativo.

Além de produtivo, o novo keynesianismo é social e ecológico, e precisa ter responsabilidade fiscal. O financiamento das transferências deve ser feito com redução de gastos supérfluos do Estado, estancamento da corrupção e garantia de equilíbrio fiscal. Ao mesmo tempo, elas devem ser feitas democraticamente, o que exige a combinação dos recursos disponíveis com o tempo possível para a execução do programa. Quanto mais vontade social de fazer a transferência, menos tempo será necessário ao combate à pobreza.

O mais importante é a concepção levantada por Helen Clark de que a riqueza está nas pessoas: você é a riqueza.
Cristovam Buarque.
Gostou? Então comente aqui ou no diHitt.

Filósofo e riqueza.



Há décadas, George Soros é um dos homens mais ricos do mundo. Uma vez o ouvi dizer que trocaria sua fortuna pelo privilégio de ser considerado um grande filósofo. Ao longo de sua vida, ele oscilou entre a reflexão de filósofo e a especulação financeira, tendo mais sucesso na segunda, mas sem desistir da primeira. Esta semana tive o privilégio de participar como convidado e debatedor de suas palestras, como filósofo, na Universidade do Leste Europeu, em Budapeste, na Hungria.

Soros começou explicando seu conceito de “reflexividade”, pelo qual, ao interferir no mundo, a economia e a política são incapazes de captar a realidade do mundo como ele é. Ao desmistificar a certeza dos economistas, Soros dá uma contribuição, na filosofia do método, mas não filosofou sobre o conceito de riqueza. Mais ainda do que as limitações metodológicas, a economia precisa de mais filosofia para entender o seu objeto – a riqueza em si –, e não apenas o método de como fazê-la crescer.

Se um filósofo grego clássico caminhasse pelas ruas de Nova York, não veria ali qualquer sintoma de riqueza. Para ele, a riqueza estava associada à disponibilidade de tempo livre e o seu uso para o exercício da cultura. Se um cidadão da Idade Média fizesse o mesmo percurso em Nova York, ele também não veria riqueza, salvo na primeira igreja em que entrasse, mesmo assim a acharia pobre.

O atual conceito de riqueza é pobre. Não resiste a uma análise filosófica, que tente entender o seu significado: o que é a riqueza em si. É certo que o grego e o medieval ficariam fascinados pelo avanço da medicina, sem dúvida alguma um conceito íntimo de riqueza, mas não com os automóveis que roubam o mais precioso de todos os recursos: o tempo de vida de uma pessoa.

Mesmo ao se deslumbrar com a riqueza do avanço na esperança de vida e na redução do sofrimento, uma pessoa da antiguidade ficaria indignada com o privilégio que faz com que algumas pessoas vivam mais e com menos dores do que outras, porque dispõem de dinheiro para comprar vida e saúde. Do ponto de vista moral, a riqueza atual não resistiria a uma análise filosófica. Pena que os economistas não aceitem com tranquilidade a ideia de incerteza, e, ao não tentar entender o que é riqueza, apenas aceitam o seu conceito atual.

Se tentassem, perceberiam que o melhor indicador de riqueza ainda é o grau de educação de cada pessoa e do conjunto das pessoas em cada sociedade. Primeiro, porque a educação é geradora da riqueza material que caracteriza o imperfeito sistema econômico dos últimos 200 anos; segundo, porque é o instrumento de ascensão do patrimônio material de cada pessoa; terceiro porque é o único elemento capaz de distribuir bem a riqueza, qualquer que seja seu conceito.

Do ponto de vista filosófico, a pessoa educada é rica por ter acumulado o “bem” conhecimento e, através dele, ter acesso aos outros bens e serviços. Finalmente, o conhecimento é a principal riqueza do futuro, porque é o patrimônio que não fere a natureza, outro bem que os economistas ainda não aprenderam a valorizar, pelo pavor que têm à filosofia.

Tudo isso mostra uma grande ironia da pobreza da economia, ainda mais quando se descobre que um dos homens de mais sucesso no século 20 na construção de riqueza, usando a economia, deseja sobretudo ser filósofo. Para um economista, isso é uma contradição; para um filósofo, isso é óbvio, porque ser filósofo é ser rico, mesmo que sem dinheiro.

Cristovam Buarque.

Se desejar comentar, faça aqui ou use o diHitt
.