Estudos procuram investigar
as principais regiões cerebrais envolvidas na doença
Por meio de um software capaz
de minerar dados fornecidos pelo exame de ressonância magnética funcional, o
diagnóstico da esquizofrenia usando o mapeamento do cérebro já é possível no
âmbito científico
Novos estudos procuram investigar com maiores detalhes as
principais regiões cerebrais envolvidas e também detectar eventuais
reorganizações da estrutura cortical em função do tratamento medicamentoso.
A informação foi comunicada à Agência FAPESP por Francisco
Aparecido Rodrigues, pesquisador associado do Centro de Ciências Matemáticas
Aplicadas à Indústria (CeMEAI), um dos 17 Centros de Pesquisa, Inovação e
Difusão (CEPIDs) apoiados pela FAPESP.
Professor do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação
(ICMC) da USP, no campus de São Carlos, Rodrigues coordenou um estudo sobre o
tema, realizado mediante colaboração entre a USP e a Radboud University, de
Nijmegen, nos Países Baixos.
“Nesse estudo, que podemos definir como uma primeira abordagem
do assunto, fizemos o mapeamento global do cérebro para detectar as diferenças
entre a organização da estrutura cortical classificada como normal e aquela que
caracteriza os portadores de esquizofrenia. Agora, estamos investigando em
maior profundidade diversas regiões corticais, tal como o córtex pré-frontal,
para localizar diferenciações talvez mais expressivas.
Além disso, considerando
que o cérebro é um órgão de grande plasticidade, em constante transformação,
queremos saber também se o tratamento medicamentoso é capaz de reconfigurar
estruturas de ligação, levando, eventualmente, a uma correção anatômica
definitiva”, disse o pesquisador.
No mapeamento já realizado, as imagens foram obtidas por meio de
ressonância magnética funcional e o cérebro foi mapeado como uma rede complexa.
Cada vértice da rede representa uma área cortical.
As diversas áreas são ligadas de acordo com a ativação durante o
experimento. Essa rede foi analisada computacionalmente com o uso de
descritores estatísticos e métodos de mineração de dados. Tais análises
evidenciaram que existem diferenças sutis, mas bastante definidoras, entre os
dois tipos de estruturação cortical, ou seja, a estrutura do cérebro das
pessoas classificadas como normais e aquela dos portadores de esquizofrenia.
“De fato, o cérebro do indivíduo classificado como esquizofrênico
tende a ser menos organizado em determinadas regiões. E esse déficit de
organização estaria relacionado com os transtornos visuais, auditivos ou mesmo
olfativos que caracterizam a doença”, afirmou Rodrigues.
Segundo o pesquisador, a diferenciação das redes corticais não
poderia ter sido realizada por observadores humanos, mesmo que fossem
especialistas na área, porque, visualmente, as redes são muito parecidas,
apresentando diferenças de estruturação mínimas.
“Por meio da mineração computacional de dados, a separação das
imagens em dois conjuntos distintos pôde ser feita em minutos, por computadores
pessoais comuns. Extraímos 54 medidas das redes corticais e apenas quatro se
mostraram relevantes para realizar a classificação dos indivíduos”, complementou.
Uma vez diferenciados os dois conjuntos, o passo seguinte,
segundo o pesquisador, foi empregar o aprendizado de máquina para ensinar ao
computador as características rotuladas como “normais” e aquelas atribuídas aos
portadores de esquizofrenia. “A partir disso, a máquina aprendeu a classificar
os novos exames, alocando-os em um dos dois conjuntos, com uma margem de 80% de
acerto”, afirmou.
Esquizofrenia
pediátrica
O estudo enfocou uma modalidade específica de esquizofrenia
denominada “esquizofrenia pediátrica”, especialmente difícil de diagnosticar
por meio da abordagem clínica convencional, baseada em entrevista, apresentação
de questionário e avaliação subjetiva do entrevistador. “Esse tipo de
diagnóstico é o mais difícil de ser realizado clinicamente, pois a doença se
manifesta em jovens e crianças, nos quais os sintomas comuns ainda não são
evidentes.
No entanto, o diagnóstico desse tipo de esquizofrenia é extremamente
importante, pois permite uma intervenção com medicamentos que sejam capazes de
frear o avanço da doença”, afirmou Rodrigues.
Esse trabalho resultou em um software acadêmico, que poderá ser
aperfeiçoado e disponibilizado para uso médico no futuro.
“Já temos o software capaz de classificar os dados. Ele pode ser
utilizado para o diagnóstico da esquizofrenia em geral. Os fatores limitantes
do procedimento são o custo ainda muito alto da ressonância magnética funcional
e o fato de esse exame exigir a colaboração ativa da pessoa que está sendo
examinada. Ela não fica na máquina sob sedação. Precisa estar acordada e
realizar determinadas ações, de modo que o exame detecte as regiões cerebrais
ativadas durante essas atividades”, ponderou Rodrigues.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a incidência da
esquizofrenia na população é da ordem de uma para cada 100 pessoas. A
enfermidade atinge em igual proporção homens e mulheres, mas, em geral,
manifesta-se mais cedo no homem, por volta dos 20 aos 25 anos de idade,
enquanto que, na mulher, a manifestação ocorre com maior frequência entre os 25
e os 30 anos.
O software desenvolvido pode ser utilizado também no diagnóstico
de outras doenças que possuam contrapartidas neuronais. “Já estamos pesquisando
o emprego no diagnóstico do autismo. E existe
também a possibilidade de utilização no diagnóstico precoce do Alzheimer”,
informou o pesquisador.
“Essa será a medicina do futuro, com o uso de métodos
de inteligência computacional para diagnosticar doenças de difícil
identificação pelos métodos tradicionais. O diagnóstico preciso, rápido e menos
invasivo possível é um dos grandes desafios da medicina moderna”, completou o
pesquisador.
Da Agência Fapesp
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