Vivemos um clima de nostalgia pensando que devemos
regredir no tempo e recuperar não se sabe bem o quê. A palavra “resgate”
carrega em si essa sensação. A vida privada prega uma volta aos bons e velhos
tempos, assim como a escola, assim como a sociedade.
Vivemos um estúpido tempo de arrependimentos, esquecendo-nos de
que superamos o século XIX. Temos hoje muitos direitos assegurados. Todas as
crianças estão na escola, a legislação garante infinitamente menos horas de
trabalho por dia, o acesso ao sistema de saúde é universal e é acessível até
para estrangeiros.
A insalubridade dos locais de trabalho é penalizada e o trabalho
infantil está sendo banido. Quem imaginaria tudo isso e muito mais no século
XIX?
A laicidade do Estado é garantia de reconhecimento das
diferenças. Estamos nos autoflagelando como se fôssemos miseráveis sem
capacidade de construir nossas vidas privadas de forma satisfatória. As
famílias consideram-se prejudicadas em relação às do passado, que mantinham casamentos
arranjados ou afeitas a manter fachadas de felicidade, mesmo praticando o
assujeitamento das mulheres e ao não reconhecimento da cidadania das crianças.
Voltamos nostalgicamente aos uniformes escolares na tentava de
assegurarmos o controle sobre a infância e lamentamos a insurreição dos
estudantes, que, espertos, querem algo além do quadro-negro.
Novas circunstâncias
surgem com a emancipação das mulheres, desvencilhadas da herança de submissão
milenar. Vivemos uma era em que Direitos Humanos significa ausência de
teologias oficiais e a abstração de condições étnicas, sexuais e sociais.
A família é a representação da vida privada, que exige hoje um
Estado a serviço dos cidadãos e não o contrário. Ela quer que a maioria tenha
acesso ao crescimento individual. Poucos conseguem ler o que a família
pós-moderna pretende. Ela não é o centro de tudo ainda, a ponto de não ter
políticas que a enriqueça.
A família convive com males de fácil resolução, caso houvesse
interesse político separado da política partidária. Somos governados por
pessoas preocupadas com reeleição, com reuniões formais de partidos, com
audiências incipientes sacrificando o que realmente importa, que é a promoção
das potencialidades individuais dos cidadãos.
Somos um povo que pensa viver uma vida não verdadeira. Segundo
Luc Ferry, filósofo francês, os estoicos, em sua sabedoria, pregavam aos
discípulos que deveriam esperar um pouco menos e amar um pouco mais. Fazendo
eco aos estoicos, ao invés de amarmos nossos filhos um pouco mais, queremos
retroceder e reinventar tempos bem sanguinários, duros e de uma moralidade
castrante castradora.
Não acredito estarmos vivendo vidas fracassadas, mas temos
acesso a belos novos tempos. Mas para isso temos que ver a família como o
centro de nossas vidas, deixando de lado velhas utopias, modelos ultrapassados,
para olharmos para a frente com a perspectiva de darmos sentido à tarefa de nos
sentirmos bem e adequados. A felicidade não está lá fora, na rua, mas dentro de
nós e dentro da nossa casa.
Uma família suficientemente feliz transcende! Ela ultrapassa
muros e divide com os lá de fora. Não é possível construir sobre escombros. A
educação é uma caminhada pessoal e coletiva, mas deve começar sobre bases
sólidas, que contemplem o reconhecimento de que estamos fazendo o melhor.

Um estado laico é capaz de promover políticas de reconhecimento
das individualidades e da liberdade de escolhas. As famílias precisam fazer
parte de uma Pátria soberana, que não cerceia, que não seja dividida por
ideologias caducas.
O olhar patológico para o passado pode trazer de volta modelos
que tinham como foco o não reconhecimento da nossa humanidade, cuja vocação
maior é a liberdade.
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Muitas pessoas querem voltar à praticas que muitas vezes nem presenciaram. Cada época possui suas particularidades, sua sociedade. O que servia antes, não servirá agora, do mesmo jeito que o modo que vivemos hoje não servirá nos tempos futuros.
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