sábado, 22 de setembro de 2012

Deficiência afetiva

Ela estava dentro de um ônibus qualquer. Indo para algum ponto da cidade. Ela gostava de sentar no fundo para poder ver melhor o que acontecia. Na rua, a chuva que caia havia criado uma espécie de véu, fino e bucólico, que pintava a cidade de forma quase que abstrata. E o trânsito não era dos mais agradáveis.

Dentro, ela via o mundo passar enquanto escutava em seus fones uma música que lhe fazia rememorar tempos distantes. E, num certo momento, reparou em uma senhora que recém havia adentrado no ônibus. Seu semblante era calmo. Os cabelos crespos, levemente molhados, tinham um aspecto quase que angelical. Seu rosto possuía marcas do tempo que entregavam sua idade um pouco avançada, mas era uma mulher bonita.

Todavia existia algo de peculiar naquela mulher... E isso chamou mais a atenção da moça de fones de ouvido. Faltava espaço no carro. O horário era propício para que a lotação máxima fosse alcançada em questão de minutos.

E por entre corpos inertes, a senhora tentava desbravar caminho rumo ao fundo do coletivo. Entre solavancos e encontrões, ela arduamente conseguiu ficar perto da porta de saída. E em pé.

Poucos minutos passam. E enquanto isso, o restante das pessoas parecia não ver e nem ouvir a senhora de idade que viajava pendurada na vertical. Todos ao seu redor ignoravam sua presença de forma tranquila, como se aquilo fosse a coisa mais natural a ser feita.

E a moça dos fones de ouvido resolveu intervir naquela cena toda. De supetão, a mulher levantou-se de seu acento e desbravou caminho até chegar na senhora. Chegando lá, disse para a dona que ela poderia ficar com o seu lugar, pois ela tinha preferencia por causa da idade e tudo o mais.

 Seu discurso foi reto e correto, mas não surtiu muito efeito na massa maioritária. Eis que então a senhora responde positivamente para a mulher, apenas com um aceno de cabeça, e segue para o banco que agora estava vago.

Chegando lá, a senhora se acomoda lentamente, coloca sua bolsa no colo e fala com a mulher de um jeito um pouco diferente. Ela agradeceu a gentileza com um sorriso, tocou na mão da moça para retribuir a delicadeza e a chamou mais perto para falar algo.

Sua voz era quase inaudível. Muito suave e lenta. A moça se encolheu toda e aproximou o ouvido da senhora para poder entender com mais clareza o que aquela mulher de idade tinha a dizer.

E entre os ruídos do ambiente e da rua, a menina escutou tal frase: “Tenho um problema desde de sempre, sabe? Sou surda desde de que nasci e aprendi a viver com isso. Tanto é que sei ler os lábios das pessoas. Não preciso de caridade e nem de ajuda, mas gentileza e respeito sempre é bom. Te agradeço do fundo do coração.

E leve isso para a sua vida, minha querida: o deficiente é aquele que finge não prestar atenção nas pessoas; que finge não ver, não escutar e não falar com seus semelhantes.

 Meu problema é apenas um problema. Já essa deficiência aí, infelizmente, não tem cura”.

por Daniel Bittencourt.

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Um comentário:

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