terça-feira, 19 de março de 2019

As voltas da vida



Lembro-me do meu pai, à mesa, me confortando. Eu, com sete ou oito anos, com medo de ficar velha e não poder mais brincar. Ele sabiamente dizendo que as brincadeiras mudariam com a idade, mas jamais me seriam proibidas.
 Algumas coisas podiam perder a graça para que novas viessem a me interessar. Usou como exemplo a minha mamadeira. Estava lá. Eu não era proibida de usá-la. Eu só não tinha o interesse. Havia descoberto outras maneiras. Não brincar mais, não seria uma imposição da idade, mas uma troca de interesses.
Embora eu não acreditasse que alguém pudesse perder o interesse em brincar aceitei de coração aberto as palavras que me encorajaram a vida toda. A vida, afinal, é como no videogame. Quando se passa para uma nova fase a dificuldade aumenta, mas o prazer de vencer também. Os obstáculos são parte do jogo.
Pensar assim torna menos difícil seguir em frente, sem olhar pra trás. Com isso resolvido na minha cabeça, retomar um ciclo já fechado era algo que eu não considerava. Isso até o dia em que, no desespero de retomar a minha rotina de exercícios físicos, decidi colocar o prazer no início da minha lista de prioridades. Precisava reencontrá-lo em alguma atividade física que eu pudesse me dedicar diariamente. Precisava me mexer.
Mais um mês lendo, escrevendo e vendo filmes e eu me esqueceria de como se anda. Sempre fiz muita atividade física e minha apatia tinha um nome. Ninho vazio. Meus passarinhos voaram em bando. Precisava redescobrir um prazer que me motivasse.
Procurei uma aula de dança. A aula foi ótima, mas o meu preparo estava péssimo. Temi não encontrar a satisfação que buscava. Foi quando surgiu a ideia do balé. Paixão antiga. Faz tanto tempo, pensei. Ciclo fechado. Mas, algo dentro de mim fez com que eu me questionasse. E se eu ressuscitar esse prazer? E se eu recomeçar? Foi o que fiz. Escolhi o horário, a turma, o método que mais se adaptava ao meu momento e recomecei do zero.
Não sei se, realmente, acreditava que sentiria algum dia o que eu sinto agora. Deixem o mundo lá fora! Aconselha o meu querido e abençoado mestre. Eu obedeço. Meus ouvidos, minha mente, meu corpo estão a serviço da superação. A cada aula venço um dragão, mas acima de tudo me entrego a um prazer indescritível.
Não tenho a pretensão de fazer voltar o tempo, mas de fazer o meu melhor. A cada aula o meu esforço busca isso. Pensei que ficaria o tempo todo me cobrando, comparando o presente com o passado. Não. Isso nem é permitido. Precisamos ser ainda melhores. Precisamos nos reinventar.
Quando ouço: “Vamos lá, minhas bailarinas, com todo o capricho”. Eu me sinto num teste do Bolshoi. Mentalizo cada pedacinho do meu corpo e dou tudo de mim. Esta concentração, este controle: respiração, movimento, ritmo, leveza, equilíbrio e memória, causam em mim o efeito da meditação.
Nem acredito como estou mais serena, em paz, de bem comigo. Isso, sem contar todas as boas coisas que vieram com essa decisão. Mas, sobre este assunto, falo numa outra crônica. A amizade feminina merece bem mais do que três linhas. Se conto isso a vocês é porque, por muito pouco nem considerei a ideia.
Obstáculos demais num período em que estava sensível demais. Portanto, queridos leitores, aceitem a minha contribuiçãozinha amiga e tentem. Procurem até encontrar. Caminhada, dança, pilates, musculação, ciclismo, estepe, tênis, pádel, vôlei, futebol, corrida, boxe, zumba, ritmos, surfe, frescobol, slackline, pollydance, o que for. Experimentem.
Reexperimentem. Troquem de modalidade de tempos em tempos, mas não abram mão de fazer o que for com muito prazer. Estou falando de atividade física, mas se quiserem abusar da criatividade, fiquem à vontade que está valendo.
A vida é uma só e muito curtinha pra se perder tempo de ser feliz se conformando com o satisfatório. Aproveitem que chegou o verão e saiam da janela! A vida tá aí pra ser vivida.

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