Se você se sente desconfortável com o
caminho que escolheu, se sente que escolheu errado, se este sentimento é
generalizado na equipe, porque continuar?
Uma
vez apresentei um desafio para minha equipe no Citibank, que eu estava formando
para serem mais intraempreendedores, com mais autonomia e desenvolvendo
soluções criativas para o nosso trabalho de implantação de sistemas de internet
banking.
Quando falei em desafio, o empolgamento era uníssono: ‘Desafio? Oba!
Adoramos desafios’, já doutrinados à expectativa de que intraempreendedores são
motivados pelo desafio. Falar é uma coisa, encarar o desafio é outra totalmente
diferente, como se viu ao longo das semanas seguintes.
O
desafio era reduzir em 40% o tempo gasto para implantar um sistema em um
cliente novo do banco (nosso sistema atendia apenas empresas). Na época,
levava-se em média 48 dias para um novo cliente se tornar operacional e
transacionar com o banco, ou seja, 48 dias sem gerar receita com este cliente
novo. O desafio que estabelecemos foi reduzir para um mês em média.
No
início, todos empolgados, energizados, auto-motivados. Nada melhor do que
resolver um problema grande e de alta relevância tanto para o banco como para o
cliente. Uma sessão de brainstorming trouxe algumas ideias interessantes. Uma
delas foi adotada, que não vem ao caso detalhar tecnicamente aqui neste texto,
mas foi a que pareceu ter mais chances de atingir o objetivo com menos riscos.
Dado
o alto engajamento de toda a equipe, formada por 12 analistas, eu tentei
interferir o menos possível, deixei que se auto gerenciassem e fui acompanhando
à distância o seu desempenho. Diante das primeiras dificuldades de conseguir os
dados necessários, já vi o arrefecimento do entusiasmo deles.
Outras
dificuldades foram surgindo como orçamento limitado e falta de apoio de outras
áreas envolvidas no processo de implantação. Um mês depois, nem todos vinham às
reuniões, discussões e até brigas iam minando a coesão do grupo e os avanços no
projeto estavam ficando mais espaçados.
Chamei
os líderes para conversar e o discurso antes que era só de planos e
possibilidades mudou para desculpas e justificativas sobre o que não estava
dando certo. O interessante é que os líderes não estavam em nenhuma das
justificativas apresentadas. Sempre havia um ou mais culpados e os culpados
eram sempre os outros. Diante disso, vi que a autogestão não estava funcionando
e resolvi assumir as rédeas do projeto, mas para isso, era preciso despertar
novamente o senso de pertencimento dos funcionários e fiz isso retomando o
propósito do projeto, não o objetivo, mas o significado e a importância daquele
projeto para eles, para mim, para o cliente e para o banco. Acho que meu
discurso foi mais ou menos assim:
“No
começo vocês acharam que ia ser fácil. Quem pôs isso na cabeça de vocês? Todo
intraempreendedor sabe que um desafio só é de fato desafiador se for difícil.
Na hora de escolher as ideias, vocês procuraram, talvez institivamente, o
caminho mais curto, não o melhor caminho, porque o melhor caminho era mais
difícil.
O pior é que o caminho mais curto se mostrou mais difícil do que vocês
esperavam e, por não estarem preparados para algo complexo, vocês viram o
trabalho que seria necessário, a dedicação necessária e automaticamente
compararam com suas outras atribuições. Foi natural mudar suas prioridades e
deixar este projeto em segundo plano.”
Todos
começaram a falar ao mesmo tempo. Porque fulano de tal não entendeu a ideia,
porque outro criou propositadamente barreiras para eles, porque não tem tempo
para o projeto, tem outras demandas, porque só vai funcionar se o diretor
aprovar, porque faltaram melhores orientações, porque não tem orçamento. Eu
interrompi eles:
“Vocês
perceberam o que estão falando? Vocês estão se comportando como qualquer outro
funcionário daqui, um discurso do porque não pode ser feito. O que temos
conversado há meses? O intraempreendedor tem outro discurso, o discurso das
possibilidades, olha como vocês entenderam, mas não conseguem mudar seu jeito de
pensar, não é falar porque não vai dar certo e sim falar como poderá dar
certo.” Subitamente todos pararam de falar.
Senti que entenderam o recado e
estavam se autopoliciando sobre suas próximas palavras, enchendo a sala com um
constrangedor silêncio. Continuei:
“Vamos
retomar nossas primeiras reuniões, lembram porque este projeto é importante? É
importante para quem? É importante porque? Que benefícios vai trazer?” Aos
poucos começaram a fazer uso da palavra novamente, falando porque é importante
para o usuário, como que o banco iria ganhar, quais os benefícios para os
departamentos transacionais do banco, como iriam reduzir retrabalhos internos,
de que forma o tempo deles seria otimizado para outras coisas.
Aos poucos as
ideias voltaram a surgir, o tom de voz foi aumentando, mais gente falando ao
mesmo tempo, mais gente querendo contribuir, logo passaram para a ideia,
consideraram que a ideia não era tão boa assim, mas viram também que podiam
aproveitá-la para fazer algo mais simples, mais efetivo e que dependesse só
deles. A energia voltou e logo abraçaram esta nova e mais simples ideia. Em
dois meses implantaram e começaram a colher os primeiros resultados.
Com
o tempo, a ideia foi evoluindo e outras áreas, vendo os benefícios, começaram a
contribuir também com ideias para agregar ao sistema novo existente, com suas
sugestões implantadas, a solução foi se tornando mais complexa, mais abrangente
e mais eficaz. Quando saí do banco, o tempo médio de implantação de sistemas já
era de 25 dias e ainda estavam melhorando os processos.
Embora
ninguém queira se sentir fracassado, muitas vezes é um sentimento importante
para usar como aprendizado, como forma de colocar o pé no chão e abandonar
ilusões e ideias pré-concebidas ou preconceituosas. O fracasso nos ensina
coisas que não poderíamos aprender de outra forma, o que leva à outra lição: O
trabalho em equipe só funciona quando, diante de falhas e erros, cada um
procure em si mesmo onde errou e o que poderia ter feito de diferente antes de
culpar os outros.
Mesmo que sinta que não errou e que você fez a sua parte,
declare publicamente alguma omissão ou algo que você poderia ter feito, assuma
alguma culpa. O primeiro que faz isso é o líder e este tipo de declaração deve
inspirar os outros a fazer o mesmo e assim construir uma relação de
comprometimento mútuo e identidade coletiva.
Outra
coisa que percebi é que todos gostam da liberdade, mas nem sempre estão
preparados para arcar com as responsabilidades que vem junto. Ser um líder
quando tudo vai bem é uma coisa, mas os verdadeiros líderes emergem quando as
coisas vão mal.
As crises são as melhores escolas de liderança. Se queremos
formar líderes, não devemos tentar protege-los, devemos deixá-los lidar com as
circunstâncias emergentes e até mesmo, criar crises propositadamente,
desestabilizar o ambiente de alguma forma, para leva-los aos seus limites.
Por
fim, a coragem. Quando a importância do projeto fica clara para todos e todos
se identificam com os mesmos propósitos, o grupo ganha coragem para recuar e
tomar outro caminho ou muitas vezes até mesmo recomeçar do zero, se julgarem
necessário. Não querer sair do caminho errado porque já trilhou muito deste
caminho é insistir com o erro e aceitar resultados medíocres, que não condizem
com o espírito empreendedor que queremos fomentar.
Se
você se sente desconfortável com o caminho que escolheu, se sente que escolheu
errado, se este sentimento é generalizado na equipe, porque continuar? Porque
insistir? Existe a esperança de que este caminho faça sentido no final? Onde
existe paixão, onde existe crença, não existem caminhos errados, só os certos.
Pode custar caro, mas não faz sentido continuar um caminho errado. São estas
crenças e princípios que forjam a determinação e a perseverança do
empreendedor, pois podem existir vários caminhos certos, mas nunca insistimos
em caminhos que sabemos que são errados.
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