Olhos na terra, na cabeça a lavoura. Bem antes que a semente deva cair,
muito preparo para esse campo. Avaliar tudo, do sol ao pH dos torrões, da água
aos ventos, do arado ao adubo, do pessoal ao orçamento. Uma boa dose de fé que,
em se plantando, dá. Segurança de boa semente, boa semeadura e boa reza. Saber
esperar. O tempo dirá.
Essa visão agropastoril ajuda não só a quem quer boa colheita, ajuda
também a psiquiatras deste planeta. Na lavoura-consultório, alguma etapa feita
sem extrema atenção pode comprometer o que todos queremos e não há como voltar
atrás, haverá perdas.
Qualquer médico hipocrático, mais ainda o psiquiatra, sofre ao ter que
receitar alguma pílula. Padece porque há, como no campo, etapas a cumprir em
detalhe. Ninguém sai por aí receitando sem antes preparar, e muito, ao
paciente. Esta pessoa não pode manter pra sempre a crença de que a salvação
está no comprimido.
Ao detectar esse problema o psiquiatra sabe ser o sinal de que seu
paciente não está ainda preparado para a medicação, requerendo antes
intervenções. Quando a autoconfiança alcança o nível adequado, a psicanálise
contribui, chega o momento maduro para medicar, quando os efeitos indesejáveis
e as frustrações dos 'remédios' - sempre os há - podem ser encaminhados e o
paciente tenderá menos à dependência (da droga, do médico ou do que for).
Aqui e por aí afora, mesmo no mundo rico, os serviços psiquiátricos têm
sobra de demanda e falta de recursos. Isso aumenta conflitos para o psiquiatra
e o psicólogo, pois as 'lavouras' a preparar excedem a capacidade de
atendimento adequado e a consequência é a hipermedicação, a dependência, a
medicalização da vida, a 'quimificação' da psiquiatria.
Dilema de sempre de todo médico e de toda a gente da área psi:
"diagnóstico incompleto, tratamento inadequado". Nosso abismo sem fim
é poder completar o diagnóstico, o que implica avaliar o corporal, o psíquico,
o social, o espiritual, nada menos. Isso no paciente, mas antes dele, em si
próprio. Ave, Hipócrates, nosso arado.
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