“Meus
filhos escorregaram das minhas mãos!”
(Abdullah Kurdi –cidadão sírio e do
Mundo)
A
humanidade acaba de realizar o pior de seus selfies.
Em
velocidade eletrônica na era de peito estufado e siliconizado, a passos largos
que galgam conquistas efêmeras e pós-modernas, a coletividade societária,
‘organizada’ em Estado, acumula atrocidades enquanto troféus numa sanha
travestida de saga. É a peleja por status que escravizou do Homem das Cavernas,
hoje, enfeitiçado pelo cifrão, acumulando pecados na mesma proporção em que
acumula bugigangas.
Pequeno
em espírito e desvalorizado na condição de ser social, o Homem, ‘moderno’,
caminha em bandos e aos prantos rumo à possibilidade gritante de uma Terceira
Guerra Mundial. Calça apertado – no roubo – a inocência dos passos das crianças
expulsas de seus quintais e casas, apartadas dos pais e países, roubadas em
suas culturas e círculos familiares, de mãos dadas a adultos que (na sua grande
maioria, nem são seus progenitores) correm da vida atordoados pela fome e medo
da morte covarde.
A busca
pela sobrevivência moderna não é mais ligada à riqueza culinária do pão sírio,
africano ou oriental mas que seja digna e entre aspas por um pedaço duro e seco
de alimento tal qual leão de circo. Leigos e ricos, os homens modernos olvidam
o que afirma a Bíblia Sagrada: “Certifica-te bem do estado do teu gado miúdo;
atende aos teus rebanhos, porque a riqueza não é eterna e a coroa não permanece
de geração em geração.” (Provérbio cap. 27 – 23/24)
Responsável
ideológico pelo tabuleiro da guerra mundializada e planejada, assassina e em
série, o sistema geopolítico econômico, de hegemonia imperialista (promotor de
duas grandes guerras) destina a população trabalhadora à exploração ferrenha de
seus corpos, mentes e almas. Terceirizada, a classe proletária, há tempos, não
ultrapassa mais que o status social relegado a simples regalos de direitos ao
acesso. As políticas sociais delegadas à plebe respira debaixo da saia justa de
uma burguesia que prega valores mas não usa calça. Os podres poderes de um
mundo atropelado e que se diz moderno já não cabem na tigela rasa satisfeita no
mingau ralo destinado às plantas da produção moderna e fragmentada. Vampiresca,
a elite do capital se alimenta do sangue de quem produz valor e fomenta a
mais-valia, ou seja, o trabalhador precariado.
A força
de trabalho mundializada, hoje, não passa de uma grande massa de alienados que,
destinada a um projeto social do capitalismo hegemônico, capenga enxergando sua
migalha de emancipação da miserabilidade a meio olho de uma justiça que empunha
a espada cega, pelega. Duas ou três potências ianques – em detrimento do resto
do mundo – seguem destinando as sobras das riquezas socialmente produzidas ao
coletivo trabalhador pobre, globalizado e amontoado enquanto exército de
reserva. Enferma do corpo e com o vazio da fome roncando no estômago a plebe
segue saqueada em direitos estabelecidos por tratados supremacistas
internacionais estabelecidos a partir de 1789, quando a França, revolucionária,
anuncia a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão.
As
grandes conquistas humanitárias alcançadas ao longo dos séculos, destoam – a
partir da Segunda Grande Guerra – quando usam e abusam de mais uma crise do
grande capital para instituir e legalizar estruturas transnacionais com o
interesse único da hegemonia do cifrão. Pavio detonador de extremada
desigualdade social a qual atende a exigências monetárias neoliberais, este
fenômeno sociopolítico, segundo Iamamoto & Carvalho é: “A reprodução das relações
sociais é a reprodução de antagonismos de classe que tende a se aprofundar.
Assim, a acumulação da miséria é proporcional à acumulação do capital.” (1998,
p.62)
Assoprada
pelo calor do (e)vento midiático e efêmero que unifica enquanto destoa a sociedade
competitiva e urbanizada, na qual fomentam-se banalidades coletivizadas, o
coletivo demente vem sendo retratado por seres (des)humanizados. E alcança o
apocalipse ao se descobrir nu e mentiroso, na denúncia cruel da foto –
viralizada – nas redes sociais, espelho da vaidades de um mundo socialmente
desmoralizado: O corpo de uma criança que, mesmo depois de morta, segue com a
cabeça apontada para o Norte, Sul, Leste ou Oeste. São os novos retirantes,
vitimados pelas guerras em terras sírias, do Oriente Médio e da África, – sem
rumo certo nem dignidades. E estão sendo aniquilados pelo poderio bélico das
facções financiadas no tráfico de drogas, de armas e das gentes.
Órfãos de
pais, sem pão nem vinho, a geração moderna de homens velhos, organizados e covardes.
A banda de rock goiano Lobinho e os Três Porcão, sintonizada com os eventos que
acontecem no resto do mundo profetiza: “Os velhos fazem guerras para o jovem
morrer”. Asseguradas em leis amarradas à ineficácia da gestão geopolítica do
planeta, corrupta e corruptível, asseveram-se as ditaduras excludentes,
perpetuando a realidade covarde, cruel e assassina de milhares de vidas, sem
limite de idade, credo, cultura ou poderio econômico.
Enquanto
crianças inocentes morrem asfixiadas, mães são estupradas e pais desonrados na
miséria absoluta, os velhos são deixados para trás, sem direitos, sem casa, sem
dentes nem dignidade mínima qualquer. E apesar de tudo e de todos, o lado mais
rico e hegemônico desta humanidade consumista, hipócrita e alienada, banaliza,
viraliza e segue a vida correndo em busca do nada, ou seja, dando milho aos
pombos.
No livro
Vinha de Luz, Chico Xavier remonta a este assunto crucial e atual citando o
espírito Emmanuel: “Que prodigioso éden seria a Terra se cada homem concedesse
ao próximo o que lhe deve por justiça!” (20a ed; p. 316). Aos milhares, os mais
novos excluídos da história contemporânea – submetida ao valor bélico o qual
supera quaisquer possibilidades reais de emancipação socioeconômica e cultural
ou de credo, – os trabalhadores, precarizados, seguem moendo engrenagens e
vidas na macabra dança da maquinaria moderna a qual aniquila e nega qualquer
possibilidade de sonhos reais ao ser social que – a cada dia – vai se tornando
mais vulnerável e fictício. Exploradas na mais-valia destinada à obtenção do
lucro indecente, de acumulação escandalosa e voraz, as paixões abortam sonhos e
brotam fetos sem vida num jogo estranho, tacanho e infindável o qual desenha um
vale de lágrimas.
Na janela
midiática de um mundo mais que atual, a realidade, em luto, dá as cores ao
arco-íris geográfico universalizado que exala o odor inaceitável de milhares de
vidas perdidas na morte de gente submetida à própria sorte, efêmera, banalizada
e virtual. O evento da guerra suja não respeita, tampouco considera aspirações,
seja na luta com coragem ou através do medo de reivindicar. Seus projetos dão
conta apenas da certeza de uma inexistência de qualquer futuro, a possibilidade
de um amanhã, até mesmo o mais incerto.
Sentada
no trono, a rainha inglesa bate mais um recorde relacionado ao ridículo,
inapropriado e parasitário poder exercido pela força de guerra do cetro ianque.
Invasores promotores do nefasto legado ligado à dominação pela força e coerção
de povos e roubo das suas riquezas. Seu reinado e poder de império completam
quase 64 anos de hegemonia parasitária de um poder local imperialista, de
tentáculos globalizados.
O mundo
moderno, incrédulo e frio, de tão desigual, não se dá conta da prole nivelada
ao solo da guerra, sequer da estratégia egoísta que propala desigualdades
sociais estampadas na miséria da população mundial. Num dos piores e mais
cruéis registros do jornalismo fotográfico dos últimos três séculos, a denúncia
do estado latente da podridão societária. A luta de classes – travada no século
eletrônico – expõe e escancara ao mundo – através da mídia de ocasião vinculada
às redes sociais – o corpo morto, ainda na infância mas verdadeiro de mais um
menino vulnerável, desprotegido e inocente – o sírio Aylan Kurdi.
Kurdi é
mais uma das milhares de crianças vitimadas pela logística de guerra dos três
maiores exércitos invasores do mundo. A mascarada primavera, mundializada,
expõe movimentos sociais financiados na ganância do lucro obtido nas
necessidades urgentes e pós-modernas. Estas sobressaem às necessidades
‘mínimas’ de uma gente sofrida e que vai morrendo a conta-gotas, em carne e
osso, vitimada no genocídio indecente da raça (des)humana, esparrama pelos
quatro cantos do planeta – os novos ciganos.
Da noite
para o dia cidadãos do mundo perdem a cidadania e a dignidade, a terra e o
idioma, submetidos a leis e racismo do mundo estrangeiro, morrendo aos milhares
– e por minuto – num mundo e planeta a perder de vista.
Mundo
afora, este mesmo planeta joga no lixo, neste instante, somente na Argentina,
mais de 1,5 milhão de tonelada de cereais, hortaliças, lácteos e carne,
enquanto o resto do mundo, este mesmo imundo mundo atura-se e atira na latrina
social dignidades, histórias, a fé do trabalho e a certeza de qualquer futuro.
A
justificativa para mais esta expressão da questão social (mundial e moderna) –
ligada às guerras – há anos, está nos versos da canção Blowin’ in The Wind, de
Bob Dylan: “A resposta, meu amigo, está soprando ao vento.”
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