segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Cientistas afirmam que álcool faz mais mal que drogas


Drogas ilícitas fazem menos mal do que muitas drogas lícitas, declararam vários cientistas, em debate promovido pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro, sobre política de drogas, proibicionismo e seus efeitos.


Para o professor de medicina da UFRJ, João Menezes, a proibição e criminalização de drogas são arbitrárias e hipócritas. “Sou contra o sedentarismo, mas não acho que todo o sedentário deve ser preso. O mesmo vale para o usuário de drogas. Várias drogas lícitas matam tanto ou mais é ninguém vai preso por isso”, disse ele.

“Todos os animais correm atrás de substâncias psicoativas. Até o inseto. É natural. Criminalizar a droga é uma hipocrisia. Todos os trabalhos que justificam a proibição da maconha foram feitos a partir da proibição, não antes”, afirmou.

Ele defendeu que os estudos atuais não são suficiente para determinar os verdadeiros efeitos nocivos de determinas drogas. Muitos produtos entorpecentes vêm com outras substâncias nocivas que não são consideradas em várias pesquisas”, afirmou o professor.

O pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Francisco Neto considera que o efeito do álcool é muito mais devastador na sociedade brasileira do que o do crack. “A ciência hoje em dia mostra uma visão muito distante do que é o senso comum”, declarou.

Para Francisco Inácio Bastos, também pesquisador da Fiocruz, a cultura de criminalização das drogas prejudica até os estudos sobre o assunto. “É uma questão estigmatizada, sujeita à penas. Algumas pessoas acham que ao tratar desse tema correm risco pessoal. Então, a pesquisa acaba subestimando o uso”.

Bastos coordenou uma pesquisa nacional sobre uso do crack no ano passado. Ele lamentou que pouco se saiba sobre as drogas consumidas no país, visto que as autoridades não liberam seu uso para fins acadêmicos. “Se quisermos fazer ciência, precisamos analisar e precisar essas amostras. Temos que saber o que de fato as pessoas estão usando. Muitas vezes, a presença da substância ilícita é ínfima. Precisamos ter padrões confiáveis”, comentou.

Todos os presentes concordaram que a política de enfrentamento às drogas adotada pelas autoridades brasileiras só contribui para a superlotação carcerária, aumento da violência e do consumo de drogas.

Outro consenso é que o uso de drogas não devem ser tratado como problema de segurança, mas de saúde pública, quando o consumo for problemático.

Foram citadas experiências em outros países, como Portugal e Inglaterra em que a descriminalização e o enfoque na saúde têm ajudado a diminuir o número de mortes na população usuária de substâncias e diminuído o número de encarcerados.

O defensor-geral do Rio de Janeiro, André Cruz, destacou que o aumento no número de prisões no estado está diretamente relacionado ao aumento de processos que tratam de drogas. “Tínhamos, em 2008, uma população carcerária de aproximadamente 25 mil pessoas. Atualmente são 43 mil. Praticamente dobrou, mas estamos mais seguros hoje? O número de processos relativos a tráfico de drogas aumentou vertiginosamente”, declarou.

Ele adiantou que a Defensoria iniciou, há cerca de duas semanas, uma recomendação  institucional para que os defensores peçam automaticamente a inconstitucionalidade de toda a prisão de usuários, na maioria jovens negros e pobres. “Queremos que seja dado aos jovens pobres o mesmo tratamento que dão ao jovens  ricos, quando são pegos com pequena quantidade de drogas”.

Apesar dos dados concretos que apontam que a guerra às drogas causa mais danos que o consumo, a maioria da população ainda trata as drogas como tabu, declarou o jornalista Denis Bugierman, autor do livro “O fim da guerra”.

“Fazem uma associação das drogas com o mal, e qualquer atitude em relação a elas torna-se má”, comentou o pesquisador. “A violência está explodindo onde a guerra às drogas acontece”, disse ele, que acredita que o país vive o auge dessa guerra.

“Não existe mundo sem crime, como não existe mundo sem drogas, mas essa enorme massa de excluídos é que precisa ganhar dignidade, ser atendido com respeito, ter oportunidades”, disse Inácio Bastos.

O Supremo Tribunal Federal (STF) deve votar ainda neste mês a inconstitucionalidade da criminalização do porte de drogas para uso pessoal, por entender que é questão de foro íntimo.


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