sexta-feira, 7 de agosto de 2015

O medo da loucura e incompreensão

Seria o louco mais feliz que eu? Sempre pensei. Sabe o louco que é louco? Como sei que não sou? Não sei! Se eu fosse eu teria sacado, imagino, escutado alguém falar. Embora a gente sempre evite o assunto quando o “objeto de estudo” está perto. Covardia.

Será que pro louco ele é normal e o resto do mundo é louco? Menos os outros loucos, claro. Os loucos se entendem. “Esse povo sai do expediente cansado, frustrado, se embebeda a ponto de ficar… doido? Pra quê?” Mas nós (que somos normais) mesmo estando bêbados, sabemos o que estamos fazendo. A gente gasta 10% do salário numa noite, num bar. 

Desperdiçamos o dinheiro investido vomitando tudo. Xingamos todo mundo. Batemos o carro. Brigamos com quem a gente gosta, ama. Mijamos na calça.
O que diferencia o louco do normal é a culpa. Se você conseguir comprovar que é plenamente culpado de tudo que fez, de todas as burradas, de todas as loucuras. Se você é culpado, então é normal.

Amar pode sim, a gente deixa. Desfrutar não. É safadeza! “Que feiura, esse povo doido tudo tarado. Temos que ficar em cima!” A presença do louco deixa a gente louco também. A culpa é de quem? A nossa presença deveria deixar o louco mais normal! Não? Pra quem? A gente se alimenta. E nos sentimos superiores. Até que a gente cansa e aí a gente tranca. Todos juntos. Até que poderia ser bom para eles. Mas não nos aguentamos, não nos seguramos. Controlamos: remédios, horários, roupas iguais, todos sem roupas, presidiários.

Tudo tem dia certo, as vezes não tem dia. Solitária! Dia de visita é diferente. Banho tomado. Roupas novas, limpas. Dentes escovados. Visita é no jardim. Flores, passarinhos, até o sol é mais vivo. “Que lugar bonito, eu passaria minhas férias aqui.” Passaria não, lá dentro é um inferno, e não adianta depor contra a casa, o médico já avisara a família que o paciente seria agressivo e que tinha alucinações. A família acredita no médico, é conveniente. “No mínimo mais 5 meses para ele ficar bem”. A família paga adiantado que é pra não ter que voltar lá todo mês.

Seria o louco mais feliz que eu? Não mais. Agora entendo o processo. O torturador tem que ter algo pelo que viver E a gente prefere assim. “Doido dá trabalho demais, quase matam a gente”. Mas no fim quem mata e quem deixa matar somos nós. No livro-reportagem Holocausto Brasileiro, a jornalista Daniela Arbex expõe a frieza e crueldade praticadas dentro da Colônia, o maior hospício do Brasil, aberto durante o século XX, no qual morreram mais de 60 mil pessoas.

Não havia critério, para lá eram mandados não só os “doidos”, o filho homossexual, a filha que perdera a virgindade antes do casamento, o marido mandava para lá a esposa para que pudesse viver com a amante, alcoólatras, moradores de rua e todos que causavam algum desconforto à sociedade. Quem não era doido ficava, e quem já era só piorava.

O hospício deve ter surgido não para tratar do louco, pois o louco é secundário no processo. Se o louco fica mais louco ou menos louco não tem problema; ele vai acabar ficando mais ou menos tempo internado. Se o louco morre, ia acontecer, todos já sabiam. O hospício trata é da gente, que somos normais. Não suportamos a presença de quem tem um diálogo e percepções diferentes das nossas, então os trancamos longe pra podermos nos tratar.



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