quarta-feira, 11 de março de 2015

Stédile reclama:Tem veneno até na pinga!

Para o líder do MST, o País deve fazer um trabalho de alerta sobre os perigos à saúde pelo uso de agrotóxicos

Nos 30 anos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, um de seus coordenadores nacionais, o economista João Pedro Stédile, não vê mais como prosperar, no Brasil, a luta pela reforma agrária tal como conhecida nos primórdios do MST. Ele observa que no senso comum das pessoas trata-se de repartir o latifúndio e entregar para os sem-terra. “E é isso mesmo, na essência, romper com a grande propriedade.

Porém, os projetos de reforma agrária, feitos pelo governo com os instrumentos do Estado, só se viabilizaram, no passado, porque eram política combinada com um projeto de desenvolvimento nacional que objetivava desenvolver a indústria para o mercado interno”, diz.

O movimento, no entanto, avalia que a questão agrária não pode se resumir ao objetivo de proporcionar trabalho para segurar as pessoas no campo. “A reforma agrária não é apenas resolver um problema de trabalho. Tem de ser para resolver o problema do veneno, da alimentação sadia. De garantir um futuro, de fazer uma agricultura que respeite o meio ambiente, que respeite a biodiversidade”, explica. Enfim, tem ser base de um novo modelo de desenvolvimento, que una na mesma planilha progresso industrial e sustentabilidade.

Stédile critica a permissividade com que se prolifera no Brasil o uso de agrotóxicos já proibidos em outras partes do mundo por sua agressividade ao ambiente e à saúde. Cita pesquisas que associam o veneno agrícola ao crescimento da incidência de doenças como câncer de próstata, de mama, mal de Parkinson e a problemas de infertilidade. Alerta que, no cigarro, a má fama fica com a nicotina, que só vicia – o que mata são os produtos químicos usados, sobretudo, no cultivo do fumo. E que a produção em larga escala de cana-de-açúcar levando o veneno também para a aguardente:
“Pode largar mão de tomar pinga. No Brasil se bebe cachaça há 400 anos, mas antigamente não tinha veneno, e agora tem”.
Stédile vê o cenário político-institucional brasileiro dominado pelo poder econômico. E que a burguesia industrial perdeu a oportunidade de romper fazer um pacto de desenvolvimento porque prefere colocar o dinheiro na especulação financeira. “Por isso foram contra a CPMF. Porque o dinheiro deles está no banco, não na fábrica e na produção.” Diante da hegemonia do agronegócio no Legislativo e no Judiciário, e de um governo dividido pela composição de classes em seu ministério, não está otimista: “Estamos ferrados”. Ele aposta, porém, que “a médio prazo” haverá uma nova ascensão dos movimentos de massa, como foi de 1976 a 1989, empurrada pelo agravamento das contradições da política e do capitalismo brasileiro.

A quantas anda o potencial agressivo dos alimentos que a população consome?

O modelo do agronegócio é apenas um modelo de se ganhar dinheiro. Se o único objetivo é ter lucro, não importa se vão destruir a natureza, se vão usar venenos, se desempregam pessoas. Nos últimos dez anos, apesar de termos um governo progressista, o agronegócio expulsou em torno de 4 milhões de trabalhadores assalariados. O trabalho humano foi substituído por máquinas e pelo veneno. O uso do veneno, por esse modelo, não é uma necessidade agronômica. Para se produzir não precisa veneno, que é usado como uma forma de substituir a mão de obra que antes fazia as práticas agrícolas com tempo de trabalho, por exemplo a capina, um plantio mais cuidadoso. Agora, é máquina e veneno. Primeiro, para substituir a mão de obra. Segundo, como são monoculturas em larga extensão – ou só soja, ou só laranja, ou só algodão, ou só pasto – têm de matar, na lógica deles, todas as outras formas de vida vegetal ou animal. Não praticam uma agricultura. Querem produzir uma commodity. O veneno é a forma de matarem tudo que não é soja, que não é laranja, tudo que não é algodão.
E o veneno, em si, também é um negócio?

Há uma aliança de interesses. A Monsanto, por exemplo, fornece fertilizantes, veneno, e compra soja. A mesma coisa a Cutrale com a laranja. A mesma empresa ganha dinheiro com veneno e controlando o mercado, que tem origem nas fórmulas desenvolvidas pela Bayer, pela Basf, pela Du Pont, para os negócios das guerras. Na Primeira e na Segunda Guerra Mundial usaram muito. Depois, na Guerra do Vietnã. Quando terminaram as guerras, as fábricas de veneno pra matar gente e floresta em larga escala foram adequadas para a agricultura.

Há uma aliança permanente entre interesses – o grande proprietário, as empresas que compram a produção dele, que controlam o mercado das commodities e que ao mesmo tempo são as fabricantes de veneno. A Monsanto, por exemplo, fornece os fertilizantes, o veneno, e depois compra a soja. A mesma coisa a Cutrale com a laranja. Oferece o veneno, os adubos e, depois, compra a laranja. A mesma empresa ganha dinheiro com veneno e controlando o mercado, que têm origem nas fórmulas desenvolvidos pela Bayer, pela Basf, pela Du Pont, para os negócios das guerras.
Na Primeira e na Segunda Guerra Mundial usaram muito. Depois, os Estados Unidos, na Guerra do Vietnã. Quando terminaram as guerras, essas empresas adequaram aquelas fábricas de veneno pra matar gente e floresta em larga escala para a agricultura.
Agora não é mais em larga escala?

São as mesmas empresas. É os efeitos são de extrema gravidade. Um punhado assim de terra (junta as mão em concha), tem mais de mil formas de vida. São aqueles bichinhos invisíveis, bactérias, que formam os nutrientes, senão a terra não produz nada. O veneno mata essas formas de vida. E contamina a água. Todas as grandes cidades do Brasil já têm água contaminada com mais de 20 princípios ativos de venenos agrícolas, inclusive em São Paulo.
 Essa água que a Sabesp nos fornece, que aparentemente é boa, mesmo sendo considerada potável tem mais de 20 contaminações, que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) ainda considera tolerável porque está dispersa. Só que se tomar essa água todos os dias, aquele veneno, que é químico e não conseguimos ver, vai se acumulando no organismo e também nos alimentos. Está em doses mínimas, não vai matar na hora, mas vai se acumulando no organismo.
Como o consumidor de alimentos e dessa água pode imaginar alguma gravidade se ele, como diz o samba, “bebe sim, come sim, e está vivendo…”?
Não seria um alarmismo falar que essa água e esse alimento são envenenados?

É uma necessidade da população saber o que tem naquele alimento. Em relação à água, que é mais problemático, os graus de contaminação, no Brasil, estão acima de qualquer país da Europa. Temos uma campanha nacional contra o uso do agrotóxico, da qual participam, inclusive, técnicos da Anvisa, para pressionar o governo a mudar a legislação e baixar os índices de toxidade a limites como os da Europa. E nos alimentos, a única coisa que a Anvisa faz é avisar.
 Fazem uma pesquisa a cada seis meses nos supermercados, só têm dois laboratórios no país que fazem, quando deveria haver um por cidade, e te avisam. Nós já estamos cansados de saber. Mas vamos avisar os leitores: os produtos que têm mais agrotóxico são o tomate, o pimentão, o morango e a maçã. Ultrapassam o tolerável. Se você está acostumado a, toda semana, comer maçã, é claro que você vai acumular mais veneno do que quem come banana. Se você está acostumado a sempre fazer a comida com pimentão, está frito, porque o pimentão vai transferir para o seu organismo um índice maior de veneno.
Rede Brasil Atual.


Comente este artigo

Nenhum comentário:

Postar um comentário