segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Sobre racismo e hipocrisia

Nos últimos dias, foi destaque na mídia em geral o caso da torcedora gremista que, aos berros, entoava “macaco” para o goleiro Aranha, do Santos. Claramente, a atitude da torcedora passa longe de ser correta, porém, há algumas questões que seriam, no mínimo, interessantes de serem lembradas.
Primeiramente, é válido lembrar que o problema começa justamente na falta de informação, em que as pessoas não sabem diferenciar injúria racial de racismo. Pois então, comecemos do começo: injúria racial se caracteriza por ofensas de conteúdo discriminatório dirigido especificamente para uma pessoa ou para umas pessoas, enquanto racismo, de fato, acontece quando as ofensas e atitudes discriminatórias são dirigidas não a uma pessoa em si, mas venham a desprezar uma determinada raça (embora eu ainda acredite que raça é um termo muito equivocado), cor, etnia, religião ou origem.

 Deste modo, a atitude da torcedora tricolor caracteriza-se como injúria racial e não racismo.
Certamente, isto não muda a gravidade da situação. Assim, cabe à justiça decidir a pena da torcedora e também do clube. Foi o que aconteceu, na tarde da última quarta-feira, dia 3. O Grêmio Foot Ball Porto Alegrense foi excluído da Copa do Brasil, além de ter que pagar uma multa.
Exagero ou não, foi o que designaram como punição ao clube. A parte da hipocrisia começa agora: de início, é complicado que um País que defende cotas raciais declare-se não racista, mesmo que a explicação para as cotas seja a falta de vontade e empenho político para que haja uma reforma na educação pública, em que estudantes de todas as cores são prejudicados pelo descaso.
Segue-se a linha da hipocrisia quando um clube é punido devido às atitudes de injuria racial de uma torcedora juntamente com uma minoria ínfima, enquanto torcedores de outro clube, pertencente a outra parte do País, tire a vida de um adolescente da torcida adversária e o clube, por sua vez, não sofra dano algum.
A hipocrisia continua quando pessoas que xingam o juiz e o time adversário, e amaldiçoam, mesmo que brevemente e impulsionados pelas mais diversas emoções que o futebol nos causa, torcedores e atletas do time rival durante os 90 minutos de partida, “crucificam” a atitude da torcedora gremista, como se não convivessem com esse tipo de atitude em seus cotidianos.
A injúria racial não deve ser tratada com descaso, porém, o moralismo que tem sido manifestado nas redes sociais, por exemplo, me faz pensar que vivemos em uma sociedade que trata negros e brancos de uma forma igualitária, como trata também de forma igualitária e sem “piadinhas” ou “deboches” gays, héteros, bissexuais, japoneses, nordestinos, gaúchos, alemães, loiras, evangélicos, espíritas, rastafáris, e etc. Arrisco a dizer que até a pessoa mais desprovida de qualquer tipo de preconceito algum dia já foi infeliz em algum tipo de comentário que de certa maneira inferiorizou algum dos estereótipos que citei acima. E nem por isso tiveram sua casa apedrejada como a torcedora gremista.
A “onda” de fazer “justiça com as próprias mãos” juntamente com esse falso moralismo que tem assolado nossa sociedade onde opiniões se disseminam sem qualquer embasamento tem levado ao caos. As pessoas cansadas das falhas do nosso sistema judiciário acabam por cometer mais falhas quando tentam fazer o papel do próprio judiciário.
 Torcedores Flamenguistas, era o próximo adversário do Grêmio, e fizeram ameaças nas redes sociais, deixando os gremistas em alerta para aquela partida. E é assim que, infelizmente, tentam resolver os problemas, tentando recriminar a violência justamente com mais violência.
O torcedor que clama por justiça para a torcedora gaúcha a transformando em um monstro e apedreja a casa onde a mesma mora, esta sendo tão monstro quanto ela. O torcedor que acha absurdo chamar o goleiro Aranha de “macaco” mas considera normal apelidos como “gazela” para designar a torcida do tricolor gaúcho está sendo preconceituoso da mesma forma.
Para concluir e “fechar com chave de ouro”, um dos auditores do Superior Tribunal de Justiça Desportiva que participou do julgamento que determinou a pena do time gaúcho, Ricardo Graiche, apagou sua conta no Facebook por conta de postagens de cunho racistas encontrados em sua linha de tempo. Não vou mais citar a palavra hipocrisia neste artigo porque acredito já tê-la usado demais, mas deixo para os leitores fixarem ela em suas mentes.
Deixo para finalizar apenas um apelo, de que sejamos mais racionais não só nos estádios, mas nas situações do nosso dia a dia, na hora de julgarmos o erro do outro errando junto por querer usar os punhos ao invés do cérebro.

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