segunda-feira, 15 de julho de 2013

Síndrome do clique compulsivo


Que atire a primeira pedra quem nunca curtiu ou compartilhou um texto ou vídeo na internet antes mesmo de lê-lo ou assisti-lo até o final. Ou quem não clicou em um arquivo recebido por e-mail, mesmo sem ter certeza do que se tratava. É grande o número de pessoas que passam alguma informação para frente antes mesmo de saber o que ela diz em sua totalidade. Os dois primeiros parágrafos de um texto, ou os 45 segundos iniciais de um vídeo, já são suficientes para a maioria das pessoas decidirem se devem ou não compartilhá-lo com seus amigos. O que poucos sabem é que isso pode trazer problemas para a vida pessoal ou profissional do apressadinho, além de indicar, em casos extremos, o início de algum distúrbio psicológico que deve ser visto com certa cautela.

A síndrome do clique nervoso, ou síndrome do clique compulsivo, que é a definição dada à atitude das pessoas que clicam em quase tudo que vê, na internet, antes mesmo de ter certeza do que se trata, pode também trazer problemas financeiros. Não são raros os casos de pessoas que tiveram seus computadores infectados com programas espiões que roubam dados, como senhas de bancos, de e-mails, de redes sociais, entre outras. Com essas informações em mãos, bandidos podem fazer compras em nome do usuário descuidado, sacar dinheiro em sua conta e até postar mensagens em seu nome nas redes sociais.

O diretor de arte Neyron Mendes passou por alguns problemas quando clicou em um link na sua página da rede social, sem se atentar o suficiente sobre o que se tratava. "Eu recebi um convite no Facebook, de uma amiga, e assim que eu cliquei, ele foi reenviado automaticamente a toda minha lista de contatos, que são mais de mil. O Face noticiou que eu tinha feito algo errado e me bloqueou na mesma hora", explica.

Neyron precisou pedir ajuda a uma amiga para informar a todos os seus contatos que o link que ele havia enviado se tratava de um vírus e que não deveria ser aberto. Mesmo assim, muitos da sua lista não se atentaram para a advertência, se contaminando e disseminando ainda mais o problema. "Hoje eu tomo mais cuidado na hora de acessar alguma coisa", comenta.

Essa não foi a primeira vez que o diretor de arte teve problemas com arquivos recebidos pela internet, anteriormente já havia tido problemas ainda maiores devido ao acesso de conteúdo duvidoso na internet. "Recebi um e-mail da minha irmã, e ao clicar, era vírus. Esse caso foi mais sério, pois foi preciso formatar o computador para remover o problema", informa.

Após passar por esses transtornos, Neyron decidiu por mudanças drásticas, com medo de ter prejuízos ainda maiores do que os anteriores. "Depois da experiência do e-mail eu desisti de usar até o cartão de crédito. Vi que as coisas não são tão seguras como eu pensava", relata. "Hoje eu não compartilho nada antes de ler tudo, e ter certeza. Mas, ainda assim acho que tenho um pouco da síndrome do clique compulsivo. Às vezes, como trabalho muito tempo no computador, acontece de clicar em alguma coisa sem saber direito do que se trata, mas estou bem mais controlado, depois de ter passado por tudo isso", esclarece.

Identidade On-line

Com a síndrome do clique compulsivo, a pessoa pode criar uma identidade virtual diferente da que ela realmente deseja. Quando se curte ou compartilha algo, sem saber ao certo do que se trata, pode-se estar disseminando uma ideia contrária à que a pessoa realmente segue, e ela pode passar a ser identificada a partir daquele hábito.

Pode ser que uma pessoa não seja racista nem preconceituosa, mas há de ser definida como tal, devido ao que curte ou compartilha na internet. Como o mundo virtual está cada vez mais presente na vida das pessoas, o histórico de suas atividades on-line pode dizer muito do que ela é, por isso a necessidade de se dar mais atenção aos cliques, quando se está conectado.

"Se eu não ler a mensagem por completo, posso acabar difundindo algo que não condiz com o meu pensamento real, e na internet você é o que você pensa. Como as pessoas vêm apenas o que é postado, o seu discurso que é importante", explica a especialista em Mídias Sociais e Gerenciamento de Crise na Internet, Patrícia Teixeira.

Segundo a especialista, a síndrome do clique nervoso tem muito haver com o novo perfil do internauta, "são pessoas ansiosas, não aderem à informação, mas acham que têm que passar pra frente. Na verdade não é necessário curtir e compartilhar tudo que se lê, mas somente o que lhe interessa realmente". Ela explica que é preciso se atentar para a mensagem que é compartilhada na internet, pois ela pode afetar a identidade do usuário. "A identidade não é formada apenas pelo nome e a foto de um perfil, mas também de como a pessoa se comporta quando está conectada", destaca.

Patrícia acrescenta que a síndrome do clique nervoso está ligada não apenas ao ato de clicar em tudo que se encontra pela frente, mas também na necessidade que algumas pessoas sentem de postar alguma coisa a cada minuto. Há quem divulgue tudo que está fazendo, e suas postagens chegam a irritar os demais, e ela se torna inconveniente. "Eu mesma já bloqueei várias pessoas em minhas redes sociais por não suportar tantas publicações inúteis", conta.

De acordo com a profissional, "tudo que se faz hoje, online, fica registrado, e a internet nunca esquece". Sendo assim, as postagens, os compartilhamentos, ou as curtidas, corroboram para a formação do perfil do usuário, e ele será visto não pelo que pensa que é, e sim pelo que a internet diz. "As pessoas não pensam nisso, mas as redes sociais é o seu banco de dados, fica tudo ali, registrado", realça.

Geração Ansiosa



A psicóloga e professora do Instituto de Pós Graduação de Goiás (Ipog), Cyndia Bressan, alega que o clique compulsivo pode estar relacionado com as características presentes no modo de vida dessa geração atual, que extrapola o âmbito da internet, se mostrando também na vida real. "Essa geração que temos hoje, chamada Geração Y, quer tudo mais rápido, e talvez, por isso, gera-se muita ansiedade. Mas não é somente na internet, se olhar o computador de uma pessoa dessas, dá pra notar que tem várias janelas abertas de uma só vez, pois ela não quer perder tempo", explica.

Para a psicóloga, o comportamento virtual pode ser apenas um reflexo de como a pessoa vive, e como a tecnologia permite trabalhar por até 24 horas por dia, isso acarreta ainda mais ansiedade, tornando o dia-a-dia cada vez mais cansativo. "Hoje o indivíduo se comporta na internet da mesma forma que é no trabalho e na família, então leva essa ansiedade para outros ambientes nos quais ele convive", destaca.

Cyndia conta ainda que as pessoas com clique nervoso compartilham sempre muita coisa de uma só vez, "sem nenhum critério de escolha, nenhum consenso e sem ter noção real do que está compartilhando". Isso pode indicar problemas de ansiedade e conforme informou a psicóloga, a ansiedade pode desencadear inúmeros problemas de saúde.

Segundo Bressan, ao perceber que se está usando a internet de forma compulsiva, a pessoa pode, sozinha, buscar soluções para isso. "Ela não precisa procurar tratamento, a não ser em casos extremos. Pode começar a se policiar, buscar desenvolver outras atividades fora da internet, que lhe dê prazer, e a principal coisa a fazer é verificar se isso não a está prejudicando de alguma forma", conclui.

Problemas no trabalho

O mau uso das redes sociais em ambiente de trabalho, também pode acarretar problemas a funcionários que possuem hábitos compulsivos. A psicóloga Cyndia Bressan, que também é mestre em psicologia social do trabalho, fala que a ansiedade dessas pessoas pode contagiar outros ao seu redor, além de perder, na internet, muito tempo que deveria ser dedicado ao trabalho. "Se ela começar a postar em redes sociais coisas muito íntimas ou gastar muito tempo do trabalho para utilizar a internet, pode até ser desligado da empresa", diz.

Dependendo da situação de trabalho, o funcionário passa a ser, mesmo na sua vida pessoal, um apêndice da empresa. Nesses casos, as postagens e compartilhamentos em redes sociais devem ser ainda mais criteriosos, pois podem agredir diretamente a imagem da empresa, e não apenas do funcionário.

Outro ponto apontado pela psicóloga social do trabalho é a importância das redes sociais no momento da contratação do funcionário. Ela conta que, através de uma visita ao perfil de uma pessoa, pode-se descobrir muito sobre ela. "Muitos recrutadores pesquisam as redes sociais dos indivíduos. O que você posta, compartilha ou curte é o que você realmente é, pois ninguém é obrigado a compartilhar nada, então isto é uma forma do recrutador conhecer, de fato, o candidato", expõe.

Mais riscos

O clique compulsivo, além de manchar a identidade virtual do indivíduo, pode também lhe trazer inúmeros problemas financeiros, como o exposto pelo diretor de arte Neyron Mendes, que precisou formatar o computador, perdendo muitos documentos. Clicar em muitos links, sem critério, coloca em risco todos os dados pessoais do usuário, podendo causar ainda mais transtornos.

O professor do Ipog Marcelo Roncato é especialista em segurança na internet e explica que, ao clicar em algum local indevidamente, e acessar um provedor mal intencionado, o usuário estará abrindo as portas do seu computador para outro acessá-lo, podendo inserir ou retirar qualquer coisa da máquina. "Alguém pode colocar informações na sua máquina, ou retirar informações dela. Além de entrar em um mundo que não é o seu, só por que você clicou em algo por curiosidade, seus dados podem ser usados para fazer alguma coisa em sem nome, inclusive compras pela internet, ou mesmo ser postado alguma coisa na sua rede social, como se fosse você", expõe.

Roncato fala que, como o facebook é uma comunidade, mesmo que algumas pessoas sejam mais criteriosas em relação ao que clicar e quais links abrir, outras de sua lista de contato podem não ser, colocando todos em risco. "Não existe segurança total na internet, mas o que a gente aconselha é colocar programas que diminuam os riscos e que se tenha mais atenção na hora de clicar em algum link, não sendo tão ansioso. 100% de segurança na internet é complicado", alega.


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