domingo, 16 de dezembro de 2012

Sobre segundas chances...



Nada estava bom para ela. Se chovia, a culpa era do tempo ruim. Se fizesse sol, a culpa era do calor. E assim ela seguia: reclamando e xingando, sem ouvir nenhuma canção. E, como para todo o mundo, os anos foram passando deixando marcas irreversíveis em seu corpo e mente.

Era uma mulher rabugenta, porém muito quieta. Raramente opinava sobre algo. Toda a lamentação era interna, velada, intrincada dentro de si. Não tinha homem pelo simples fato de que nenhum era bom o suficiente. Amigos já não cultivava mais, pois os poucos que tinha ela afastou. Era uma mulher só, perdida, amargurada dentro de seus rancores existenciais, pelo simples fato de que acreditava ter nascido na época errada. Era uma perdida em pleno século XXI.

Mesmo assim se dizia inteligente. Seu QI beirava os 200 e sabia de tudo. Mecânica? Física quântica? Medicina? Construção Civil? Tudo era demasiado simples para o seu intelecto. E para compreender tais assuntos não precisava cursar faculdade e nem se especializar. Bastava procurar informações nos lugares certos e ler tudo sobre o tema. “Simples assim”, dizia. Não ignorava nada, mas também nada dominava, pois se colocou no patamar de mestre e desaprendeu a aprender.

Trabalho fixo não fazia parte de sua vida. Queria vaga de emprego sim, mas emprego de chefe, de diretora, de dona de empresa. E reclamava quando nada conseguia. “Quantos incompetentes estão ocupando as vagas que deveriam ser minhas?”, regurgitava entre um resmungo em outro. Pobre coitada... seu mundo não tinha norte. E se teve, algum dia, estava bem perdido em um passado longínquo e infeliz.

Uma casa, para chamar de lar, há tempos não existia. Perambulava de um lado para outro sem se apegar a nada e nem ninguém. Da família já nem sabia mais. Não tinha nenhuma pessoa e nem a ela mesmo. Era apenas um corpo pálido vagando na imensidão solitária do mundo. E assim ela foi vivendo, ano após ano, dia após dia, batida após batida e sem mudar o seu jeito.

E ela foi murchando, se encolhendo e deixando de viver. Não era uma mulher ruim. Pelo contrário. Apenas esqueceu da vida; deixou ela de lado. Não tinha e nem fazia planos. Apenas existia. Até que um belo dia morreu. E não deixou nada. Ela viveu uma vida sem luz, sem deixar sua marca, seu nome, seu legado. Ninguém sentiu falta, pois já havia deixado de existir há muito tempo. E hoje ela é apenas mais uma entre tantas existências fracassadas. Certamente deve estar pensando consigo neste exato momento: “Da próxima vez, em uma outra vida, vou voltar renovada e pronta”. Que pena... é uma lástima deixar tudo para resolver outro dia e nem saber se uma segunda chance lhe será dada.


por Daniel Bittencourt.

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