segunda-feira, 4 de julho de 2011

A revolução das cobaias



O título deste artigo é o mesmo de um artigo escrito por Mario Henrique Simonsen em 1991, em que o autor referia-se aos fracassos dos planos heterodoxos utilizados, ao longo da segunda metade dos anos oitenta e primeira metade dos anos noventa, ao combater a hiperinflação brasileira. O professor Simonsen é um dos raros casos de alguém que possuía um prestigio acadêmico a trabalhar no serviço público via meio político. Acredito que ele ilustra os três pontos que gostaria de abordar neste artigo: o funcionamento do meio acadêmico, o porquê de pessoas deste meio não participarem do serviço público e de suas decisões e, por último, as consequências disto.

A academia tem um funcionamento bastante simples e, razoavelmente, eficiente. Qualquer pessoa que possui alguma ideia pode publicá-la em um evento e/ou uma revista científica. Estudar e publicar em uma determinada área torna-o especialista no assunto. Para ser publicada, a ideia terá que passar pelo processo de avaliação que envolve um debate com outras pessoas, também especialistas e estudiosas da área do conhecimento em questão, que, por sua vez, levam em consideração vários aspectos, dentre os quais, a plausibilidade é requisito essencial.

No meio político, a plausibilidade das ideias não é requisito. As decisões passam por acomodações de interesses e, por exemplo, dois mais dois pode ser cinco se dessa forma ficar bom para a maioria. Portanto, pessoas do meio acadêmico têm receio de que suas ideias acabem distorcidas pela política e de que, no final, ainda acabem sendo responsabilizadas por algo que não fizeram. O que, normalmente, ocorre é que, se der certo, a ideia foi do político; se der errado, a ideia foi sua.

Por não saber lidar com o meio político, raramente, os cargos executivos são ocupados por pessoas do meio acadêmico e de sua área de especialização. Contudo, seria recomendável que, ao tomar decisões de cunho essencialmente técnico, pelo menos, haja algum debate e/ou alguém considerado especialista na área seja consultado. Caso contrário, as consequências podem ser desagradáveis.

Os planos heterodoxos de combate à inflação são ilustrativos. O que eles tinham em comum, além do fato de serem mirabolantes e carecerem de fundamentos lógicos? Todos foram originados a partir de ideias fora do meio acadêmico, que não passaram por qualquer debate com especialistas e não cumpriam nem mesmo aquele requisito básico de plausibilidade. Assim, o povo passou a ser cobaia de experimentos absurdos, com nenhuma chance de sucesso.

Consequências desagradáveis também podem ser vistas na mobilidade urbana em algumas cidades. Começam com medidas que previam a inversão de algumas vias, passam pela criação do sistema de integração do transporte público, sem que haja ônibus suficientes para que este fosse implementado, e culminam com a inclusão de uma faixa de segurança nas rodovias de maior movimento dos municípios. Essas últimas medidas podem ser comparadas ao sequestro dos recursos da conta corrente e da poupança feita no Plano Collor, pois, ambas não resolvem o problema e são absurdas. O caso das faixas de segurança é mais grave porque, diferentemente do Plano Collor, que tentava resolver um problema (hiperinflação) criado em um governo anterior (Sarney), as faixas são uma tentativa de minimizar um problema criado pelos próprios governos municipais, que criam estações de transbordo de passageiros nas quais os mesmos devem atravessar uma rodovia. Ou seja, um absurdo resultou em outro.

Infelizmente, não vislumbro uma solução próxima para os problemas de mobilidade urbana dos municípios, pois, provavelmente, ninguém que possua conhecimento inconteste nessa área estará disposto a participar neste momento, em que várias medidas que foram adotadas não podem ser revertidas sem que se pague um alto custo político. Assim, os cidadãos ainda terão que conviver, mais um período, sujeitos a novos experimentos.

Por Cristiano Oliveira

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