sábado, 2 de outubro de 2010

A FOME...



Há que se olhar com certa cautela (e muita tristeza) o relatório da FAO - Organização para a Agricultura e a Alimentação, recentemente liberado (14), que dá destaque à queda de 9,6% no contingente de subnutridos no mundo, baixando do número simbólico, anteriormente divulgado, de um bilhão de pessoas, para 925 milhões. Não há o que se comemorar, apesar da euforia de alguns, com o diagnóstico de que o número de pessoas em situação de fome no mundo caiu em 2010 pela primeira vez em 15 anos. Atribuem isso, em parte, graças à redução de preços dos alimentos e à inovação tecnológica em agricultura. No entanto, ainda estamos longe de cumprir o objetivo estipulado nas Metas do Milênio (redução da subnutrição em países em desenvolvimento de 20% no período 1990-1992 para 10% em 2015). Na atualidade esse índice é de 16%. Para atingirmos a meta estipulada, teremos de continuar reduzindo os subnutridos em 100 milhões de pessoas ao ano. Um número alcançável, apesar das ameaças dos chamados fundamentos de mercado (rememorem o pico de preços dos alimentos de 2008, motivado pela ação de fundos de investimentos, demanda por biocombustíveis e aumento no preço do petróleo, particularmente) e desastres naturais (seca na Rússia e enchentes no Paquistão, recentemente).
Fiz questão de frisar os números do relatório da FAO para instigar a reflexão: Por que existe fome num mundo de fartura? Afinal, que é fome? Aumentar a oferta de alimentos resolve o problema? Ajuda humanitária internacional é a solução para o problema enfrentado pelas nações mais pobres do mundo?

Que é fome?
Muitos assumem saber o que é fome ou por que, em alguma ocasião, sentiram isso às vésperas de um jantar que atrasou ou leram a respeito ou, ainda, viram imagens de pessoas famintas na televisão. Mas, efetivamente, poucos de nós paramos para pensar sobre essa questão que aflige uma parcela significativa da humanidade.
Estatísticas sobre fome e subnutrição, na forma aguda ou crônica, existem há anos. No entanto, qual é a utilidade desses números? Ao mesmo tempo que servem para sensibilizar também podem, na frieza dos indicadores, nos distanciar de algo que está, imperceptivelmente, muito próximo de nós. Enquanto olharmos para fome e subnutrição como uma medida física, mensurada pelas estatísticas da FAO, não compreenderemos as raízes do problema e tampouco veremos a solução.

As emoções da fome
Deixar de medir a fome no mundo em números, que mais se prestam para a elaboração dos relatórios da FAO e discursos diplomáticos que para qualquer outra coisa, e pensar no fenômeno em termo de sentimentos humanos universais que todos experimentamos, algum dia na vida, talvez seja mais relevante. Fome, para quem vive o flagelo, é a angústia de ter de fazer escolhas difíceis na escassez, é o luto de ver quem ama morrer, é sentir a humilhação de depender de outros e viver sob o medo da incerteza.
Quando pensamos sobre fome/subnutrição estatisticamente, apenas em números (número de pessoas com dieta insuficiente em calorias), a proposta de solução também é numérica (toneladas de alimentos, quantidade de dinheiro para ajuda econômica, etc.). Uma vez que compreendamos fome a partir de como lidam as pessoas reais com o quadro de emoções, quem sabe possamos perceber suas raízes e ter maior clareza sobre o problema. Até mesmo entender que o problema existe não por uma mera falta de vontade em resolvê-lo. Que aumentar a oferta de alimentos não necessariamente é a solução, podendo inclusive, em situações de abundância, mais e mais pessoas passarem fome. E que a ajuda humanitária internacional, em certos casos, quando estão envolvidos conflitos culturais e religiosos, pode até piorar a situação.

Mitos da Fome
O livro "World Hunger - Twelve Myths", de Frances Moore Lappé, Joseph Collins e Peter Rosset, é uma obra imprescindível para quem quiser entender fome e subnutrição no mundo um pouco mais além dos relatórios e estatísticas da FAO.

Provérbio Chinês
Se você quer alimentar alguém, dê a ele um pouco de arroz, mas se você quer dar a esse alguém uma razão para viver, então dê a ele uma flor.

Gilberto Cunha.

Se desejar, deixe seu recado!!!

Nenhum comentário:

Postar um comentário