domingo, 5 de setembro de 2010

O direito de rir e de pensar dos brasileiros



A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que liberou as sátiras a candidatos e partidos, bem como opiniões favoráveis e contrárias aos mesmos na programação das emissoras de rádio e televisão no período pré-eleitoral, respeita as garantias constitucionais de livre manifestação do pensamento, expressão intelectual e informação, e assegura a todos os cidadãos o direito de serem abastecidos não só de notícias, mas também de análises críticas e leituras da cena política filtradas pela ótica corrosiva e, geralmente, reveladora do humor.
Por mais estranho que possa parecer, um dos grandes problemas da política brasileira decorre de uma de suas maiores virtudes. Trata-se do uso errado que uma parte dos políticos costuma fazer dos dispositivos legais destinados a proteger o ocupante de cargo público de perseguições e represálias, devido a atitudes tomadas no exercício de suas funções. Garantias como foro privilegiado, inviolabilidade do mandato e imunidade parlamentar permitem que os homens públicos exerçam seu trabalho com segurança e liberdade, mas são usadas como blindagem por maus políticos, que se valem de seus cargos para conseguir vantagens ilícitas.
As regras da lei eleitoral (lei nº 9.504/1997) que proibiam as emissoras de usar trucagem, montagem ou outro recurso de áudio ou vídeo que, de qualquer forma, degradem ou ridicularizem candidato, partido ou coligação e difundir opinião favorável ou contrária a candidato, partido, coligação, a seus órgãos ou representantes (incisos II e III do artigo 45) corroboravam a ideia, não de todo errada, de que os políticos vivem num mundo à parte, acima das leis que regem os cidadãos, intangíveis em suas mazelas e protegidos até mesmo de críticas por um manto de impunidade.
Embora a lei nunca tenha punido alguém por fazer humor político antes das eleições, o fato é que a ameaça de sanções induzia à autocensura. Em votação na quinta-feira (2/9), o Supremo confirmou, por maioria de votos, liminar concedida na semana passada pelo ministro Ayres Britto em Ação Direta de Inconstitucionalidade movida pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), e suspendeu as restrições cautelarmente.
A decisão remove as correntes que impediam tanto humoristas quanto comentaristas de apontar, com total liberdade (embora balizados pela legislação no que se refere a crimes contra a honra e a dignidade), as mazelas das candidaturas, expondo à avaliação pública o ridículo de certas falas e atitudes. O humor e o comentário político continuarão fustigando candidatos, partidos e coligações durante a campanha eleitoral, o que pode ser péssimo na visão de alguns, mas atende melhor à demanda democrática e ao regime de liberdades do que a proteção censória a figuras públicas.
Até mais que os discursos sérios e os manifestos, o humor tem o poder misterioso de dar forma simples a ideias complexas, de expor a essência viciosa das práticas políticas e de catalisar o anseio por mudanças. É difícil imaginar a resistência à ditadura militar, nos anos 1970/80, sem a contribuição de artistas do humor como o cartunista Henfil (Henrique de Souza Filho). Seus personagens Graúna, Zeferino e Francisco Orelana eram como que um cartão-postal em negativo do regime, verbalizando em suas tirinhas as injustiças sociais, a pobreza, a concentração de renda, os oligopólios, a truculência do poder.
Os bons políticos não devem temer críticas, sejam elas sérias ou jocosas, pois estas são formas abertas e frontais de manifestação, que podem inclusive ser respondidas aberta e frontalmente. O que corrói a democracia não é o artigo assinado, a charge ou o quadro de humor: é a campanha eleitoral que se faz de forma insidiosa e velada, por vezes disfarçada de notícia. Contra essa é que todos, candidatos e cidadãos, precisam se precaver.

Cruzeiro do Sul.

Eleição sem sátira não tem graça. O que acha disso? Comente, participe!!!

4 comentários:

  1. A lei de vetar o comédia e as brideiras com candidatos é algo sem sentido algum. Espero que não impessam de novo nos humoristas a fazerem seu trabalho. Abraços.

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  2. Meu caro amigo William, boa noite!!!
    Não faz nenhum sentido a criação desta Lei, já temos tantas que não funcionam... além do mais a censura vai contra os princípios fundamentais da democracia... se o candidato for ofendido em seus direitos morais, pode recorrer à legislação pertinente... Concordo, os métodos da campanha eleitoral precisa passar por uma mudança radical.
    Parabéns pela excelente postagem!
    Abraços e muita paz!!!

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  3. O que me deixa indignado é que a "força de trabalho" político-brasileira somente se esforça para despender energia quando é um assunto que ou não agregará nada para a sociedade ou somente atenderá a seus interesses particulares/escusos.

    Votações que ajudariam muitas pessoas como o divórcio direto e a licença maternidade por 6 meses arrastaram-se a rastejos de minhoca. Agora quando o assunto é, por exemplo, votar aumentos de salários ou melhorias de benefícios dos parlamentares... Ah, aí há até sessão extra (com horas extras pagas por nós!) e com taxa de comparecimento recorde.

    Ótimo assunto levantado!

    Abraço.

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  4. Não há como não rir desses palhaços assassinos travestidos de políticos. Vamos expor os seus atos ridículos, queiram eles ou não! Esta "lei" é pior que confundir causa e efeito! Que corja!!!

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