domingo, 26 de setembro de 2010

Consciência ambiental ou miséria?



A matemática é uma ciência exata, mas deve-se ter muito cuidado com informações que coloquem números e estatísticas como único modo de análise sobre um assunto. Os números, mesmo os positivos, podem esconder visões ou desviar a atenção das pessoas sobre outros problemas decorrentes daqueles próprios números “maravilhosos”. O Brasil lidera o ranking de reciclagem de alumínio desde 2001. Nenhum país recicla tanto alumínio quanto nós. Motivo de orgulho? Talvez. Dados da Associação Brasileira de Alumínio (ABA) revelam que 160 mil pessoas vivem exclusivamente da coleta de latas de alumínio. Esse número pode ser maior se considerarmos as pessoas que catam latas mas têm outra atividade. É fácil encontrar por toda a cidade pessoas revirando os sacos e latões de lixo nas ruas, outras percorrendo a orla perguntando se as nossas latas estão vazias. Nos shows ao ar livre os catadores se vêem num ‘paraíso’. Há ainda os que ficam ‘assistindo’ você beber, talvez tomando conta da lata como uma pedra preciosa, já que a concorrência é enorme.

Segundo a ABA, este mercado está consolidado no País há 16 anos e em 2005, 96,2% das latas utilizadas foram recicladas, movimentando mais de R$ 400 milhões. Mas quanto ganha um catador? Quanto vale passar o dia e a noite revirando latas de lixo? Quando e como vão se aposentar? E a insalubridade? Gostaria de ver nesta área mais cooperativas, ONGs, instituições públicas e privadas apostando na construção da dignidade dos sem-teto, dos sem-emprego, dos sem-perspectivas, dos sem-nada e, de quebra, contribuindo para conservação do meio ambiente.

Algumas empresas privadas parecem interessadas neste nicho de mercado. Outro dia recebi uma propaganda de uma empresa que se oferecia para recolher o lixo reciclável. O lixo deveria estar devidamente separado, identificado e em frente ao portão da casa. Além de ter todo esse trabalho (pelo bem da natureza) eles ainda cobram pelo serviço, que provavelmente será realizado pelos mesmos catadores de sempre, pois quando o caminhão da empresa chegar, já não haverá o que recolher.

Por que ao invés de campanhas publicitárias caríssimas o governo não investe em um programa sério de reciclagem junto às Prefeituras, dando emprego, dignidade e perspectivas para essas milhares de pessoas? Um programa que investisse na diversificação dos materiais recicláveis cuidando da logística e da comercialização. Mercado há. Na semana passada, fui ajudar um amigo a se livrar de umas caixas que ele tinha em casa. Descemos as escadas com uma caixa e colocamos no local onde se coloca o lixo e fomos buscar outra. Quando chegamos de volta à rua com a segunda caixa já tinha um senhor com um carrinho (um burrinho sem rabo, diria a minha avó) pegando os papelões e perguntando se tinha mais. E quem ganha com isso? O meio ambiente? ... O governo, que pode usar os números estatísticos? ... A população, pois é uma maneira barata de melhorar a limpeza das cidades? ...

É a miséria a serviço do progresso.


André Maciel

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3 comentários:

  1. Boa noite! Para refletirmos.
    Abraços e uma ótima semana!
    Carla Fernanda

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  2. Meu caro amigo William, boa noite!!!
    O André disse bem "é a miséria a serviço do progresso"... eles ajudam muito na limpeza da cidade, em benefícios para o meio ambiente... mas quem se importa com a luta dos menos abastados... nosso governo prefere dar esmolas do que promover dignidade aos trabalhadores como esses.
    Parabéns pela excelente postagem!
    Grande abraço e muita paz!!!

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  3. Grande William, sem a menor dúvida a pobreza ajudou em muito esta progressão e aos numeros absolutos do primeiro lugar, mas, as vezes os meios acabam justificando o resultado, e uma coisa leva a outra, e aos poucos outras áreas estão descobrindo na reciclagem algo interessante e lucrativo que vai muito além do aluminio.

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