sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Os dentes dos candidatos



Em todas as eleições, o primeiro pensamento que me vem é votar nulo. Mas tenho resistido. Acho covardia. Votar nulo é perder a esperança. Como ela sempre morre por último, devia me considerar um homem morto. Nada animador.
Pior do que estar morto é tentar achar um critério adequado para escolher um bom candidato, que não nos mate de desgosto depois nem seja mais salafrário do que a gente imaginava.
Sempre assisti a programas políticos, analisei propostas, me informei sobre o passado dos caras. Fiz tudo direitinho, como mandam os analistas políticos, as cartilhas dos intelectuais, os sermões de padres e pastores. Tudo isso não foi suficiente, por causa da dinâmica dos líquidos de Daniel Bernoulli e por culpa da dialética de Hegel. Ninguém me garante de que o que foi bom até hoje continue sendo. Serviu-me mais um ditado espanhol: "Todos son buenos hasta que dejen de serlo".
Durante a propaganda política busquei uma variável que trouxesse certeza científica da índole do candidato. Como já expliquei acima, propostas e passado do sujeito são grandes armadilhas. Como escolher, a quem recorrer? Rezar? Fazer passe? Descarrego? Promessa? Chamar alguma amiga bruxa?
Eis meu critério. Para um voto sem arrependimento, observe os dentes do candidato nos "santinhos" da campanha. Há três tipos: os que não os mostram, os que mostram dissimuladamente e os que sorriem com a boca arreganhada.
Os que não mostram os dentes querem nos intimidar. Proclamam seriedade e compostura. São defensores da ordem e da moralidade. Marginais na cadeia, cidadãos de bem nas ruas. Quase sempre os cidadãos de bem são brancos, estudados e andam de cores escuras ou pastéis. Ganharam riquezas graças a seu esforço e não são como esses vagabundos que não estudam e não trabalham.
Os que sorriem dissimuladamente parecem tirar saro da gente. Talvez sejam os mais cristalinos. São malandros típicos, com um olhar de sacanagem explícita. Você imagina os dentes, mas não aparecem. Como não são sérios, nem arreganhados, ora se juntam a uns ora a outros. Depende dos ventos, quer dizer, dos proventos.
Olhe bem os que mostram as arcadas de cima e de baixo. Dentes perfeitos, mas tudo de laboratório. Não ache que aqueles dentes brancos, cândidos, são autênticos de nascença. São todos falsos, facetas de porcelana, resina, coisas bem elaboradas. São dentes fortes, com encaixe perfeito. Olho para eles meio cabreiro. Acho que estão rindo de mim.
Meu critério dos dentes talvez não te ajude acertar a escolha nas próximas eleições. Mas é um bom aviso. Mostrando ou não mostrando os dentes, mais cedo ou mais tarde, a maioria dos eleitos acaba mordendo o povo, o orçamento ou alguém descuidado. Como a mordida é inevitável, escolhemos com nossos melhores critérios, e nos vacinamos de consciência política. Quanto aos de mordida mais infecciosa - na próxima eleição - arrancaremos seus dentes, lhes daremos uma dentadura de plástico e os mandaremos pastar. E tudo isto a gente só pode fazer com o voto.


Por Pablo Moreno.

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3 comentários:

  1. Amei seu post! Também escrevi sobre eleições e candidatos hoje. Confesso, também não sinto vontade de votar. Passa lá no meu Blog pra ver meu desabafo, rs.
    Beijos,
    Mari
    http://marimartinsatemporal.blogspot.com

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  2. William,
    Sensacional esse texto.
    Os dentes sempre foram o cartão de visita de uma pessoa, muito embora algumas delas não tiveram a chance, e nem condições financeiras de cuidarem de sua dentição, e não podemos culpá-las por isso.
    Mas, tratando-se de política e políticos, esse texto nos faz pensar a respeito disso...
    E o que dizer dos dentes do candidato Tiririca? Sabemos que sua dentição é precária, ou melhor, ele não possui a maioria dos seus dentes, e seu sorriso, mesmo sendo com uma dentadura, é um sorriso de palhaço (no bom sentido), então, acho que está faltando este tipo de sorriso nesse texto, mas o resto está perfeito.
    Parabéns pela postagem.
    Bjs.

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  3. Meu caro amigo William, boa noite!!!
    Gostei do texto, mais acho que pelo dente não vai dar para escolher... sempre vamos acabar mordidos por eles... Lembrei de uma eleição aqui em minha cidade que quem estava rindo muito eram os eleitores e os dentistas...
    Confesso que também já tive vontade de votar nulo... mas na hora a gente sempre acaba escolhendo o que acha menos ruim... difícil acertar, tá pior que loteria...
    Parabéns pela excelente postagem.
    Abraços e muita paz!!!

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