sexta-feira, 30 de julho de 2010

AS RELIGIÕES E AS MULHERES



A condenação por um tribunal teocrático iraniano de Sakined Mohammadi, de 43 anos, por adultério na província de Azerbaijão Oriental, à pena de lapidação, isto é, apedrejamento até a morte, está provocando uma reação mundial contra a atitude do judiciário iraniano, onde as normas do Coorão predominam. Aliás, nenhuma das principais religiões do mundo tem sido boas para as mulheres. Mesmo que nos primórdios, algumas tenham se mostrado generosas com as mulheres, como o cristianismo ou o islamismo, em poucas gerações os homens as transformaram num patriarcado. Á medida que o sistema patriarcal foi se estabelecendo, as doutrinas religiosas que acordavam suas crenças na supremacia masculina foram se solidificando. Somente um Deus seria adorado e, logicamente, do sexo masculino. Interpretando o primeiro livro de Moisés – Gênesis – a mulher passou a ser elucidada sob a forma de Eva, a encarnação da sedução, cuja curiosidade e desobediência trouxeram ruína ao homem. Eva, fêmea insaciável, principal responsável pela ruptura de Deus com os homens. Sua simples existência era advertência para os desejos carnais, os quais o homem deveria evitar. As mesmas qualidades pelas quais as mulheres foram enaltecidas na sociedade matriarcal degradavam-nas na sociedade patriarcal. O ser feminino incomodava e, para ser integrado à sociedade vigente da época, precisava ser redimido e submetido a uma ordem masculina já definida. Portadoras da culpa original de Eva, as mulheres assumiram, resignadas, seus papéis sociais diminutivos.Na Idade Média, durante quase dez séculos, misoginia e machismo, ao interagirem no sistema patriarcal, potencializaram-se.Por decisão masculina e com a intenção de assegurar a castidade feminina, ficou determinado que a mulher permaneceria definitivamente restrita a um espaço privado: o lar. Assim ficaria mais fácil para o patriarca assegurar-se da virgindade de suas mulheres. Oficializou-se, então, a inferioridade feminina jurídica e social. A mulher era educada, preparada, condicionada e instigada a servir. Quando não aceitava sua condição social de subordinação ao sexo masculino, era marginalizada, perseguida e castigada, ou acabava envolvida em movimentos heréticos e, na maioria das vezes, sentenciada à morte. Durante séculos as mulheres ouviram de seus pais, clérigos, mestres e esposos a repetição dos mesmos princípios que asseguravam a submissão feminina: castidade, humildade, silencio e trabalho.Esses princípios fortificavam a ideologia da Igreja e mantinha intacta estrutura do considerado bom casamento: homens governavam e mulheres obedeciam incondicionalmente. O conceito da mulher deste período oscilou diante de imagens antagônicas entre si: ou se assemelha à Eva ou à Virgem Maria. Como Eva, nascida da costela de Adão, a mulher desobedeceu a Deus, traiu e condenou a humanidade. Eva retratou a mulher como fonte de todos os males e símbolo maior do pecado.Textos produzidos na época por teólogos, filósofos e cientistas insistem no suposto efeito maléfico causado pela condição feminina. Santo Agostinho, grande teólogo e pensador da Igreja Católica, escreveu um texto no qual podemos perceber como a mulher foi injustamente interpretada, perseguida e castigada: “ A mulher é um animal que não é seguro nem estável, é odienta para tormento do marido, é cheia de maldade e é o principio de todas as demandas e disputas, via e caminho de todas as iniqüidades”. Durante os quatro séculos da Inquisição promovida pela Igreja, milhares de mulheres foram assassinadas. O período de caça às bruxas foi o apogeu da discriminação feminina. As mulheres foram afastadas das universidades, as parteiras foram interditadas em seu ofício e qualquer prática realizada por elas que objetivasse algum tratamento (remédios caseiros, poções) era considerada ato de bruxaria. Em todas as épocas todo Deus manipulado pelas ideias humanas foi nocivo para as minorias, em especial as mulheres. Um dos espetáculos mais tristes de nossas ruas de hoje em dia é a imagem de uma mulher encoberta por uma forma negra dos pés à cabeça, espiando o mundo através de uma nesga minúscula. A burca não é só um instrumento de opressão das mulheres e de repressão de sua liberdade e de sua beleza; é o símbolo da crueldade flagrante masculina. Tudo em nome da religião. Uma das maiores conquistas da modernidade ocidental foi a emancipação feminina. Mas os fundamentalistas, em sua luta contra o espírito contemporâneo, tendem a enfatizar a igualdade de gêneros como uma ameaça a repelir. Parece ter surtido efeito. Onde quer que governantes modernizadores tenham tentado banir o uso do véu em países islâmicos, as próprias mulheres passaram a adotá-lo em maior número, com fervor redobrado. John Lennon tinha razão, quando na antológica canção, imaginou um mundo sem religiões.

Prof.José Ernani de Almeida em ONacional.

O que achastes do texto? Comente, participe!!!

Um comentário: