segunda-feira, 10 de maio de 2010

Acabar com o Mercosul???



José Serra causou estranheza e indignação, inclusive internacional, ao afirmar que o Mercosul é “uma farsa” que “atrapalha” as negociações internacionais do Brasil. Sua intenção, caso eleito presidente, seria trabalhar para extingui-lo —embora ele tenha corrigido a si mesmo em seguida para esclarecer que quer apenas “flexibilizá-lo”. Ainda assim, o ato falho do tucano revelou o que sua candidatura representa: a defesa de interesses muito distantes daquilo que é bom para o Brasil e para o continente.
Por extensão, é possível deduzir que o tucano também é contra a substituição do Mercosul pela Unasul, que pretende criar, nos próximos 15 anos, uma dinâmica econômica, política e social próxima à da União Europeia na América Latina — moeda única, conselho de segurança regional, livre trânsito de pessoas, cooperação em investimentos de infraestrutura e gradual eliminação de tarifas para exportações e importações entre os países do bloco.
Um é a evolução natural do outro, o andamento de uma discussão que vem sendo construída há duas décadas e que, até 2008, estava pendente de ações práticas para que se tornasse realidade. Mas nem por isso se pode descartar as conquistas proporcionadas pelo Mercosul, especialmente para o Brasil, grande beneficiado do principal mecanismo do bloco: a Tarifa Externa Comum.
O mecanismo faz com que Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil — e, num futuro próximo a Venezuela — adotem tarifas iguais, preponderantemente influenciadas pelas taxas brasileiras, para importação e exportação de diversos produtos. Fortalece, assim, os laços entre os setores produtivos dos países latinos e impede que agentes externos — como a China, por exemplo — tomem um mercado que pode, e deve, desenvolver-se em conjunto.
O comércio com a Argentina, segunda força econômica do bloco, encerrou uma década de balança comercial desfavorável ao Brasil a partir de 2004 e alcançou uma corrente de comércio de US$ 30 bilhões em 2008, com superávit brasileiro de US$ 4,3 bilhões (dados do Ministério do Desenvolvimento da Indústria e Comércio Exterior).
Analisando o período, o efeito é o mesmo na relação com os demais parceiros de bloco: US$ 3,1 bilhões em comércio com o Paraguai naquele ano, e balança favorável em US$ 1,8 bilhão. Com o Uruguai, uma corrente de transações de US$ 2,6 bilhões e superávit de US$ 625,9 milhões para o Brasil.
São aproximadamente US$ 6,7 bilhões em uma balança comercial que foi, ainda em 2008, favorável em US$ 24,9 bilhões — quase um quarto de todo o sucesso comercial do Brasil naquele ano. É necessário muito malabarismo argumentativo para justificar a ideia de que esse resultado tenha sido fruto de uma farsa que atrapalha o Brasil em suas negociações.
É importante ressaltar ainda que as exportações do Brasil para os colegas de Mercosul também evoluíram em qualidade nos últimos anos, não apenas em quantidade: em comparação entre março de 2009 e março de 2010, por exemplo, o crescimento de exportações de equipamentos mecânicos e eletrônicos do Brasil para a Argentina foi de 43%. O mesmo tipo de comércio cresceu 17% com o Uruguai e 116% com o Paraguai.
Trata-se de um dado relevante: é demonstrativo do esforço brasileiro em fortalecer suas exportações de manufaturados, que possuem maior valor agregado e impulsionam o investimento da indústria e a geração de emprego, em detrimento de um modelo de comércio exterior em que o País teria apenas matéria-prima a oferecer. Modelo este que vigorou nos anos Fernando Henrique Cardoso e que Serra quer ressuscitar.
Para atingir o objetivo de fazer com que o Brasil esteja entre as nações desenvolvidas, é preciso também negociar em pé de igualdade com os grandes blocos para mudar a agenda de negócios mundial, o que exige que a América Latina apresente-se como um grande mercado consumidor, um grande parque industrial e uma grande potência agropecuária, livre de sectarismos culturais e entraves burocráticos. Sem o Mercosul, como propõem Serra e os tucanos, isso não será possível.

José Dirceu.


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3 comentários:

  1. Olá,
    O problema do Serras e seus aliados é que não conseguem disfarçar os seus alinhamentos políticos e ideológicos.
    O PSDB e o PFL (DEM)sempre foram contra à integração do continente latino americano do sul.Trabalharam para impedir a criação do Mercosul e tentaram de qualquer forma emplacar a ALCA. Perderam, ficaram agachados na moita, e agora estão esperando dar o bote...
    Só que não o farão, espero.
    Bela análise do Zé e parabéns por reproduzi-la.
    Um abraço.

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  2. O Serra, em cada lugar que vai, tenta ajustar o seu discurso e agradar os eleitores de cada localidade. Aqui no RS disse que já namorou uma gaúcha, em Minas também. Ou seja, ele é daqueles tipos de políticos em quem não dá para dar crédito, pois nada do que falam eles farão realmente. Por isso, necessitamos conhecer a trajetória de cada candidato, avaliando o que fizeram nas suas vidas públicas. Assim, saberemos quais as atitudes que realmente adotarão, caso sejam eleitos.
    Parabéns pela matéria.
    Um forte abraço

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  3. Por isso que eu dou minha opinião pessoal: Não vou votar nesse cara (mas também não voto na Dilma...). Restam poucas opções...

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