segunda-feira, 26 de abril de 2010

Onde Ele mora?



Não sei vocês, como diria Laureano, ao mostrar opinião discordante ao que se estava estabelecendo, mas estou encasquetado com algo. Há uma nuvem de lançamentos de CDs de religiosos e que ao se referirem a Deus, esses religiosos-artistas elevam seus olhos aos céus dando a entender que é lá, no céu, no alto, que Ele mora. Talvez queiram demonstrar a nossa infinita inferioridade e que há alguém lá em cima, no alto, e que para fazer a comunicação, pedido ou agradecimento deveríamos levantar os olhos. Talvez seja isso. Talvez sim, talvez não, diria Laureano.
O atacante enquanto se prepara para bater o pênalti, faz rito, principalmente se o jogo está sendo transmitido pela TV, e ergue os braços aos céus. O goleiro também faz pedido, repetindo o gesto do oponente. A quem Ele atenderá, qual é o filho dileto e por que atenderia um ou outro? Poucos pensam nas capacidades individuais, pensam no merecimento pelo grau de fé de cada um.
Pode também transparecer que morando no alto, no céu distante, Ele mora longe ou fora de nós e que para chegar até Ele temos de realizar o exercício de transcender, extradular, extrapolar, ou mais fácil, sairmos de nós mesmos.


Desde que o homem se entende por ter consciência procura encontrar a razão de sua existência e não encontrando respostas universais e somente respostas individuais, subjetivas e motivadas pelo seu grau de sofrimento ou bonança, ele procura pela moradia do Criador. Onde Ele mora? Vem do alto, da chuva ou do disco voador como imaginava Raul Seixas, vem de todos os lugares como propagava Spinoza em sua visão panteísta, vem dos sorrisos das crianças, vem dos amores das mães por seus filhos?
Deus viria das estrelas, da casa do Pai, do éden, do paraíso. Como chegar até Ele?


Atravessamos todos os desertos de nossas vidas e quedamos com mais perguntas ou a aceitação, a qual denominamos fé. Fé é importante, diria fundamental porque equilibra, porque não deixa enlouquecer, porque reconforta, porque dá sentido, porque oferece respostas ao imponderável e porque é inútil perguntar o que não oferece resposta. Aos homens resta escolher filosoficamente o caminho a seguir assim como bem escrito por Morris West nas Sandálias do pescador. Lá, o religioso-cientista que viria a ser papa, percebe que está em uma encruzilhada. Por religioso deve ter a fé sem contestação, como cientista não consegue se conceber sem contestação. Ele opta pela fé ou enlouquecerá.
Não sei vocês, mas acho que se Ele mora em algum lugar, mora dentro de cada um de nós ou em todos os lugares simultaneamente. Entendo que ao abrir um canal de conversação, deveríamos olhar para dentro de nós mesmos, introspectar, ou com diz o Padre Paulo Farina, praticar o recolhimento. Se Ele mora no alto, na direção dos olhos e braços levantados, para chegar até lá tenho de transcender. Transcendência ou recolhimento? Aí está, diria Laureano.


Pode parecer bobagem, mas se pensarmos que as respostas e as buscas de soluções não estão dentro de cada um de nós, pode ser que a gente fique tentado a encontrar um intermediário para nos encaminhar ou um atravessador que vai, dependendo do valor por nós oferecido, apresentar soluções para nossas tribulações em pacotes fast-foods e que deverão, evidentemente, ser renovados.
Nada contra religiosos-artistas. Melhor cantar Deus do que as misérias e os dramas de uma sociedade que está doente e sem destino. Apenas acho que antes de buscarmos respostas exteriores para os nossos problemas, deveríamos buscar o Deus que habita nossas consciências e captar se o que está acontecendo de bom ou de ruim em nossas vidas tem o nosso merecimento. Melhor ainda é viver a genética do Criador simplesmente sem indagações. Menos pensamentos, mais atos. Menos céu, mais interiorização. Menos destino, mais merecimento. Menos atravessadores, mais você, como diriam Laureano e Ana Maria Braga.

Jorge Anunciação.

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3 comentários:

  1. Acredito em todos os lugares, e principalmente dentro de nos, concordo com o ponto de vista de seu post: mais atos, interiorização, merecimento e caridade...

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  2. Como sempre, amigo, excelente texto! Escrito com primor e revelando, através de suas palavras, a inquietação de muitos!
    Grande beijo!

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  3. Sim, excelente, assunto pra se refletir muito!

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