domingo, 18 de abril de 2010

Bons professores



Educação é unanimidade nacional. Todos concordam em que deve ser valorizada e que o futuro do País depende da prioridade que lhe for dada. Seria de esperar que todos se empenhassem em sua efetiva e constante melhoria.


Ao contrário do que se apregoa, verbas não faltam: os recursos existentes nos níveis federal, estadual e municipal, mais o que as famílias gastam do seu próprio orçamento, somam uma montanha de dinheiro! E dinheiro mal gasto: ano após ano, em provas de conhecimentos básicos de língua pátria, matemática e ciências, os estudantes brasileiros ficam entre os piores, dentre os países avaliados pela Unesco (o Haiti está logo abaixo...).


Com frequência maior a cada dia, a mídia focaliza episódios de violência nas escolas: brigas entre alunos, agressões a professores e diretores, consumo de drogas etc. Esse quadro desolador parece pior quando se vê o ambiente onde ocorrem tais fatos: instalações sucateadas, pátios que parecem de prisões, sanitários depredados, janelas quebradas e assim por diante.


Mesmo sendo evidente que é preciso mudar para melhorar, insiste-se no mesmo tipo de escola que vem de outros tempos: alunos confinados em espaços precários; aulas que não os motivam, nem interessam; tudo monótono, desatualizado, desinteressante.
Lá fora, desde tenra idade, jovens e crianças conhecem emoções fortes e amadurecem precocemente, seja com a violência dos seriados e jogos eletrônicos, seja pela vivência de brigas em casa, nas ruas, favelas e periferias urbanas. Para alunos afeitos à mais crua realidade, o que significam florzinhas desenhadas no caderno, ou coraçõezinhos pintados em cartolina, ou estrelinhas oferecidas como prêmio por “tias” bem intencionadas, mas despreparadas?


É patente a inadequação e insuficiência da formação dos nossos docentes. Até meados do século passado, as escolas normais eram as únicas a preparar professores para o curso “primário”; deles se exigia o domínio de conteúdos básicos, ao lado de noções de artes aplicadas, didática geral e psicologia infantil. Nas décadas de 1930 e 1940, as faculdades de Filosofia passaram a oferecer licenciaturas, em nível superior, para a docência no “ginasial” e no “colegial” (ensino médio).
Com a Reforma Universitária, vieram as faculdades de Educação onde, além das disciplinas pedagógicas e dos cursos de Pedagogia, seriam também formados administradores e orientadores escolares que – esperava-se – iriam melhorar nossas escolas e viabilizar um ensino de boa qualidade.


Ao longo do tempo, o sistema escolar expandiu-se em todos os níveis. Camadas da população, até então excluídas da educação formal, passaram a ter acesso à escolaridade regular – um grande avanço, em termos de cidadania. Não houve, entretanto, a contrapartida da valorização da carreira do magistério, nem a adequação das Faculdades de Filosofia e/ou Educação às características e necessidades dessa clientela oriunda de estratos sociais desfavorecidos, cujos problemas reverberam na escola.


Pelo contrário: encurtaram-se os turnos de aula, para atender a mais matrículas e viabilizar estatísticas politicamente favoráveis. Os salários foram aviltados, na medida em que predominava uma concepção “patrimonial” da educação, ou seja: os recursos federais somente poderiam destinar-se à construção ou reforma de edificações escolares, jamais à remuneração do pessoal docente.


Ano após ano, passaram a atuar somente mulheres na escola fundamental; gradativamente, assumiram o ensino médio e, já agora, avançam no ensino superior. Com o machismo peculiar da sociedade brasileira, o salário feminino é entendido como salário “complementar” ao do chefe (?) da família. Entenderam administradores e políticos que a jornada de trabalho das “professorinhas” (como costumam dizer) é curta – já que a permanência dos alunos na escola é curtíssima, uma das mais reduzidas do mundo ocidental. Para pouco trabalho, pouco salário – e estamos conversados.


Há outros complicadores: acabaram-se as escolas normais e, nas licenciaturas, “teóricos” e “filósofos”(?) aparelharam a educação com ideias e ideologias modernas e avançadas, como a de que devem ser banidas da escola exigências e cobranças – com o que foram relegados a segundo plano os conteúdos das disciplinas a serem ministradas. Ocorre que, na nossa realidade terceiro-mundista, precisamos de professores que saibam e que ensinem o que sabem; e que estejam dispostos a dedicar-se à educação individual de cada aluno, sobretudo o que vem da extrema pobreza, para quem a escola é a única esperança.


O noticiário é de ontem: no concurso realizado pela Secretaria Estadual de Educação de Goiás, dos mais de 20.000 candidatos inscritos, menos de 3% foram aprovados! Haverá outro concurso – com exigências menores, ajustadas ao nível de (des)preparo dos futuros professores.
Algumas ilações e conclusões são possíveis. Mesmo com os salários aviltados e a degradação do ambiente escolar, a demanda pela carreira do magistério continua alta: pela vocação de uns poucos, ou pela inexistência de alternativas no mercado de trabalho, ou por algum resquício de “status” inerente à figura do mestre.
Como explicar a reprovação maciça dos candidatos? Sabe-se que alguns buscam regularizar uma situação pré-existente: são docentes temporários ou substitutos, contratados de forma emergencial, geralmente por indicação política. A maior parte, entretanto, tenta ingressar no magistério pela via da meritocracia. A despeito de serem portadores dos títulos acadêmicos exigidos, 97% dos inscritos não conseguiram provar que dominam os conteúdos das disciplinas que se propunham lecionar.


E por que não os dominam? Pesquisas mostram que vão ser professores os alunos com pior desempenho escolar no ensino médio; e que, nos cursos de licenciatura, sobram vagas, ou são preenchidas com candidatos que não lograram ingressar em outras áreas, socialmente mais valorizadas e com perspectivas de melhor remuneração. Instala-se, assim, o círculo vicioso que se retroalimenta: escolas mal equipadas, alunos medíocres, professores idem, em escolas mal equipadas...
Quando vejo a relação candidato/vaga nos cursos de Medicina – 100, 120, 170 – espanta-me o surto de vocações para curar doentes, enfrentar moléstias infecciosas, conviver com o sofrimento e a morte. E na área do Direito? Serão tantos os jovens ávidos de justiça e paladinos das leis?
Com as exceções de praxe, os melhores não vão ser professores. É deles, exatamente, que se precisa no magistério.


Lena Castello Branco.

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5 comentários:

  1. Olá, William!

    A educação é muito importante para o desenvolvimento do país e das pessoas, embora não seja o que muita gente diz que seja a solução do problemas do Brasil, mas juntamente com muitos outros fatores tem uma grande contribuição. Para que a educação seja muito importante na solução dos problemas brasileiros, juntamente com outros fatores, é necessário que seja de qualidade.

    Abraços

    Francisco Castro

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  2. Este texto precisa ser divulgado
    São raros os comentários que elevam a auto-estima do professor

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  3. Infelizmente, professor no Brasil não tem o respeito que merece. É uma profissão banalizada. Não é reconhecida a devida importância do professor para o desenvolvimento e a evolução do país.
    Professor deveria ser tratado como autoridade. O 'saber' deveria ser o maior bem de todo cidadão.
    Enquanto o brasileiro não ter essa consciência, vamos continuar tendo ensino de péssima qualidade. E consequentemente, cidadãos de péssima qualidade.
    A cultura do Brasil não tem mais identidade. E isso é por causa da falta de educação.

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Esse é um assunto que me tira do sério.
    Até quando os docentes serão ridicularizados em nossa sociedade?
    A docência não é vista como uma profissão. Essa forma de olhar para a educação e para os profissionais que a colocam em prática é que deve mudar. Um país não se desenvolve sem produção de conhecimento, sem pesquisa, etc.
    Enquanto os professores não receberem salários dignos e que correspondam à importância de suas atividades, o cenário educacional não irá mudar para melhor. Afinal de contas, por que valorizam tanto os médicos, advogados, engenheiros, etc.? Acaso, esses não tiveram professores para adquirir seus conhecimentos? Ao meu ver, a docência é a mãe de todas as outras profissões. Porém, a sociedade a vê como se fosse uma obrigação.

    Abraços!

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