sexta-feira, 7 de agosto de 2009

A raposa e os sonhos verdes

Tenho pena da raposa, todos esses anos condenada por ter reconhecido o azedume de uvas inalcançáveis, desprezada por buscar vinhas menores, ridicularizada por voltar para casa feliz da vida. Hoje serei seu advogado. O inalcançável está verde. Uvas verdes são azedas, provocam dor nos dentes, estragam o vinho. Uvas maduras, mas inacessíveis, estão verdes e, da mesma forma, azedam a vida quando insistimos em comê-las.

Condenou-se a raposa por ser realista, não ceder à frustração. Não se considera sua autocrítica, nem sua cristalina razoabilidade. Ela reconheceu seus limites, coisa que raramente fazemos. Os que condenam a raposa vivem por aí em ácida frustração, mastigando sonhos impossíveis. Vivem no mundo da lua tricotando metas com fios que não possuem. Comem uvas azedas e são infelizes.

Tenho observado que a frustração vem de sonhos pretensamente maduros, mas altos demais. Desejo o campeonato mundial para meu time que ficou em quinto lugar na várzea. Todos os sábados bebo para esquecer que não ganhei na loteria. Gisele Bündchen ainda não respondeu a minha proposta de casamento. Quanto maior meu sonho, maior a frustração e, por conseqüência, maior a infelicidade.

Sei que esta minha visão das coisas pode surpreendê-los. Sempre se incentivou o sonho sem limites. Todos aconselham grandes sonhos. Em qualquer canto há mestres querendo transformar-nos em verdugos da raposa. Sonhe alto, dizem, será feliz. Sonhe à altura de suas capacidades, diz a raposa, e administrará as frustrações.

Já pensei no argumento "sonho é sempre sonho", ou seja, é uma casa sem paredes. É verdade, em parte. O sonho é a projeção das potencialidades de cada um. Bem, você me diz, as potencialidades humanas são infinitas. Verdade em parte, diz a raposa, somos infinitos fora do tempo e do espaço. O tempo e o espaço têm as rédeas dos sonhos. A felicidade está na consciência dos limites.
Se deseja comprar um apartamento em Paris, ao lado da Tour Eiffel, com seus três salários mínimos, posso avisá-lo de que será um azedume só. Se quiser ser cantor famoso, quando nem consegue assobiar o "Parabéns a Você", acho que não está no caminho certo. A felicidade não é amiga dos insensatos.

É claro que podemos criar condições para nossos sonhos. Isto é óbvio. Como disse, o tempo e o espaço nos limitam. Temos capacidade de alterar o espaço e evoluir no tempo. Crescendo profissionalmente, poderemos comprar o apartamento em Paris. Quem sabe estudando canto por cinco ou seis anos, teremos a voz de uma prima donna. O que digo é que devemos ser realistas em nossas fantasias e adequar os sonhos ao tempo e espaço. Só assim a frustração não vencerá a satisfação.

A raposa, como sempre, demonstrou a esperteza com a qual Esopo brindou-a em outras fábulas. O que não está ao alcance ainda está verde. Mas isto não quer dizer que as uvas altas não são maturáveis. O que não vale é a teimosia inconseqüente. As uvas, aqui, ainda estão verdes. O relógio anda, o caminho segue. Adiante, em vinhas menores, haverá uns cachos excelentes ao paladar. Talvez, depois do sol desta semana, em dez dias, as uvas verdes de hoje estarão maduras. Nós as comeremos felizes, sem salivar em vão.

4 comentários:

  1. Sonhos são castelos, ás vezes de areia, mas quando construídos dia a dia podem ser sólidos. Que rei construiu seu castelo de um dia para o outro?
    Eu tenho um sonho grande e estou a muito colocando as pedras nas paredes dia a dia. Espero um dia terminá-lo.
    Amei seu post.
    Bjs,
    Lunita

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  2. Realmente, aprender a ter paciência e caminhar ao lado da Natureza, respeitando seus ritmos e ciclos...eis uma grande lição a ser aprendida!! Quando for aprendida e praticada, colheremos os frutos (bons ou maus), cada um, a seu tempo, como um sábio lavrador. E as coisas "estranhamente", começarão a dar certo.

    Abçs e Paz Profunda!!

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  3. paciência eu tenho e sonhos então nem se fala...valeu...fuiiiiiii

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